Engenheiro patenteou em 1995, antes do TSE, urnas eletrônicas

O Globo On Line - 05/02/2001

Criada para acabar com as fraudes e acelerar a votação, a urna eletrônica virou objeto de disputa autoral. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que encomendou a criação do equipamento em 1995, descobriu que, um ano depois, ele foi registrada por um engenheiro eletrônico no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Carlos Moretzsohn Rocha apresentou seu pedido de patente, de número PI 9601961, em julho de 1996.

O TSE alega que também fez o pedido de patente, sob o número PI 9806563-7. Só que não diz quando o fez. Segundo o engenheiro, que participou da criação do primeiro modelo da urna eletrônica, isso só aconteceu em 1999, quando o tribunal, usando a alegação de tema de interesse da defesa nacional, registrou em caráter sigiloso o pedido de patente. Os dois pedidos ainda não foram julgados pelo INPI.

O TSE já poderia ter recorrido à Justiça, mas ainda não o fez. E sustenta que a patente nem é sua, mas da União, que custeou o desenvolvimento do projeto e pagou pelas urnas.

- Temos que resguardar os direitos da União nesse assunto - afirmou o presidente do TSE, ministro Néri da Silveira.

- Caberá à Advocacia Geral da União atuar num recurso judicial. Parece claro que a urna eletrônica é de propriedade da União - reforçou outro ministro do TSE, Fernando Neves.

Mas Carlos Rocha diz que está tranqüilo. Em 1995, ele dirigia a empresa Omnitech, que foi contratada pela multinacional Unisys para trabalhar na criação e na montagem da primeira versão da urna. O projeto derrotou duas outras propostas, das empresas IBM e Procomp, na primeira licitação para a fabricação da urna, há pouco mais de cinco anos.

Na época, o tribunal não tinha se preocupado em pedir a patente. No edital e no contrato com a Unisys, um artigo determinava a transferência definitiva "dos direitos patrimoniais de autoria" para o TSE. Mas Rocha alega que o texto não impede o registro de sua patente. O contrato do tribunal com a Unisys fala em cessão de direitos autorais "que decorram da utilização direta ou indireta pela Justiça Eleitoral".

- Isso é apenas direito de uso. O direito autoral é de quem criou. E o TSE não criou a urna. Tanto é que, no início, deu as diretrizes básicas e surgiram três propostas completamente diferentes - afirma.

O secretário de Informática do TSE, Paulo César Camarão, sustenta que foram os técnicos do tribunal que idealizaram a urna eletrônica e listaram o que queriam em 94 itens que deveriam ser seguidos pelas empresas interessadas em fornecê-la ao TSE.

- A Unisys desenvolveu o projeto decidido pelos técnicos do tribunal, sem mudar nada - alega Camarão.

Apesar do registro do pedido de patente do engenheiro ser de 1996, a disputa pela paternidade da urna só começou em 1999, após a divulgação do resultado da licitação para o fornecimento de urnas para as eleições municipais de 2000. Nessa ocasião, Rocha não estava mais ligado à Unisys. Tinha se associado à Itautec, que foi uma das três concorrentes.

A Itautec cobrou R$ 206 milhões pelo serviço. A Unisys, R$ 199 milhões, e a Procomp, R$ 196 milhões. Como a diferença entre as propostas não passou de 6%, o empate previsto no edital deveria ser superado com a observação de critérios técnicos. A Itautec alegou que teria que ser escolhida pelo critério que privilegia empresas cujos produtos de informática foram desenvolvidos no Brasil. O TSE não aceitou e deu a vitória à Procomp.

Rocha tentou recorrer ao Tribunal de Contas da União (TCU), sem sucesso. Indignado, ele denuncia na internet (www.ue2000.com.br) o que considera uma licitação irregular. Agora, vai processar a Procomp, cobrando pagamento de direitos autorais pelas urnas eletrônicas vendidas ao TSE. Rocha também acusa o tribunal de favorecer a Procomp na disputa da patente da urna.

- O TSE está querendo proteger a Procomp. Por quê?

A Procomp não reconhece os direitos autorais de Rocha e sustenta que a urna eletrônica pertence ao TSE. Afirmando que só o TSE tem direitos sobre o equipamento, o secretário de Informática do tribunal cobrou, na semana passada, explicações do Centro de Pesquisa Tecnológica da Universidade Federal de Santa Catarina. A instituição foi citada numa reportagem como tendo feito uma parceria com o MIT (órgão de pesquisa dos Estados Unidos), que incluiria estudo da urna eletrônica.

Em carta, o centro de pesquisa reconheceu que a titularidade da tecnologia é do tribunal e disse que o assunto não fará parte da cooperação com o MIT.

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