Caros colegas: Aqui está a compilação dos problemas e teoremas de nível compatível com o 2o. grau das nossas escolas que 9 participantes da lista acharam os mais bonitos e/ou surpreendentes. Noto aqui o meu agradecimento aos outros 8 pelo interesse em participar da enquete.
Tanto quanto possível procurei ser imparcial. Entretanto, decidi excluir alguns resultados de análise, teoria dos números e combinatória por estar convencido de que seus níveis de abstração e sofisticação estão muito além do que seria razoável para um aluno normal de 2o. grau (você não estará muito enganado se interpretar isso como: "Eu (Claudio) tive dificuldade pra entender estes resultados"!). Assim, não fazem parte da compilação: - o teorema dos números primos; - o teorema sobre a infinidade de primos da forma Nk + 1, onde N é um inteiro qualquer; - os teoremas de Heine-Borel, Cantor-Bendixon e alguns outros resultados de análise e topologia; - o belíssimo método probabilístico em análise combinatória, criado por Paul Erdos, cujo princípio é bem intuitivo mas as aplicações são um pouco sofisticadas demais. Espero que essa atitude não me torne alvo de críticas muito severas. Assim, sem mais delongas, vamos à compilação: TEORIA DOS NÚMEROS: 1. Infinitude dos primos: i) O conjunto dos primos é infinito; ii) Se p(n) = n-ésimo primo, então a série: SOMA(n>=1) 1/p(n) = 1/2 + 1/3 + 1/5 + 1/7 + 1/11 + ... é divergente. iii) Existe uma infinidade de primos de cada uma das formas a seguir: 4k+3, 6k+5 e 4k+1. 2. "Desertos" de primos: Dado um inteiro positivo qualquer N, existe um conjunto de N inteiros positivos consecutivos que não contem nenhum primo. 3. O teorema de Bezout: Se a e b são dois inteiros quaisquer, então mdc(a,b) é o menor inteiro positivo que pode ser expresso na forma a*x + b*y, com x e y inteiros. Consequências: i) Se a e b são inteiros primos entre si e se a divide b*c (c inteiro), então a divide c; ii) Se p é primo, então cada inteiro primo com p tem um inverso (mod p) - em outras palavras, se n é inteiro e primo com p, então existe um inteiro k tal que n*k - 1 é múltiplo de p; iii) O pequeno teorema de Fermat: se p é um primo e n é um inteiro qualquer, então n^p - n é múltiplo de p; iv) O teorema de Wilson: p é primo se e somente se (p-1)! + 1 é múltiplo de p; 4. Primos como somas de quadrados: i) Todo primo da forma 4k+1 pode ser expresso, de maneira única, como uma soma de dois quadrados de números inteiros. ii) Nenhum primo da forma 4k+3 pode ser expresso como uma soma de dois quadrados de números inteiros. 5. Números perfeitos: Um inteiro positivo é chamado de perfeito quando é igual ao dobro da soma de seus divisores positivos (ou seja, ele é igual à soma dos divisores positivos menores do que ele mesmo). As duas partes do resultado a seguir foram descobertas por Euclides ( <== ) e Euler ( ==> ) com um intervalo de cerca de 2000 anos: N é perfeito par <==> N = 2^(p-1)*(2^p - 1), onde 2^p - 1 é primo. (OBS: até hoje não se sabe se existe algum número perfeito ímpar) 6. O caso n = 4 do Último Teorema de Fermat: A equação x^4 + y^4 = z^4 não admite solução em inteiros não nulos (repare que a condição 'não nulos' é crucial, pois claramente 1^4 + 0^4 = 1^4). 7. Postulado de Bertrand: Se x > 1, então existe (pelo menos) um primo entre x e 2x. 8. Se as medidas dos 3 lados e dos 3 ângulos (em graus) de um triângulo são racionais, então o triângulo á equilátero. 9. A fórmula para a soma das p-ésimas potências dos n primeiros números naturais em função dos números de Bernoulli: 1^p + 2^p + 3^p + ... + n^p = ((n + B)^p - B^p)/(p+1), onde: (n + B)^k deve ser expandido da forma usual (binômio de Newton), mas B^k deve ser interpretado como B(k) = k-ésimo número de Bernoulli. Os números de Bernoulli são definidos pela recorrência: B(0) = 1 e SOMA(0<=k<=n) Binom(n+1,k)*B(k) = 0 10. O produto de Euler: Para s > 1, vale: SOMA(n>=1) 1/n^s = PRODUTO(p primo) 1/(1 - 1/p^s). Ou seja: SE S = 1 + 1/2^s + 1/3^s + 1/4^s + 1/5^s + 1/6^s + ... e P = (1/(1 - 1/2^s))*(1/(1 - 1/3^s))*(1/(1 - 1/5^s))*(1/(1 - 1/7^s))*... ENTÃO S = P. ***** ANÁLISE: 