Sâo Paulo, 19 de setembro de 2001 

     Prezado Sr. Clovis Rossi 

     Apreciei suas manifestações, em passado recente, relativas a um dos 
maiores absurdos que está ocorrendo em nosso país: a adoção precipitada (ou 
intencionalmente dolosa?) de um sistema de votação cuja honestidade depende 
exclusivamente da vontade de um número restrito de controladores. A fraude 
no painel do Senado mostrou-nos que ele sofria de fragilidades várias, que 
são as mesmas apresentadas pela denominada urna eletrônica (e, diga-se de 
passagem, seria muito difícil sistemas de votação eletrônica resistirem a 
ataques internos, mesmo se projetados com todo o cuidado). 
     Não é exagero dizer que a absoluta falta de transparência de nosso 
processo eleitoral, utilizando as atuais urnas eletrônicas, constitui uma 
das maiores possibilidades de corrupção jamais enfrentadas por nosso país. 
Há quatro anos que inúmeros especialistas em Informática, advogados, 
professores, jornalistas etc., reunidos no Forum do voto eletrônico, 
estritamente apartidário (www.votoseguro.org), e por meio de incontáveis 
artigos em revistas e jornais de todo o país (além de cartas ao leitor, 
palestras e entrevistas), vimos alertando para inconstitucionalidades e 
ilegalidades nos procedimentos das eleições eletrônicas. Nossas principais 
críticas são: (a) a possibilidade de identificação do voto do eleitor, (b) a 
possibilidade de modificação, por programa, do voto dado e (c) a 
impossibilidade de qualquer aferição, conferência ou recontagem dos votos. 
Estas fragilidades, relativamente fáceis de serem sanadas, são as mesmas 
recentemente detectadas no painel do Senado e são características apenas do 
sistema eleitoral brasileiro. Como há na urna programas secretos, negados ao 
exame dos partidos, e os pseudo-testes feitos não garantem nada, esta 
situação gera justificadas desconfianças no eleitor. 
     Está em tramitação no Senado, já aprovado na CCJ por unanimidade, um 
projeto do Sen. Requião (com aperfeiçoamentos do Sen. Tuma e outras 
colaborações), o qual resolve os problemas apontados, reduzindo 
drasticamente a possibilidade de fraudar-se o sistema. Consiste em utilizar 
a impressora, já existente na urna, para impressão paralela do voto, que 
cairia automaticamente em uma urna convencional (lacrada), sem contato com o 
eleitor. Esta urna serviria de contra-prova para recontagem em caso de 
necessidade (além disso, tres por cento das urnas seriam sempre conferidas). 
Deste modo, um eventual fraudador teria sérias dificuldades em alterar 
igualmente dois sistemas diferentes. Porém até agora o TSE tem agido no 
sentido de atrasar qualquer providência tendente ao aperfeiçoamento da urna, 
numa tática protelatória para esgotar o tempo para modificações (a data 
limite é outubro de 2001). Retardou inclusive a perícia pela Unicamp que o 
Senado aprovara em maio de 2001, tirando-a do Senado e não iniciando-a até 
agora. 
    Quero deixar bem claro que nunca afirmamos que a urna já tenha sido 
fraudada. Podemos até dar um crédito de confiança para os atuais detentores 
do controle do sistema eleitoral. Mas o que a Nação, anestesiada, está 
fazendo (mesmo depois da fraude no painel do Senado), é dar um cheque em 
branco, não só para os atuais, mas para todos os futuros controladores deste 
sistema; esta concessão, além de inadmissível, pode frustrar todos os nossos 
esforços para constituir uma democracia em nosso país. Apenas um maior 
empenho de nossos meios de comunicação poderia reverter tal processo. Uma 
máxima da Informática reza que "um sistema computacional, cuja segurança 
depende apenas da honestidade de seu controlador, é um sistema naturalmente 
fraudável". 
     Estou tomando a liberdade de anexar carta que um dos integrantes do 
Forum do voto-e, especialista em Informática, dirigiu recentemente ao 
procurador Luiz Francisco de Souza, fundamentando melhor nossas críticas. 
    Tenho a esperança que os meios de comunicação despertem e se unam a nós 
na cobrança da rápida aprovação do projeto citado, neste esforço para 
deixarmos para as futuras gerações um sistema eleitoral livre de 
desconfianças. De que adianta votar, se não for respeitado o direito do 
cidadão de verificar que seu voto foi corretamente computado? 
     Atenciosamente, 

