Tenho conversado com muita gente a respeito da possibilidade de fraude, e tenho tido muitas surpresas. Primeiro, estou notando que, pouco a pouco, as pessoas estão se dando conta da possibilidade de se fraudar a tão decantada urna. Mas o que mais me choca é a ignorância total das pessoas, mesmo de quem tem embasamento informático razoável, sobre como se pode dar a fraude.
As pessoas acreditam na urna eletrônica como um processo manual acelerado. Até hoje, nas reportagens sobre as eleições mostra-se as pessoas apertando o botão de confirma da mesma forma como se via, tempos atrás, alguém enfiando o voto na urna, como se fosse esse o ponto mais importante do processo democrático. Naquela época sabia-se perfeitamente o caminho que a cédula iria tomar: ficaria dentro do saco de lona até ser despejada numa mesa de apuração, onde seria examinada por vários fiscais, e em seguida seu conteúdo seria transcrito numa planilha, que seria posteriormente digitado num computador (estou falando da época imediatamente anterior à atual) e depois totalizado. Embora o processo seja totalmente outro depois que foi criada a urna eletrônica, e que nada se pode dizer sobre o caminho do voto a não ser que se tenha um conhecimento total sobre a máquina (hardware) e os programas que estão nela (software), as pessoas ainda acreditam que é tudo igual. Cheguei até a ouvir uma vez que se eu desconfiava da urna eletrônica, deveria também desconfiar da calculadora, já que também não sei qual é o caminho que o número que eu digito vai seguir. A diferença, que ninguém parece se dar ao trabalho de verificar, é que não interessa a ninguém ter uma calculadora que não seja precisa. Lembro-me da minha primeira calculadora, onde enfiava toda sorte de cálculos para ver se conseguia pegá-la em falha! Mesmo assim, descobriram um chip de um 386 que errava em cálculos de ponto flutuante, e que teve que ser trocado. Mas uma urna que torne os números mais vantajosos para determinado candidato interessa, e muito! O desafio, portanto, é fazer uma urna que agilize o processo de apuração, aumente o grau de confiabilidade e impeça, tanto quanto possível, o risco de fraude. E isto só pode ser feito mediante ampla discussão com a sociedade, em particular a científica, e deixando todo o processo transparente, visível a quem quer que seja. A respeito de [VotoEletronico] Urna eletronica: protocolo do teste da votacao simulada, em 26/10/2002, 22:26, Jorge Stolfi escreveu: JS> Car*s interessad*s (suponho) na confiabilidade da urna eletrônica: JS> Um artigo da "Tribuna da Imprensa" (Rio de Janeiro) de 26/out/2002, JS> transcrito por O. Maneschy, traz a seguinte observação do Pedro JS> Rezende sobre o teste da urna (votação simulada) a ser realizado JS> em paralelo com a votação real: JS> > Já que o sorteio das [urnas] que serão fiscalizadas no dia da JS> > eleição ocorre na véspera da eleição, quem estiver interessado JS> > em fraudar desviando votos no boletim de urna estará interessado JS> > também em avisar às urnas sorteadas para não fraudar. Este aviso JS> > poderia ser dado de várias maneiras, como por exemplo, por JS> > controle remoto. O controle remoto evitaria ao fraudador JS> > precisar envolver o mesário ou algum eleitor na necessidade de JS> > avisar à urna para não fraudar. Um dispositivo semelhante ao JS> > controle do alarme de carros, por exemplo, poderia dar conta do JS> > recado.", suspeita Rezende. JS> Se entendi direito, os votos que serão usados no teste de amanhã JS> (votação simulada) são fornecidos ao TSE na forma de cédulas, JS> preparadas pelos partidos, e são digitados na urna por um oficial do JS> TSE. Imagino que outro oficial do TSE fica no micro-terminal do JS> mesário, digitando os números dos títulos dos eleitores da seção JS> sorteada. JS> Como observa o Pedro, os testes só tem valor se houver certeza que o JS> software testado é o mesmo que está sendo usado na votação real, e se JS> não existir nenhum truque que permita a um eventual vírus na urna JS> descobrir que se trata de uma votação simulada. (Aqui "vírus" quer JS> dizer um conjunto de instruções maliciosas, inseridas no software JS> da urna