A GLOBO SE RENDE A BRIZOLA
(Eliakim Araújo / Artigos - 25.06.2004)
Sobre o autor: Foi noticiarista da Radio Jornal do Brasil, Âncora dos Jornais
da Globo, da Manchete e do SBT. Ancorou o primeiro canal internacional de
notícias em língua portuguesa. Vive em Miami, onde tem uma produtora de
jornalismo e publicidade.
 
Eu estava na TV Globo durante o primeiro mandato de Leonel Brizola à frente do
governo do Estado do Rio. Entrei em maio de 83, pouco depois da posse do novo
governo, e o jornalismo da Globo passava por uma grave crise de credibilidade,
com seus repórteres e carros ameaçados nas ruas pela população. Pesava sobre a
emissora a acusação de, junto com a Proconsult, empresa contratada pelo TRE
para apurar os votos da eleição direta para governador do Estado, em 1982,
tentar fraudar o resultado para dar a vitória a Moreira Franco, o candidato do
regime militar, apoiado pela família Marinho.

Vale esclarecer, para quem não se lembra ou para os mais jovens – que volta e
meia mostram curiosidade em saber o que aconteceu de fato naquela eleição do
final de 1982 -, que a emissora dos Marinho não tinha simpatia por Brizola,
visto pela direita como um perigoso agitador que voltava de um exílio de 15
anos, decidido a recuperar seu lugar na política brasileira que os militares
de 64 lhe haviam cassado.

Pois bem. Moreira era forte no interior e Brizola dominava o eleitorado na
cidade do Rio de Janeiro. A Globo passou a priorizar a divulgação dos números
do interior e já no final do primeiro dia de apuração os matemáticos da
Proconsult estimavam a vitória de Moreira pela apertada diferença de 60 mil
votos. Só que a Rádio Jornal do Brasil (Procópio Mineiro era o diretor de
jornalismo) tinha montado um esquema com estagiários que somavam os votos do
interior e da capital nos próprios mapas do TRE. E, com apenas dois por cento
dos votos apurados, a JB já projetava a vitória de Brizola.

Com base nos números da Rádio JB, Brizola botou a boca no trombone e
questionou, ao vivo, o então diretor de Jornalismo da Globo, Armando Nogueira,
sobre a discrepância entre os números que a emissora divulgava, com base na
Proconsult, e os números reais colhidos nos mapas do TRE. Quase um mês depois,
o TRE divulgava os números oficiais, dando a Brizola a tranquila vitória com
34 por cento dos votos.

A Globo nunca o perdôou e preparou-se para dar troco. Durante todo primeiro
governo Brizola (1983/86), os noticiários da emissora sistemáticamente
divulgavam os números da violência no Rio, responsabilizando o governador por
um crescente fenômeno social que hoje é a maior preocupação da sociedade
brasileira. Mas não importava, o negócio era responsabilizar o governador do
Estado. Os leitores mais velhos devem lembrar do velho Cid Moreira, com sua
poderosa voz, anunciando diariamente em manchete no Jornal Nacional: “A
violência no Rio”. Sem contar que, muitas vezes editoriais do jornal O Globo
contra o governador eram lidos na íntegra na TV. Um verdadeiro massacre que
daria frutos em futuras eleições.

A vingança do império veio na eleição presidencial de 1989. Brizola era o
favorito nas pesquisas. A Globo abraçou firmemente a candidatura Collor, um
quase desconhecido ex-governador de Alagoas. Collor, com muito dinheiro e uma
excelente equipe de marketing, criou o slogan de caçador de marajás. Comprou,
de pequenas legendas, dois programas eleitorais de uma hora e ganhou de
presente da emissora dos Marinho um Globo Repórter inteiramente dedicado a ele
e à sua “caçada implacável aos marajás”.

Os institutos de pesquisa começaram então a reverter a tendência do
eleitorado, e em julho de 89 Collor disparava na frente, com o segundo lugar
disputado, voto a voto, entre Lula e Brizola. No final, Brizola perdeu para
Lula o direito de enfrentar Collor no segundo turno. Para se ter uma idéia, em
São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, Brizola teve só meio por cento
de votos. Tivesse ele tido mísero um por cento dos votos paulistas e ele
estaria no segundo turno contra Collor. E aí, com certeza, a história do
Brasil seria outra.

O que vi no Jornal Nacional da última terça-feira soou-me como um pedido de
desculpas da emissora ao líder desaparecido. O tempo gasto com a cobertura da
morte, desde o velório no Rio aos depoimentos de políticos em Brasília, a
presença de um dos Marinho junto ao caixão, tudo pareceu uma penitência por
tantas injustiças cometidas. Nos textos dos repórteres da Globo encontrei
expressões como “Brizola, até o último momento, foi fiel às suas idéias e ao
trabalhismo”, ou esta outra “ele dedicou sua vida política ao Brasil”.

Mais do que um comentário, a coluna de hoje é um relato histórico do que
testemunhei nos meus anos de Globo.

Peço que os leitores me perdoem por trazer a público os fatos acima, muitos já
do conhecimento geral. Mas é importante que a história reconheça o bravo
guerreiro que ousou enfrentar o império e por isso não conseguiu galgar o mais
alto posto da política brasileira. Brizola tinha dessas coisas, gostava de
enfrentar poderosos e respeitar os humildes e excluídos pela sociedade. Coisa
de uma geração de políticos, cujo ciclo se encerra com ele.

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