Sr. Redator,
É impressionante como o ufanismo consegue virar as cabeças até de
pessoas que deveriam, por força da profissão, ser neutras e
investigativas. A matéria com o título acima, é um primor de
jornalismo às avessas, onde o repórter simplesmente transcreveu o que
lhe disseram, sem fazer a mínima pesquisa para averiguar a veracidade
da notícia.
1. A Urna Eletrônica brasileira, idealizada pelo TSE, não passa pela
avaliação de nenhum órgão sério. O relatório MIT/Caltech, produzido
por duas das maiores instituições de pesquisa e desenvolvimento dos
Estados Unidos, após o fiasco das eleições americanas de 2000, rejeita
o modelo brasileiro que não permite auditoria. O relatório da Unicamp,
encomendado pelo próprio TSE após o escândalo do painel eletrônico do
Senado, impõe sérias restrições à UE, com oito recomendações para
melhorá-la, nenhuma acatada pelo TSE.
2. Somente um país que se interessa em resultados rápidos sem nenhum
compromisso com a confiabilidade irá comprar a UE brasileira.
Oferecida a inúmeros países, a UE só foi usada no Paraguai por
empréstimo feito pelo TSE, o que, convenhamos, não é exatamente uma
recomendação.
3. O novo fiasco do teste das urnas americanas na Flórida, como mostra
a reportagem apenas evidencia a transparência do sistema: os defeitos
são apontados e reconhecidos, não mascarados como os da urna
brasileira que o TSE faz questão de apresentar como a oitava maravilha
do mundo.
4. Se "O Estado" tivesse enviado um repórter à sede do TRE em São
Paulo este sábado, para a cerimônia de carga das urnas da 1ª Zona
Eleitoral, teria presenciado o que - de fato - pode realmente ser
chamado de fiasco: nos testes feitos em urnas escolhidas ao acaso por
fiscais de partidos, as quatro primeiras apresentaram defeitos de toda
ordem - hardware e software. Quando, finalmente, encontrou-se uma urna
apta a rodar os testes - programa desenvolvido pelo próprio TSE que
permite, entre outras funções, listar o nome de todos os candidatos
presentes na urna - o cartório exibiu uma resolução do TSE que proibe
a execução deste programa em estados que possuem mais de um certo
número de candidatos, que é o caso de São Paulo, Minas Gerais e Rio de
Janeiro. Em suma, os brasileiros destes estados irão votar no próximo
domingo sem saber se as urnas foram devidamente carregadas e testadas.
É bom lembrar que em 2000, em vários municípios, como Araçoiaba da
Serra, descobriu-se que candidatos de alguns partidos simplesmente não
apareciam na urna.
5. Assim mesmo, a apresentação da carga das urnas não passa de uma
pantominia: o programa auditor - se funcionasse - não teria nenhum
valor, pois foi desenvolvido pelo próprio TSE: em nenhuma empresa é
aceito uma auditoria que não seja externa. E não se diga que o TSE
permitiu aos partidos verificar os programas que constam das urnas. É
sabido que o conjunto dos programas que compõem a urna - mais de
35.000 - que o TSE liberou para a verificação, não é completo e é
impossível de ser auditado: cerca de 2 segundos por arquivo! Além
disso, não há a mínima garantia de que os programas exibidos são os
mesmos que estavam sendo carregados na urna. Para quem quisesse ver
esta carga no sábado, o diretor do cartório tirava um flash card do
bolso e o colocava nas urnas!
Sr. Redator, falta seriedade e transparência no tratamento dado a este
projeto pelo TSE, e a imprensa, em particular "O Estado de S. Paulo",
não tem dado a devida atenção ao assunto. Os repórteres de política do
jornal podem não ter a qualificação técnica necessária para entender a
gravidade da situação, mas eu esperava que os que escrevem para o
Suplemento de Informática a tivessem. Vindo do mais reputado periódico
brasileiro, considero isso lamentável.
--
Atenciosamente,
Roger Delrue Chadel
RG 3.670.817 SSP-SP
Tel. 11-3816-2555
Roger Chadel
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