a fim de alterar os votos registrados antes da geração JS> do boletim de urna.) JS> Infelizmente, acredito que o vírus poderia obter facilmente essa JS> informação de várias maneiras, das quais a que o Pedro cita é apenas JS> uma. Aqui vão algumas outras possibilidades que me ocorreram: JS> 1. Com cumplicidade dos oficiais do TSE: JS> O oficial que digita os votos poderia usar algum código sutil JS> para avisar o vírus. Por exemplo, apertar três vezes seguidas a JS> tecla "confirma" ou "corrige" (daria para notar isso no vídeo?), JS> apertar duas teclas ao mesmo tempo (uma delas escondida pela mão), JS> ou cometer um erro específico e corrigir, ou ... JS> Imagino que truques semelhantes poderiam ser usados também pelo JS> oficial que simula o mesário. JS> Se o oficial-mesário tem algum controle sobre a ordem dos votantes JS> simulados, ele poderia avisar o vírus digitando, por exemplo, 6 ou JS> 7 números de eleitor sucessivos com mesmo algarismo final; ou JS> colocando em 2º e 4º lugar na ordem de votação os dois eleitores JS> da seção que tem maiores números; ou.... JS> Um dos oficiais poderia avisar o vírus mexendo na impressora JS> (liga/desliga/online/etc) em horários anômalos, ou numa seqüência JS> improvável. JS> 2. Via as cédulas de teste: JS> Um fiscal de um dos partidos poderia avisar o vírus incluindo JS> no teste uma cédula com uma combinação altamente improvável de votos. JS> Pergunta: as cédulas de teste podem incluir testes de votos nulos? JS> Em caso afirmativo, valeria aqui também o truque do erro específico. JS> Um partido poderia avisar o vírus incluindo no seu lote de cédulas JS> um número improvável de votos para um determinado candidato. JS> 3. Sem colaboração externa: JS> O vírus poderia coletar estatísticas sobre a temporização dos JS> vários eventos, e compará-las com os valores esperados numa JS> votação real. Por exemplo, os oficiais do TSE certamente vão ficar JS> mais ágeis com o tempo; se eles não se policiarem cuidadosamente, JS> em pouco tempo estarão digitando os votos muito mais rapidamente JS> do que o eleitor médio. JS> Na votação real, geralmente há um intervalo de alguns segundos JS> entre a saída de um eleitor da urna e a chegada do próximo. JS> Se um único oficial fica sentado na urna, simulando JS> todos os eleitores, este intervalo pode encolher bastante. JS> O vírus poderia cometer sua fraude somente depois de observar pelo JS> menos X eleitores que levaram mais de Y minutos para se decidir. JS> O vírus poderia detectar o teste pela emissão do boletim de urna JS> inicial, que verifica se os totais estão zerados (ou por sua JS> emissão em horário diferente do que seria esperado numa votação JS> real). JS> O vírus poderia detectar o teste por anomalias no horário de JS> instalação dos periféricos (micro-terminal e impressora). JS> Na votação real, se bem me lembro, enquanto um eleitor vota, o JS> número do eleitor seguinte já está sendo digitado pelo mesário no JS> micro-terminal. É isso mesmo? A ordem destas ações, e os JS> intervalos de tempo entre elas, são corretamente simulados na JS> votação de teste? JS> Na votação simulada, os eleitores votam em ordem aleatória, ou em JS> ordem sequencial de título? JS> Na votação simulada, são simulados também eleitores ausentes? JS> No final do dia, o vírus poderia comparar o resultado da votação JS> contra as melhores projeções disponíveis (escamoteadas, por exemplo, JS> num cantinho do disquete de carga, ou durante a (re)inseminação da JS> urna), e desconfiar se houver muita diferença. JS> (Aliás, imagino que cada partido vai querer usar a maioria das suas JS> cédulas de teste para votar no seu candidato, pois sua maior JS> preocupação deveria ser com o possível sumiço de alguns desses JS> votos. Portanto, se cada partido prepara o mesmo número de cédulas JS> de teste, e há k partidos apoiando um determinado candidato, JS> pode-se prever que na votação simulada esse candidato receberrá JS> aproximadamente k/N dos votos.) JS> 4. Com truques físicos: JS> A urna tem alguma abertura não lacrada, mesmo que pequena JS> (para ventilador, por exemplo)? Se tiver, talvez seja possível JS> introduzir