Pós-mediocridade

Reinaldo Gonçalves

O pior governo da história econômica brasileira dos últimos cem anos
está terminando. A (já) era FHC não deixará saudades. Muito pelo
contrário.Fernando Henrique deixará uma herança trágica. Em oito anos,
alguns recordes históricos foram batidos como, por exemplo, a maior
relação dívida interna/PIB, o maior déficit e a maior carga tributária.
Nem durante a guerra do Paraguai ou às vésperas da Proclamação da
República, houve tanta irresponsabilidade fiscal. Houve, ainda, uma
extraordinária concentração de riqueza e renda em um período marcado por

uma das mais baixas taxas de crescimento econômico da     História do
Brasil. O Brasil andou para trás, tanto em indicadores econômicos, como
sociais, comparativamente ao resto do mundo. Fernando Henrique deixou o
Brasil mais injusto e mais subdesenvolvido. Para ilustrar, enquanto a
renda mundial cresce a uma taxa média anual da ordem de 3,5%, a taxa de
crescimento econômico do Brasil é inferior a 2,4% no período 1995-2002.

Para dezenas de milhões de brasileiros, os direitos fundamentais à vida
somente existem na letra da lei. Em 1995, o Brasil tinha 50 milhões de
pobres e miseráveis, sendo que o número de pessoas em condição de
indigência era de 22 milhões. Em 1999, esses números tinham aumentado
para 53 milhões e 23  milhões, respectivamente. A partir de 1999 a
situação, muito rovavelmente, se agravou em decorrência da piora do
desempenho econômico. A taxa de crescimento médio anual do Produto
Interno Bruto foi de 2,6% em 1995-98 e  menos de 2,2% em 1999-2002. Em
um país marcado por uma das mais     elevadas concentrações de riqueza,
renda, poder e cultura do mundo, a igualdade perante a lei somente é
reconhecida pelos nefelibatas. Brasil, país subdesenvolvido e
profundamente injusto, é uma sociedade de direitos civis  retardatários.

O modelo neoliberal deixa uma herança trágica no que se refere a
direitos sociais e civis. O próximo presidente enfrentará desafios
oceânicos. É muito provável que, nos dois primeiros anos, que focarão os

programas emergenciais para combater a fome e a miséria, a
reconfiguração institucional e a correção dos desequilíbrios econômicos,

haja poucos resultados concretos em termos de  renda e emprego. Esse
período é, no entanto, curto para limpar a herança  trágica e o
desempenho medíocre de Fernando Henrique. Considerando a  "lambança" de
FHC, a previsão de que o ajuste tomará dois anos é claramente
otimista.

Ademais, frente à herança trágica de Fernando Henrique e aos enormes
desafios, não há espaço para voluntarismos ou espamos panglossianos.
Nesse  último caso, deve-se destacar que o desmonte do aparelho
produtivo dificilmente permitirá um aumento significativo da
competitividade internacional da economia brasileira num horizonte de
curto ou médio prazos. O saldo  positivo continuará sendo determinado,
em grande medida, pelo nível das  importações. Se não houver calibragem
da conta de capital, a situação das contas externas será incompatível
com a retomada do crescimento no médio prazo.

Há, ainda, risco das novas classes dirigentes serem contaminadas pelo
síndrome do ultra-realismo. Nesse caso, o discurso padrão é o seguinte:
"uma coisa é o que queremos, outra é o que podemos". Essa síndrome
implica, na realidade, a  falta de ousadia na execução das mudanças e
das rupturas.

No que se refere à política econômica, a seqüência e a temporalidade das

medidas são fundamentais. As políticas monetária, cambial, comercial,
creditícia e financeira podem ser alteradas no curto e médio prazos,
enquanto as políticas fiscal, tecnológica, cambial, agrária e agrícola
já têm horizontes de mais médio e  longo prazos. Entre os
ultra-realistas e os voluntaristas-panglossianos, há alguma margem de
manobra.

Reinaldo Gonçalves é professor da UFRJ.









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