Você conhece grego? Conheço um pouco; há muito tempo traduzi muita coisa dos
pré-socráticos, especialmente Heráclito, algo de Platão (a pedido de Nise da
Silveira, o mito do andrógino), partes das cartas principais de São Paulo,
coisas da patrística, textos como Perì mustikês philosophías, do
pseudo-Dionísio. Reflexos disso aparecem num livro meu, esgotado, de 1972,
_O Corpo e a Existência_.

MUITO CUIDADO ao dizer p.e. que kósmos é o ``sentido da vida'' para os
gregos. Penso num dos raros, talvez o único fragmento de Heráclito onde se
fala de kósmos - palavra ambígua, com dois sentidos divergentes. Tive uma
vez uma longa discussão sobre sua tradução com Emmanuel Carneiro Leão. Sobre
phúsis, pior: veja Diels-Kranz 22 B 123.

2008/10/1 Edson Dognaldo Gil <[EMAIL PROTECTED]>

> Caros,
>
> O Desidério gosta muito de apontar falácias na argumentação dos outros, mas
> não se dá conta das suas. A preferida dele é o Bulverismo. Ele não se cansa
> de explicar os mecanismos psicológicos pelos quais os incompetentes e
> imaturos são impossibilitados de pensar outra vez [como se pensar certo uma
> vez fosse pior que pensar errado duas]. E ele faz isso ao mesmo tempo que
> afirma não se poder saber quais eram as preocupações primárias dos filósofos
> mortos: então dos vivos se pode?
>
> A resposta ao Desidério é muito simples: salvação, tal como usada pelo
> colega antes de mim e por Luc Ferry em O que é uma vida bem-sucedida, não
> tem um sentido exclusivamente cristão. [O sentido da vida para os gregos era
> o cosmo, a physis; para os cristãos, Deus; para os primeiros modernos, o
> sentido da vida devia ser procurado no próprio homem, ora racional ora
> sensível; depois o sentido foi buscado na história e em seguida na linguagem
> em sentido lato. Hoje enfrentamos uma crise de sentido, daí se falar não só
> da morte de Deus, mas do próprio homem, do sujeito, e de se escrever sobre o
> sentido do sentido e coisa parecida.] Mas a associação com a religião é
> óbvia. Apenas, a religião pode assumir várias formas, inclusive atéias,
> civis etc. Marx, ateu materialista, estava preocupado com quê, senão com a
> salvação? E Hume, o cético empirista, quando criou a ciência do homem?
> --Aliás, o mesmo Hume que mandava queimar livros de metafísica, dizia que um
> povo inteiramente privado de religião pouco difere dos animais.
>
> Não sei dizer se Kuhn tratou ou não do sentido da questão da salvação ou do
> sentido da vida etc., pois não conheço toda a obra desse pensador [com
> certeza se preocupava pelo menos com um tipo de salvação: o da "aberração"
> científica]. Mas digamos que ele seja uma exceção. Se todos os grandes
> filósofos, de Sócrates a Popper, tiveram uma preocupação soteriológica, como
> fica então Kuhn diante disso? É simples: se ele não faz o que os filósofos
> fazem, então não é filósofo. Ou o contrário: para quem a filosofia é o que o
> Kuhn, ou Carnap ou seja lá quem for, faz, então todos os grandes filósofos
> não eram... filósofos.
>
> Se me permitem uma indicação, o mesmo Luc Ferry, acima citado, escreveu um
> livro popular em que procura evidenciar a vocação soteriológica da
> filosofia: Aprender a viver. -- Mandar estudar é outra falácia muito
> praticada pelo amigo português.
>
> Eu não tenho a menor dúvida que eu faço filosofia. Mas também tenho certeza
> de que eu não faço a mesma coisa que o Desidério faz.
>
> Abraço,
> edg
>
>
>
>
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