11. Álgebra de conjuntos: Se A, B e C são conjuntos quaisquer, então: i) A U (B inter C) = (A U B) inter (A U C) ii) A inter (B U C) = (A inter B) U (A inter C) Se X' é o complementar de X em relação a um conjunto universo dado, então valem as leis de De Morgan: iii) (A U B)' = A' inter B' iv) (A inter B)' = A' U B' 12. Cardinalidade de conjuntos infinitos: Dizemos que dois conjuntos X e Y têm a mesma cardinalidade (e escrevemos card(X) = card(Y)) quando existe uma bijeção entre eles. Se existe uma função injetiva de X em Y, mas nenhuma função sobrejetiva de X em Y, dizemos que card(X) < card(Y). Valem os seguintes teoremas sobre cardinalidade de conjuntos infinitos (N = conjunto dos numeros naturais; Q = conjunto dos numeros racionais; R = conjunto dos numeros reais): i) card(N) = card(Q), ii) card(N) < card(R), iii) card(R) = card(R^2), iv) card(X) < card(Partes(X)), onde X é um conjunto qualquer, v) card(Partes(N)) = card(R), OBS: Um conjunto X é dito enumerável quando card(X) = card(N). Se card(N) < card(X), entao dizemos que X e não-enumerável. Assim, Q é enumerável mas R não é. 13. Intervalos em R: i) card([a,b]) = card([0,1]) para quaisquer a, b reais com a < b; ii) card(R) = card((0,1)); iii) card((0,1)) = card([0,1]); iv) A intersecção de uma infinidade de intervalos abertos pode ser igual a um intervalo fechado; v) A união de uma infinidade de intervalos fechados pode ser igual a um intervalo aberto. vi) Qualquer intervalo aberto contém uma infinidade de números racionais e uma infinidade de números irracionais; 14. C (conjunto dos números complexos) não pode ser ordenado: Um conjunto numérico A (tecnicamente um "corpo") é dito ORDENADO quando ele possui um subconjunto A+ de elementos ditos "positivos" tais que: i) Se x é um elemento de A, então exatamente uma das alternativas seguintes ocorre: x pertence a A+, x = 0 ou -x pertence a A+; ii) Se x e y pertencem a A+, então x+y e x*y pertencem a A+. Com esta definição, C não pode ser ordenado (ou seja, C não possui nenhum subconjunto C+ que obedeça a (i) e (ii) acima). 15. A equação x^2 = 2^x tem 3 soluções reais. 16. Um número irracional elevado a um expoente irracional pode resultar num número racional; 17. A série harmônica: A série SOMA(n>=1) 1/n = 1 + 1/2 + 1/3 + 1/4 + 1/5 + ... é divergente. 18. Teorema do Valor Intermediário: Seja F uma função real contínua em algum intervalo fechado [a,b] (a < b) tal que F(a) < 0 e F(b) > 0. Então, existe um número real c tal que a < c < b e F(c) = 0. 19. Teorema Fundamental da Álgebra: Todo polinômio não constante de coeficientes complexos possui (polo menos) uma raiz complexa. ***** ÁLGEBRA: 20. Completando quadrados: Dado um trinômio do 2o. grau: y = ax^2 + bx + c, com a > 0, tem-se que: i) y = 0 para x = (-b - raiz(b^2-4ac))/(2a) e x = (-b + raiz(b^2-4ac))/(2a); ii) y é mínimo e igual a c - b^2/(4a) para x = -b/(2a). 21. O método de eliminação Gaussiana para resolução de sistemas de equações lineares (adeus, regra de Cramer!); 22. Posto-linha = Posto-coluna: Seja A uma matriz qualquer (não necessariamente quadrada) de coeficientes reais. Então, o número máximo de linhas linearmente independentes de A é igual ao número máximo de colunas linearmente independentes de A. 23. Desigualdade MG <= MA: Sejam a(1), a(2), ..., a(n) números reais positivos. Então: (a(1)*a(2)*...*a(n))^(1/n) <= (a(1)+a(2)+...+a(n))/n, onde a igualdade vale se e somente se a(1) = a(2) = ... = a(n). 24. A desigualdade do rearranjo: Sejam a(1), a(2), ..., a(n) e b(1), b(2), ..., b(n) duas sequências não-decrescentes de números reais. Seja c(1), c(2), ..., c(n) uma permutação qualquer dos b(i). Então: a(1)*c(1)+a(2)*c(2)+...+a(n)*c(n) <= a(1)*b(1)+a(2)*b(2)+...+a(n)*b(n) e a(1)*b(n)+a(2)*b(n-1)+...+a(n)*b(1) <= a(1)*c(1)+a(2)*c(2)+...+a(n)*c(n). 