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Sent: Sunday, June 29, 2003 4:13 PM
Subject: [VotoEletronico] O Globo On Line

O Globo On Line
Data : Domingo, 29 de junho de 2003


Leitura obrigatória esta coluna da Miriam Leitão.


O clima da justiça

O ministro Nelson Jobim conversava com alguns colegas quando um deles defendeu a decretação de uma greve contra a reforma da Previdência. Jobim ponderou: nós sabemos organizar uma greve? Sabemos sair de uma greve? Se não, teremos então que atravessar a rua e ir lá aprender com o presidente Lula. A reforma da Previdência está agitando o Judiciário.
O clima de irritação estava em quase todas as rodas de conversas na festa do Espaço da Corte, em Brasília, para os três novos ministros do STF empossados na quarta-feira. Só entre os representantes do movimento negro é que o clima era de alegria pela posse de Joaquim Barbosa. Pelo ambiente no salão, pela irritação com o presidente Lula, fica claro que a briga com o Judiciário vai esquentar nos próximos meses de tramitação da reforma, porque a estratégia é agora convencer os parlamentares a alterar a proposta do Executivo.


Mas há quem reaja mais serenamente às criticas que são feitas ao Judiciário.

— Cada um destes três ministros empossados, quando chegar em seu gabinete, encontrará seis mil processos. É isso que temos que julgar por ano. E o volume tem crescido muito. Alguns processos chegam a ser ridículos porque é o recurso do recurso do recurso do agravo do agravo — diz a ministra Ellen Gracie Northfleet.

Ela acredita que a opinião pública tem julgado muito severamente o poder judiciário, acusando-o pela lentidão dos processos, e acha que a razão disso é que o próprio poder não tem conseguido se comunicar.

— Ao contrário dos outros poderes, nós não temos verba de publicidade e, por isso, não conseguimos mostrar que temos ilhas de excelência notáveis — disse-me a ministra.

Ponderei que contar uma boa história para a imprensa não depende de verba de publicidade, mas apenas de conversa com jornalista e pedi um exemplo de ilha de excelência.

— Quando eu conto, em outros países, inclusive nos Estados Unidos, que nós fizemos uma eleição num país continental, com 115 milhões de eleitores, e demos o resultado em cinco horas ficam impressionados. E usamos uma urna eletrônica que aqui custou um quinto do preço que custaria em outros países. A opinião pública não se dá conta de que a Justiça Eleitoral usa, num corte transversal. toda a estrutura do Judiciário.

De fato, é um bom exemplo de eficiência, mas que tem sido bem comemorado pela imprensa. A questão central é que a reforma da Previdência não é uma punição pelos conhecidos problemas do Judiciário. Foi apresentada como solução para a redução de custos que se tornarão impagáveis ao longo do tempo e como forma de corrigir desigualdades intoleráveis no sistema de aposentadorias, dos desníveis de benefícios à exclusão de 40 milhões de brasileiros do sistema previdenciário.

Os representantes do Judiciário, em cartas enviadas à coluna e em conversas na festa da posse dos novos ministros, apresentaram os argumentos de sempre: precisam de 60 dias de férias porque trabalham muito. São carreira de Estado e não podem ser tratados como “meros” cortadores de cana. Precisam de aposentadoria alta para evitar a corrupção. Não há desequilíbrio no sistema previdenciário do setor porque existem cinco juízes trabalhando para um na aposentadoria. Se forem retiradas as vantagens que têm hoje, não haverá mais candidatos à magistratura, porque, em início de carreira, um advogado ganha mais do que juiz. Nenhum argumento me convenceu de que devesse fazer qualquer correção que fosse na coluna que escrevi aqui há uma semana.

O trabalho acumulado não é argumento para 60 dias de férias. Deveria ser o oposto. Isso se resolve não com mais férias, mas com reforma do Judiciário. E, afinal, não seriam os únicos brasileiros sobrecarregados. A proporção de cinco trabalhando para um aposentado não dispensa a reforma da Previdência, porque planejadores públicos devem olhar o futuro, quando esta conta se inverter.

O ministro Nelson Jobim tem sido uma voz isolada no Judiciário defendendo a idéia de que existem claras distorções no sistema de aposentadoria, que precisam ser corrigidas. Ele conta sua própria história. Passou a maior parte da vida profissional contribuindo para o INSS; depois, foi parlamentar e pagou ao antigo IPC, instituto de pensão dos parlamentares, que foi extinto e ele recebeu de volta, corrigido, tudo o que pagou, e tem o direito de se aposentar pelo salário integral. São milhares os casos de pessoas, em todos os poderes, cuja história contributiva não tem relação com o que eles terão o direito de receber. Esse é um dos pontos que a reforma quer corrigir.

— Precisamos de serenidade, de olhar com calma o que foi proposto e de ver em que país estamos — disse o ministro.

Há líderes do Judiciário admitindo que “alguma” reforma deve ser feita, mas rejeitam alguns pontos desta. Há outros que admitem que a estratégia agora é mudar a reforma com trabalho de convencimento junto aos congressistas.

Durante a semana, este assunto tomou minha caixa de correio. Em conversas na posse dos ministros em Brasília, vários me disseram que discordavam de tudo o que escrevi no domingo passado. Era previsível. O que me impressionou foi o grau de apoio do cidadão comum à construção de uma previdência mais igualitária para os brasileiros, sem as vantagens para determinados segmentos profissionais.

MAURÍCIO Corrêa fica na presidência do Supremo até dia 9 de maio. Depois, assumirá Nelson Jobim; em seguida, Ellen Gracie — a primeira mulher na história do Supremo — e, depois, Gilmar Mendes. Todos indicados por Fernando Henrique. Ao longo do seu governo, Lula terá direito a indicar mais dois ministros.


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