O PROGRESSO

 

[...]   Com o desfalecimento dos conceitos religiosos, que ficaram à margem do homem e da Ciência, o conhecimento de Deus permaneceu retido nas velhas afirmações dos “pais da Igreja”, no passado, ou nos ensaios filosóficos, que se foram desvitalizando à medida que se sucediam os tempos. Divorciada da indagação científica e arbitrariamente adversária da sistemática filosófica, a Religião fez-se dominadora cruel e impôs os seus postulados enquanto o homem se demorava na infância cultural. Conquanto sedento de fé e de explicações para os inúmeros enigmas que lhe perturbavam as elucubrações, recebeu após o Cristianismo respostas prontas e a elas submeteu-se demoradamente. À medida, porém, que os horizontes se descortinavam ampliados pelas revelações da pesquisa científica comprovada e da razão que lhe era concorde, afastou-se insensivelmente de Deus e da alma, deixando-se conduzir por novos métodos de análise, não obstante a aceitação tácita e plácida das teorias religiosas, com as quais se acomodava ética e socialmente, no concerto da comunidade em que se situava.

        Herdeiro de si mesmo, pelas sucessivas reencarnações, conservou o sentimento de fé, porém, cresceu para outras considerações filosóficas e metafísicas, com o próprio desenvolvimento das conquistas novas e fascinantes. Os fenômenos anímicos, que sempre estiveram presentes em todas as culturas dos tempos, fascinavam-no. Proibido, no entanto, de cultivá-los, pelas imposições da fé arbitrária, arrefeceu-lhe o entusiasmo e supôs que os mesmos desapareceram com o suceder das Eras. As belas e comovedoras histórias que antes o levavam às lágrimas, subitamente deixaram-no de sensibilizar, despertando, por fim, cansado de crer, mas necessitado de investigar. Procurando os pugnadores da religião, encontrou-os ainda mais descrentes, mais atormentados, envergando a indumentária de conceitos cômodos, que, no entanto, não constituíam para eles, conforme supunha, base da existência espiritual. Tornou-se, por essa razão, religioso na forma e ateu na realidade. Cuidou da aparência e descurou da essência. Arregimentou consolidação externa e desagregou-se interiormente.

        A proclamação do novo dogma da “morte de Deus” não lhe causou qualquer surpresa. Antes, pelo contrário, tranqüilizou-o, porque o libertou do esforço de manter-se aparentando a aceitação de todo um patrimônio que para ele se encontrava destituído de valor.

        Desvelado e descomprometido com as prosaicas posições religiosas, atirou-se avidamente ao campo do gozo e agora se encontra semi-asfixiado no imenso vau do prazer, sob a anestesia do cansaço e da indiferença.

        Deus, no entanto, hoje como outrora, não se encontra nas catedrais da religião: veio às ruas, adentrou o âmago das almas, avançou na direção dos sofrimentos, interpenetrou-se na alma universal. Das galáxias reluzentes e consteladas aos vermes asquerosos, o espírito de Deus tudo vitaliza e a mecânica aflitiva das novas e engenhosas conquistas, ao impacto dos sucessos atuais, volta a inquirir ante a perfeição que depara em toda a parte: Quem? Quando? Como? Onde? E recebe somente uma resposta, que é a de sempre: Deus! [...]

Léon Denis

(De “Sol de Esperança”, de Divaldo P. Franco – Diversos Espíritos)

 

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