um arame por lá, encostar num terminal do circuito JS> impresso (de um jumper não usado, por exemplo), e através dele JS> mandar um aviso para o vírus. Isso seria feito durante o JS> transporte, ligando-se temporariamente a urna; o vírus teria então JS> que apagar esse evento dos logs. Outra possibilidade seria usar essa JS> abertura para instalar um jumper discreto (p. ex. um pedacinho de JS> fio metálico capilar), ou cortar discretamente um condutor do JS> circuito impresso. Esta alternativa não exigiria que a urna fosse JS> ligada durante o trajeto. JS> O cabo que liga o micro-terminal à urna poderia ser usado como JS> antena receptora. (Uma antena transmissora próxima, por exemplo JS> embutida na mesa, poderia talvez injetar caracteres espúrios no JS> cabo, mesmo que este seja blindado). O vírus seria alertado JS> pela presença de ruído (caracteres inválidos) na linha. JS> Algum cabo ou condutor impresso supérfluo dentro da urna --- por JS> exemplo, uma porta serial não usada --- poderia servir de antena JS> receptora de rádio. O vírus seria alertado ao notar presença de JS> ruído, ou algum sinal específico, nessa porta. JS> É difícil falsificar um lacre de urna? É fácil verificar JS> se um lacre é legítimo? JS> 5. Método besta: JS> Suponho que o teste vai usar a versão normal do programa de JS> votação, certo? E não uma versão especial para testes... JS> (Desculpe a pergunta, mas neste universo "tudo é possível"...) JS> De modo geral, os truques acima não me parecem ser mais malucos ou JS> difícieis de implementar que os rotineiramente usados por hackers e JS> espiões industriais. JS> O vírus poderia combinar várias destas condições (1 dentre 3, 2 dentre JS> 5, etc.), ou várias instâncias da mesma condição, para aumentar a JS> confiabilidade do seu "detector de teste". JS> Em caso de dúvida, o vírus deve supor que se trata de teste --- JS> obviamente, é melhor deixar de acionar a fraude em algumas seções JS> da votação real, do que acionar a fraude na votação simulada. JS> O vírus pode levar o dia inteiro para coletar os dados e decidir se a JS> votação é teste ou pra valer. Note-se que a alteração dos totais de JS> votos pode ser adiada até o último segundo antes da emissão dos JS> boletins e gravação no disquete. JS> Bom, estas são apenas as idéias que um velho professor conseguiu bolar JS> em algumas horas. Tenho certeza que um hacker adolescente se sairia JS> muito melhor... JS> Jorge Stolfi JS> Professor Titular JS> Instituto de Computação, Unicamp JS> ______________________________________________________________ JS> O texto acima e' de inteira e exclusiva responsabilidade de seu JS> autor, conforme identificado no campo "remetente", e nao JS> representa necessariamente o ponto de vista do Forum do Voto-E JS> O Forum do Voto-E visa debater a confibilidade dos sistemas JS> eleitorais informatizados, em especial o brasileiro, e dos JS> sistemas de assinatura digital e infraestrutura de chaves publicas. JS> __________________________________________________ JS> Pagina, Jornal e Forum do Voto Eletronico JS> http://www.votoseguro.org JS> __________________________________________________ -- Grande abraço, Roger Chadel -------- //// |---//---| | / | Você tem certeza de que seu voto vai para seu candidato? |--------| www.votoseguro.org -------- Extraido de minha coleção de taglines: O importante não são os homens de minha vida, mas sim a vida que há nos meus homens (Mae West) /"\ \ / Campanha da fita ASCII - contra mail html X ASCII ribbon campaign - against html mail / \ ______________________________________________________________ O texto acima e' de inteira e exclusiva responsabilidade de seu autor, conforme identificado no campo "remetente", e nao representa necessariamente o ponto de vista do Forum do Voto-E O Forum do Voto-E visa debater a confibilidade dos sistemas eleitorais informatizados, em especial o brasileiro, e dos sistemas de assinatura digital e infraestrutura de chaves publicas. __________________________________________________ Pagina, Jornal e Forum do Voto Eletronico http://www.votoseguro.org __________________________________________________