25. Progressões Geométricas e Fibonacci: Existe uma única progressão geométrica de termos positivos (a(i)) que obedece à equação de recorrência de Fibonacci a(n) = a(n-1) + a(n-2). ***** ANÁLISE COMBINATÓRIA E PROBABILIDADE: 26. A relação de Stifel (ou Stifel-Pascal) e suas consequências algébricas e interpretação combinatória: Se n e p são inteiros positivos então: Binom(n,p) = Binom(n-1,p) + Binom(n-1,p-1) 27. O princípio das Casas de Pombos: Se mais do que n objetos são distribuídos por n caixas, então deve haver pelo menos uma caixa com pelo menos 2 objetos. Consequências: i) Em todo grupo de 6 pessoas, existem 3 que se conhecem mutuamente ou 3 que se desconhecem mutuamente; ii) Se um paciente tem que tomar 48 pílulas em 30 dias, sendo que ele toma pelo menos uma pílula por dia, então existe uma sequência de dias consecutivos nos quais ele toma exatamente 11 pílulas; iii) Toda sequência de m*n+1 números reais distintos possui uma subsequência crescente de n+1 termos ou uma subsequência decrescente de m+1 termos; iv) Toda sequência de números reais possui uma subsequência monótona; v) Se a é irracional, então o conjunto A = {m + n*a; m, n inteiros} é denso em R (ou seja, qualquer intervalo aberto, por menor que seja, contém algum elemento de A - de fato, contém uma infinidade de elementos de A); vi) Dada uma sequência qualquer de algarismos, existe uma potência de 2 cuja representação decimal começa com aquela sequência. 28. O problema do jogo interrompido: Dois jogadores, A e B, lançam sucessivamente uma moeda (ou seja, um simples "cara ou coroa"). A moeda não é necessariamente honesta, de forma que as probabilidades de A e B vencerem cada rodada são iguais a "p" e "q", respectivamente, com p + q = 1. A vitória em cada rodada vale 1 ponto para o vencedor e 0 para o perdedor. Aquele que primeiro acumular "n" pontos vence o jogo e recebe um prêmio de R$ 100. No momento em que A acumula "a" pontos e B acumula "b" pontos (0 <= a < n e 0 <= b < n) eles são forçados a interromper o jogo. De que forma A e B devem dividir os R$ 100? ****** GEOMETRIA: 29. Teorema de Pitágoras e seu recíproco: Sejam a, b, c (a >= b >= c) as medidas dos lados de um triângulo. O triângulo é retângulo se e somente se a^2 = b^2 + c^2. 30. Pontos notáveis num triângulo: As medianas de um triângulo concorrem num mesmo ponto (o baricentro ou centróide do triângulo); As mediatrizes dos lados concorrem num mesmo ponto (o circuncentro - centro do círculo circunscrito); As bissetrizes internas concorrem num mesmo ponto (o incentro - centro do círculo inscrito); As alturas concorrem num mesmo ponto (o ortocentro). 31. A reta de Euler: Em qualquer triângulo, o circuncentro (C), o baricentro (B) e o ortocentro (O) são colineares e tais que m(OB) = 2*m(BC). 32. O círculo dos 9 pontos: Em qualquer triângulo, os pontos médios dos 3 lados, os pés das 3 alturas e os pontos médios dos 3 segmentos que ligam cada vértice ao ortocentro pertencem a uma mesma circunferência. 33. O triângulo órtico: O triângulo cujos vértices são os pés das alturas de um triângulo ABC dado é chamado de triângulo órtico de ABC. Ele tem as seguintes propriedades: i) As alturas de ABC são bissetrizes internas do triângulo órtico; ii) Dentre todos os triângulos inscritos em ABC (isto é, com um vértice contido em cada lado de ABC), o triângulo órtico é aquele de menor perímetro. 34. Teorema de Ceva: Num triângulo ABC, sejam as cevianas AX, BY e CZ (X em BC, Y em AC e Z em AB). Estas cevianas concorrem num mesmo ponto se e somente se: (AZ/ZB)*(BX/XC)*(CY/YA) = 1. 35. Heron e Brahmagupta: i) Área de um triângulo cujos lados tem medidas a, b, c: Área = raiz(p*(p-a)*(p-b)*(p-c)) , onde p = semi-perímetro = (a+b+c)/2; ii) Área de um quadrilátero inscritível cujos lados medem a, b, c, d: Área = raiz((p-a)*(p-b)*(p-c)*(p-d)) , onde p = (a+b+c+d)/2. 36. A desigualdade isoperimétrica: Entre todas as curvas fechadas de igual perímetro, a circunferência é a que engloba a maior área. 37. A desigualdade Eduardo Wagner: Em qualquer triângulo, o semi-perímetro nunca é menor do que a soma dos produtos de cada lado com o cosseno do ângulo oposto. Ou seja: p >= a*cos(A) + b*cos(B) + c*cos(C). 38. Os 5 poliedros regulares: Existem 5 poliedros regulares (aqueles cujas faces sao poligonos regulares congruentes) - tetraedro, cubo, octaedro, dodocaedro e icosaedro. Ademais, estes são os únicos poliedros regulares. 