Olá,

Estive na Câmara, ontem, para acompanhar o princípio da perícia no painel 
da Câmara.

Não pude acompanhar a perícia propriamente dita pois os técnicos da Unicamp 
não concordaram com a participação de observadores externos.

Apesar de eu confiar técnicamente neles, o trabalho de observação foi muito 
prejudicado devido a esta intolerância (e um tanto de auto-suficiência) dos 
peritos . A nós, técnicos dos partidos, foi apenas fornecido uma descrição 
dos problemas ocorridos e encontrados.

Eu percebi a clara vontade da diretoria da Câmara de procurar colocar o 
sistema para funcionar até terça-feira e, neste sentido, o rigor de 
procedimentos de perícia estava sendo "ligeiramente" atropelado.

Por exemplo, eu havia solicitado que nos fossem descritos os procedimentos 
que seriam seguidos na abertura do lacre da sala do sistema ANTES da 
efetiva abertura, mas nada nos foi explicado. Apenas nos chamaram para ver 
a abertura do lacre de uma das portas da sala dos computadores na frente da 
imprensa. Acontece que a sala tem outra porta e o lacre desta foi aberta 
sem a presença dos observadores.

Outro exemplo, a primeira providência que se deve tomar nestes casos de 
perícias é "congelar o sistema", como uns dos técnicos da Unicamp mesmo 
afirmou. Isto quer dizer, tirar uma cópia integral  (setor a setor) dos 
discos magnéticos ANTES de se mexer, logar, ou usar o sistema. No Senado 
foram feitos duas cópias de cada disco rígido com a seguinte destinação:
- o original foi lacrado e ficou guardado
- uma cópia foi levado a perícia na Unicamp
- a segunda cópia foi instalada para liberar o sistema para uso

Já na Câmara, seria feita apenas uma cópia que seria guardada e os discos 
originais voltariam a ser instalados para serem usados nos testes e 
verificações. O pior, isto já estava sendo feito sem nossa presença e a 
explicação só foi nos dada a posteriori, quando os procedimentos já estavam 
em andamento.

Já a noite (eu já tinha me retirado) foi encontrada e divulgada a lista dos 
votos da seção em que ocorreu a pane. Esta lista foi retirada do sistema 
ANTES de se efetivamente copiar os discos, ou seja, antes de "congelar o 
sistema". Os técnicos da Unicamp salientaram que a lista fora encontrada 
pronta e gravada e que não podiam até aquele momento garantir a integridade 
dela, a qual já está sendo divulgada pela imprensa.

Eu não diria que estes atos, açodados pela pressa em liberar o sistema, 
invalidam a perícia mas mostra que a presença dos observadores dos partidos 
foi criada mais para aparentar transparência do que para efetivamente 
tornar transparentes os procedimentos da perícia.

As primeiras explicações para o travamento do sistema, que nos foram dadas, 
era a versão do fornecedor e operador do sistema, a empresa Montreal 
Informática (que me disseram pertencer ao EJ). Indicavam que o travamento 
da votação se deveu a uma falha lógica no sistema que resultou da 
utililização de um recurso similar ao "botão macetoso" que havia no Painel 
do Senado.

Pelo o que nos explicaram, o sistema da Câmara permite que seções já 
fechadas possam ser reabertas e que tenham seus dados (presença e votações) 
alterados. Este recurso é disponibilizado para se "consertar" eventuais 
erros ou  procedimentos fora do regulamento na abertura e fechamento das 
seções.
Os operadores recorerram a este "botão macetoso" na terça-feira (véspera do 
dia do travamento) para se tentar corrigir um registro de presença 
irregular na seção extraordinária daquele dia. Mas o uso deste recurso de 
forna inadequada (criar uma nova votação numa seção já encerrada) provocou 
um conflito lógico na numeração das votações (que é um registro primário 
dentro do banco de dados) havendo uma seção anterior com uma votação com 
número sequêncial maior que a votação da seção seguinte. Na primeira 
votação do dia seguinte, quarta-feira, o sistema detectou a irregularidade 
e travou.

Esta versão toda, ainda aguarda confirmação.

No meu entender este caso do painel da Câmara demonstra mais uma vez como é 
dificil fazer um sistema de voto-e seguro e confiável. O problema, mais uma 
vez, teria sido causado por falha interna - aparentemente sem má intenção 
neste caso - ou seja, havia uma falha lógica no projeto (é possivel criar 
uma votação nova dentro de uma seção já encerrada), esta falha não foi 
detectada nos testes e acabou ocorrendo em dado momento crítico na 
utilização do sistema.

Para mim é mais uma evidência de que sistemas eleitorais informatizados 
devem ser necessariamente 100% auditáveis e que o sistema eleitoral do TSE, 
com sua apuração inconferível, programas secretos e testes incompletos, é 
um grande risco.

Comentando o raciocínio do Sen. Paulo Hartung (PSB-ES), Folha de São Paulo, 
30/11/01, pg A4 :

"De trapalhada em trapalhada nos painéis da Câmara e do Senado, o Congresso 
vai desmoralizar o voto eletrônico, que foi uma grande conquista da 
democracia brasileira”.

Lembro que estas trapalhadas nada mais são que resultado da implantação 
precipitidada de sistemas eleitorais sem se dar ouvidos aos alertas de 
gente como nós do Fórum do Voto-e que clamamos por maior rigor no projeto e 
implantação de sistemas eleitorais informatizados.
Fica explicado, assim, por que outros países a implamtação do voto-e 
caminha mais devagar e confirma-se o que escrevi em 1999 no simpósio do ITA:

"O Brasil informatizou o voto em todas as etapas de uma eleição mas isto 
não indica que estamos na linha de frente no domínio desta tecnologia e sim 
que ultrapassamos esta linha de forma imprudente e precipitada. "

[ ]s
    Amilcar

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