Olá amigos,
 
Este texto foi lido hoje à tarde no encerramento das comemorações do dia mundial da água, organizado pelo comitê da bacia hidrográfica do pontal do paranapanema no Parque Estadual do Morro do Diabo.
 
Gostaria que todos dessem uma olhada e que se colocassem no lugar de nossos filhos e netos.
 
Um abraço,
 
Edson Luís Piroli - Eng. Florestal
UNESP - Rosana-SP
 
 

Carta de nosso futuro

 

"Estamos no ano de 2070, acabo de completar os 50, mas a minha aparência é de alguém de 85. Tenho sérios problemas renais porque bebo muito pouca água. Creio que me resta pouco tempo.

Hoje sou uma das pessoas mais idosas nesta sociedade. Recordo quando tinha 5 anos. Tudo era muito diferente. Havia muitas árvores nos parques, as casas tinham bonitos jardins e eu podia desfrutar de um banho de chuveiro com cerca de uma hora. Agora usamos toalhas em azeite mineral para limpar a pele.

Antes todas as mulheres mostravam a sua formosa cabeleira. Agora devemos rapar a cabeça para mantê-la limpa sem água. Antes o meu pai lavava o carro com a água que saía de uma mangueira. Hoje os meninos não acreditam que se utilizava a água dessa forma.

Recordo que havia muitos anúncios que diziam CUIDE DA ÁGUA, só que ninguém lhes ligava; pensávamos que a água jamais terminaria. Agora, todos os rios, barragens, lagoas e mantos aquíferos estão irreversivelmente contaminados ou esgotados.

Antes a quantidade de água indicada como ideal para beber era oito copos por dia por pessoa adulta. Hoje só posso beber meio copo. A roupa é descartável, o que aumenta grandemente a quantidade de lixo; tivemos que voltar a usar os poços sépticos (fossas) como no século passado porque as redes de esgotos não se usam por falta de água.

A aparência da população é horrorosa; corpos desfalecidos, enrugados pela desidratação, cheios de chagas na pele pelos raios ultravioletas que já não têm a capa de ozônio que os filtrava na atmosfera.

Imensos desertos constituem a paisagem que nos rodeia por todos os lados. As infecções gastrointestinais, enfermidades da pele e das vias urinárias são as principais causas de morte.

A industria está paralisada e o desemprego é dramático. As fábricas dessalinizadoras são a principal fonte de emprego e pagam-te com água potável em vez de salário.

Os assaltos por um balde de água são comuns nas ruas desertas.

A comida é 80% sintética. Pela ressiquidade da pele uma jovem de 20 anos está como se tivesse 40. Os cientistas investigam, mas não há solução possível. Não se pode fabricar água, o oxigênio também está degradado por falta de árvores o que diminuiu o coeficiente intelectual das novas gerações.

Alterou-se a morfologia dos espermatozóides de muitos indivíduos, como consequência há muitos meninos com insuficiências, mutações e deformações.

O governo até nos cobra pelo ar que respiramos. 137 m3 por dia por habitante adulto. A gente que não pode pagar é retirada das "zonas ventiladas", que estão dotadas de gigantescos pulmões mecânicos que funcionam com energia solar, não são de boa qualidade mas pode-se respirar, a idade média de vida alcançada é de 35 anos.

Em alguns países ficaram manchas de vegetação com o seu respectivo rio que é fortemente vigiado pelo exército, a água tornou-se um tesouro muito cobiçado mais do que o ouro ou os diamantes. Aqui em troca, não há arvores porque quase nunca chove, e quando chega a registrar-se precipitação, é de chuva ácida; as estações do ano tem sido severamente transformadas pelos testes atômicos e da indústria contaminante do século XX.

Advertia-se que havia que cuidar o meio ambiente e ninguém fez caso. Quando a minha filha me pede que lhe fale de quando era jovem descrevo como os bosques eram bonitos, lhe falo da chuva, das flores, de como era agradável tomar banho e poder pescar nos rios e barragens, beber toda a água que quisesse, o quanto saudável a gente era.

Ela pergunta-me: Papai! Porque a água acabou? Então, sinto um nó na garganta; não posso deixar de sentir-me culpado, porque pertenço à geração que terminou de destruir o meio ambiente ou que simplesmente não deu importância aos avisos.

Agora os nossos filhos pagam um preço alto e sinceramente creio que a vida na terra já não será possível dentro de muito pouco porque a destruição do meio ambiente chegou a um ponto irreversível. Como gostaria de voltar atrás e poder fazer com que toda a humanidade tivesse compreendido isto quando ainda podíamos fazer algo para salvar o nosso planeta terra!"

Documento extraído da revista biográfica "Crónicas de los Tiempos" de Abril de 2002.

-- 
Fernando Campos Mendonça
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