     Eng.Walter Del Picchia 
     Professor Titular da Escola Politécnica da USP 



                         Carta anexa 

     Rio de Janeiro (agosto de 2001)                                        
Prezado procurador Luiz Francisco.  Há quase cinco anos, desde as eleições 
de 1996, venho procurando denunciar ao TSE, congressistas e veículos da 
imprensa graves falhas das urnas eletrônicas. Nao fui o único a notar os 
problemas. Outros também tiveram no momento em que votaram em 1996 as mesmas 
dúvidas e questionamentos, que na época resumiam-se à digitação do titulo do 
eleitor em teclado ligado a urna. Aos poucos, estas pessoas de todos os 
cantos do país foram se encontrando e vendo que tinham as mesmas dúvidas, e 
a mesma luta.  Um destes companheiros, Amilcar Brunazo, engenheiro como eu, 
organizou uma lista e um site, para onde convergiram os que lutavam pela 
revisão das urnas, e pouco a pouco, mais e mais gente, numa admirável 
comunidade, apartidária, puramente cívica, e que vem se aproximando de obter 
um resultado positivo. Voce pode obter maiores detalhes no site 
<http://www.votoseguro.org> mas, resumidamente, podemos listar os seguintes 
problemas, todos muito graves, embora de fácil solução se houver vontade 
política:  1) A digitação do número do título do eleitor em dispositivo 
ligado à própria urna abre a possibilidade de que mediante simples 
programação seja violado o sigilo constitucional do voto. Isto nunca poderia 
acontecer, devendo a liberação da urna ocorrer por simples botão acionador.  
2) Desde 1998 foi eliminada a cópia impressa do voto colhido. Com isto, 
eliminou-se completamente qualquer possibilidade de auditoria ou recontagem 
de uma seção. Os TREs sistematicamente negam todos os pedidos de recontagem, 
e na verdade se os concedessem nao teriam como recontar qualquer urna. Esta 
ofensa ao legítimo direito dos candidatos abre a brecha para que 
manipulações da programacão interna da urna potencialmente possam mesmo 
alterar resultados, sem que possam ser detectadas pois não há contra prova.  
3) Embora prevista na lei eleitoral a auditoria pelos partidos da 
programacão da urna, o TSE não libera todos os compenentes desta 
programacão, não oferece prazo razoável para o exame, e pior ainda faz 
modificacões após o exame precário que oferece. Nada garante que nos módulos 
não revelados haja código "malicioso", ou mesmo que o programa carregado 
seja aquele parcialmente mostrado aos partidos. O alerta do movimento, após 
muito esforco, conseguiu eco no Congresso, existindo hoje projetos prevendo 
a mudança dos pontos acima mencionados entre os quais destaco os do Senador 
Requião, e o do Deputado Vivaldo Barbosa. O Amilcar Brunazo tem sido 
incansável nesta luta, e hoje assessora a Sub-Comissao do Senado que 
investiga o voto eletrônico. Devo ressaltar porém que há uma enorme 
resistência por parte de justiça eleitoral, que deveria ser a primeira a 
ouvir e procurar aprimorar qualquer falha da urna. Estranhamente porém, em 
lugar disto, empenha-se nesta obstinada resistência. Estamos no momento 
vivendo uma luta contra o relógio. Estes projetos precisam ser aprovados 
antes de outubro para que se apliquem nas proximas eleições em 2002. E o TSE 
vem habilidosamente adiando a sua tramitação, ora pedindo prazos para dar 
informações, e mais recentemente propondo um seminário na Sub-Comissao do 
Voto Eletrônico (SVE-Senado), culminando agora pelas declarações do Ministro 
Nelson Jobim de que irá solicitar auditoria à Unicamp, tomando ao TSE 
inciativa que já estava por ser determinada pelo Senado. Vejo esta aparente 
mudança de atitude do TSE com a mesma preocupação com que via a resistência 
a fazer qualquer mudança, pois transparece por detrás destas iniciativas a 
intenção de primeiro controlar melhor a eventual auditoria, e segundo 
prolongar o processo pelo tempo necessário a que seja perdido o prazo de 
edição das novas medidas.  É neste contexto que venho trazer-lhe nossas 
preocupações e consultá-lo sobre a possibilidade de uma outra alternativa, 
mais eficaz, de garantir já para as eleições de 2002 um sistema mais seguro 
para eleitores e candidatos. Minha sugestão é que seja questionada pelo MP a 
constitucionalidade do sistema eletrônico de votação, com base na possível 
quebra de sigilo e na supressão do direito de recontagem das seções onde 
candidatos se sintam lesados. Como argumento acessório, a não abertura da 
programação integral da urna aos partidos. Se aceita esta tese pela 
instância adequada (STF imagino) o TSE se veria obrigado a corrigir de 
imediato as falhas para poder realizar o pleito de 2002, o que não envolve 
maiores dificuldades, pois bastará ao TSE eliminar a digitação do título, 
ativar a impressão na impressora ja existente, com pequena adaptação, e 
exibir os programas aos partidos. E, prezado procurador Luiz Francisco, por 
toda a coragem e independência que voce tem demonstrado, creio que é a 
pessoa certa para empreender este passo tão importante desta cruzada com 
chances de êxito. Estamos todos à sua disposicão para melhor esclarecer 
qualquer dúvida sobre as falhas, suas consequências, como corrigí-las, ou 
qualquer outra informação eventualmente necessária.  Atenciosamente, 
Benjamin Azevedo, Engenheiro. 

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