39. Seções cônicas e o teorema de Dandelin: A intersecção de um cone com um plano que não passa pelo seu vértice resulta em uma elipse, uma parábola ou uma hipérbole, dependendo de se o ângulo entre a normal ao plano e o eixo do cone for menor, igual ou maior do que o ângulo entre a geratriz e o eixo do cone. No caso de uma elipse, existirão duas esferas que tangenciam o plano e estão inscritas no cone (ou seja, a intersecção delas com o cone será uma circunferência) - uma delas situada entre o plano e o vértice do cone e a outra no semi-espaço oposto determinado pelo plano. Nesse caso: i) Os pontos de tangência das esferas com o plano são precisamente os focos da elipse; ii) As diretrizes da elipse são as retas onde o plano intersecta os planos que contém as circunferências onde as esferas tangenciam o cone. No caso de uma parábola, existirá uma única esfera tangente ao plano e inscrita no cone, situada entre o plano e o vértice do cone. Nesse caso: i) O ponto de tangência da esfera com o plano será o foco da parábola; ii) A diretriz da parábola será a reta onde o plano intersecta o plano que contém a circunferência onde a esfera tangencia o cone. No caso de uma hipérbole, existirá em cada folha do cone uma esfera tangente ao plano e inscrita no cone, ambas situadas no semi-espaço que contém o vértice do cone. Nesse caso: i) Os pontos de tangência das esferas com o plano são precisamente os focos da hipérbole; ii) As diretrizes da hipérbole são as retas onde o plano intersecta os planos que contém as circunferências onde as esferas tangenciam o cone. 40. A formula de Euler para poliedros convexos: Num poliedro convexo qualquer com F faces, A arestas e V vértices, vale a relação: V - A + F = 2. 41. Geometria Projetiva: i)Teorema de Desargues: Dados os triângulos ABC e A'B'C', sejam os pontos: P = AB inter A'B'; Q = AC inter A'C'; R = BC inter B'C'. Então: AA', BB' e CC' concorrem num mesmo ponto se e somente se P, Q e R forem colineares. ii)Teorema de Pappus: Dadas 2 retas quaisquer - r e s, e 3 pontos quaisquer sobre cada uma - A, B, C sobre r (B entre A e C) e X, Y, Z sobre s (Y entre X e Z), os pontos: P = AY inter BX; Q = AZ inter CX; R = BZ inter CY são colineares. iii)Teorema de Pascal: Se um hexágono ABCDEF (não necessariamente convexo) está inscrito numa cônica, então os pontos P = AB inter DE, Q = BC inter EF e R = CD inter FA, de intersecção de cada par de lados opostos, são colineares. iv) Teorema de Brianchon: Se um hexágono ABCDEF está circunscrito a uma cônica (de forma que cada um dos 6 lados a tangenciem), então as diagonais principais AD, BE e CF desse hexágono concorrem num mesmo ponto. ********* REFERÊNCIAS: De forma geral, as melhores referências são as Eurekas e a própria lista obm-l, onde vários dos resultados acima já foram demonstrados. Além delas, o site: http://www.cut-the-knot.org/ possui muito material complementar interessante (em especial, uma lista fantástica de problemas - com soluções - sobre o PCP). O Nicolau e o Gugu escreveram um artigo excelente sobre a desigualdade isoperimétrica, o qual pode ser encontrado nas páginas pessoais de ambos. Outras referências são os livros: AS PROVAS ESTÃO NO LIVRO Martin Aigner / Gunter M. Ziegler Editora Edgard Blucher O QUE É A MATEMÁTICA Richard Courant / Herbert Robbins Editora Ciência Moderna ANÁLISE REAL - volume 1 Elon Lages Lima Coleção Matemática Universitária - IMPA ÁLGEBRA LINEAR Elon Lages Lima Coleção Matemática Universitária - IMPA 100 GREAT PROBLEMS OF ELEMENTARY MATHEMATICS Heinrich Dorrie Editora Dover THE ENJOYMENT OF MATHEMATICS Hans Rademacher / Otto Toeplitz Editora Dover GEOMETRY REVISITED H.S.M.Coxeter / S.L.Greitzer Editado pela Mathematical Association of America (MAA) Um abraço, Claudio. ========================================================================= Instruções para entrar na lista, sair da lista e usar a lista em http://www.mat.puc-rio.br/~nicolau/olimp/obm-l.html =========================================================================