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A
urna eletrônica é segura?
Especialistas discutem a vulnerabilidade
da eleição mais informatizada do mundo
O Brasil realiza em outubro de
2002 a eleição mais informatizada do mundo:
404 mil urnas eletrônicas em 6.600 cidades receberão
o voto de 115 milhões de cidadãos. Contudo,
alguns pesquisadores e especialistas em segurança eleitoral
questionam a inviolabilidade do sistema eletrônico de
votação. Alega-se que o fato de o código-fonte
dos softwares da urna eletrônica não ter sido
aberto aos partidos tornaria o sistema passível de
fraudes: a possibilidade de identificação do
voto de cada eleitor e a impossibilidade de recontagem de
todos os votos são as principais críticas.
O funcionamento da urna eletrônica é simples:
ela recebe os votos, emite ao final cinco cópias do
resultado (o boletim de urna) e o presidente de mesa manda
os disquetes para o Tribunal Regional Eleitoral de seu estado.
O banco de dados verifica a equivalência entre o número
de eleitores e votos por meio de resumos criptográficos.
O sistema operacional VirtuOS será utilizado em 350
mil urnas (o restante usará o Windows CE). O código-fonte
do sistema, porém, não foi aberto a representantes
dos partidos, pois a patente pertence à empresa Microbase,
com a qual o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) assumiu compromisso
de sigilo.
Alguns softwares das urnas como os aplicativos de votação
e auditoria, o sistema operacional e o criptográfico
são potencialmente fraudáveis. Se o aplicativo
de votação for alterado, por exemplo, é
possível passar para um candidato um voto dado a outro.
As urnas podem ser atacadas central ou regionalmente,
diz Amílcar Brunazo Filho, engenheiro especializado
em segurança de dados e moderador do Fórum do
Voto Eletrônico. Basta uma boa noção
de programação e acesso aos programas.
Outro foco possível de fraude é a biblioteca
criptográfica, que protege os dados gravados nos boletins
de urna antes da apuração. A Agência
Brasileira de Inteligência [órgão vinculado
à Presidência da República] adaptou e
forneceu ao TSE uma biblioteca pública, a Miracl, pega
da internet, diz Brunazo. Há risco de fraude
caso haja falhas no sistema que o autor da biblioteca saiba
explorar. Esta poderia executar tarefas para a qual não
foi especificada, como interceptar dados enviados do teclado
para o programa de votação e deste para tela
o que pode alterar o resultado da votação.
O TSE reuniu numa única máquina os processos
de identificação, votação e apuração.
O número do título do eleitor é digitado
pelo mesário e computado no mesmo hardware que o voto.
Isso permitiria identificar o eleitor e seu voto, o que viola
o princípio do voto secreto. É o mesmo
método utilizado pelo computador do Senado: voto e
informação juntos, ironiza Brunazo, em
alusão à recente fraude no painel do Senado.
Apesar das críticas, não há vestígios
de falhas no sistema segundo o pesquisador Jeroen van de Graaf,
do Laboratório de Computação Científica
da Universidade Federal de Minas Gerais. Não
constatei erros nas observações práticas
que realizei, diz. A logística do sistema
é impressionante. O único problema é
a impossibilidade de auditoria e recontagem dos votos.
Para solucionar a questão da recontagem, o TSE decidiu
colocar impressoras em 5% das urnas. Dessas, 3% serão
contabilizadas, porém serão sorteadas na véspera
da eleição. Com isso, o procedimento perde
qualquer valor para auditoria, diz Michael Stanton,
pesquisador do Instituto de Computação da Universidade
Federal Fluminense. É possível confeccionar
um programa da urna para trapacear apenas se não houver
uma impressora acoplada a ela. Se não houver
impressora em sua urna, o eleitor não terá como
confirmar que seu voto foi computado para o candidato escolhido.
A receita para um bom candidato
Estudo avalia relevância
de escolarização, titulação e
militantismo para trabalho político
Debates sobre o preparo político
de candidatos são constantes na atual eleição,
embora poucos estudos revelem o que é estar bem preparado.
Para descobrir quais fatores são relevantes para possibilitar
uma carreira política bem-sucedida, o sociólogo
Odaci Luiz Coradini, da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, desenvolveu um estudo sobre a importância da
escolarização, da titulação universitária
e do militantismo para o trabalho político.
Coradini entrevistou funcionários dos primeiros escalões
(eleitos ou escolhidos) de dois governos, do PMDB (1995) e
do PT (1999), no Rio Grande do Sul. Ele constatou aumento
no nível de escolarização dos que trabalham
na política são raros os que não
têm curso superior. Outro fator interessante foi a expansão
do número de profissionais com cursos como ciências
sociais, em detrimento dos tradicionais diplomados em direito
ou engenharia. No período avaliado, a participação
de sociólogos no secretariado do governo cresceu de
um para cinco na troca de mandatos, enquanto a de economistas
permaneceu igual e a de administradores praticamente desapareceu.
A sucessão trouxe mudanças significativas, das
quais sobressai a maneira de pensar a utilidade da escolarização
para a política. A maioria dos profissionais
do governo iniciado em 1999 tem uma maneira militantista de
conceber as atividades políticas, explica Coradini.
Eles dificilmente desvinculam política partidária
de outras formas de militância, como movimento estudantil
ou sindical, e, da escolarização formal, aproveitam
mais as relações estabelecidas. Por outro lado,
para a ocupação de um cargo político
no governo anterior, prevaleciam diplomas socialmente mais
valorizados e a suposta competência técnica.
Para descobrir os fatores considerados pelos eleitores na
escolha do candidato foi aplicado um questionário,
que analisava não só suas preferências,
mas também sua escolarização e renda.
O resultado mostrou que pessoas com pouca escolaridade tendem
a votar em candidatos sem relação com a política
ou conhecidos seus. Os políticos usam esse dado para
tentar criar uma identificação com eleitores:
por isso, não é raro encontrar em propagandas
destaque para a falta de experiência do candidato. É
como se eles dissessem: não sou profissional, sou como
um de vocês, diz Coradini.
Nas camadas mais escolarizadas observam-se duas tendências
diferentes. Há um grande percentual de atuantes na
política que, em geral, levam em conta a obediência
ao partido e o grau elevado de instrução.
No entanto, existem também os anti-militantistas
apesar de pouco interesse pela política ser
característica dos menos escolarizados , que
votam nos que têm pouca relação com a
política. A diferença é que esses não
levam em conta o conhecimento pessoal, mas a imagem de competência
do candidato.
No exemplo estudado fica claro que o interesse pela política
aumenta em função da escolaridade. No entanto,
a pesquisa também concluiu que a titulação
escolar pode ser usada de formas diferentes, pois é
concebida de maneira distinta pelos políticos. Embora
seja óbvio que o aumento do militantismo está
ligado à escolarização, é preciso
considerar que esta não é causa, mas recurso
na esfera política, conclui Coradini.
O artigo Escolarização,
militantismo e mecanismos de participação
política, de Odaci L. Coradini, foi publicado
em Como se fazem eleições no Brasil Beatriz
Heredia, Carla Teixeira, Irlys Barreira (orgs.) Rio de Janeiro,
2002, Editora Relume Dumará 274 páginas - R$
25,60
Gisele Lopes
Ciência Hoje on-line
27/09/02
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