OK, Tony. Mas só mais uma precisão: os portugueses entendem muito bem as
novelas brasileiras *hoje*; não as entendíamos assim tão bem no início,
quando foram introduzidas. Quando a primeira novela portuguesa apareceu em
Portugal, muitas pessoas escreviam para a televisão exigindo que se pusesse
legendas, porque não se percebia grande coisa. Com o tempo, contudo,
habituaram-se. A razão pela qual os brasileiros entendem menos os
portugueses é precisamente porque cá as pessoas comuns não contactam quase
nunca com a maneira portuguesa de falar. No meu caso as coisas são muito
engraçadas: os meus alunos não me percebem muito bem durante as primeiras
semanas, mas depois habituam-se. Contudo, basta que fiquem de férias
algumas semanas e voltam a ter dificuldade em perceber-me.

2012/9/28 Tony Marmo <marmo.t...@gmail.com>

> Desidério, "A ser possível" quer dizer que o conjunto verdade de ~A não é
> membro da vizinhança.
>
> No mais, os meus comentários são com base na minha formação de linguista.
> Compreendo as posições dos editores. Mas, assim como um físico não deixa
> passar sem comentários ideias como "um quilo de algodão pesa menos que um
> quilo de outra coisa", um linguista não pode deixar de comentar essas
> ideias comumente difundidas acerca da variação dialetal, gramática, etc.
>
> Enfim, não é preciso viver em Portugal para entender os portugueses, da
> mesma forma que os portugueses que nunca viveram no Brasil entendem muito
> bem as nossas telenovelas.
>
> Em 28 de setembro de 2012 13:33, Desidério Murcho <
> desiderio.mur...@gmail.com> escreveu:
>
>> Não quero fazer disto uma discussão, até porque esta é uma lista de
>> informações rápidas sobre lógica.
>>
>> Mas parece-me importante fazer alguns esclarecimentos, que a maior parte
>> dos colegas poderá querer apagar sem ler.
>>
>> Primeiro, eu não disse que o meu livro era uma tradução do original de
>> Portugal, mas uma versão brasileira.
>>
>> Segundo, por mim, o livro seria vendido cá exactamente com o mesmo título
>> e sem ter mexido numa só frase. O Tony faria o mesmo. Só que quem arrisca o
>> seu investimento é o editor: é ele que gasta milhares de reais para fazer
>> fisicamente o livro e distribuí-lo, sem fazer a mínima ideia se as pessoas
>> vão comprá-lo em número suficiente para pagar as despesas, quanto mais
>> fazer lucro. Assim, é razoável que um editor se preocupe em eliminar tanto
>> quanto possível o que ele vê como possíveis obstáculos à sua venda. Está
>> enganado? Talvez. Talvez ninguém decidisse não comprar o livro só devido
>> aos "factos" e aos "directos". Por outro lado, talvez várias pessoas não o
>> comprassem precisamente por isso. Ninguém sabe, porque ninguém quer gastar
>> dinheiro para fazer uma pesquisa de opinião sobre o caso. Mas não me parece
>> despropositado que um editor jogue pelo seguro e decida pedir ao autor para
>> fazer uma versão brasileira. Foi o que aconteceu e eu aceitei. O dinheiro é
>> do editor, o risco é dele. O Saramago não aceitava isso, e os seus livros
>> são muito bem recebidos cá no Brasil. Acho isso maravilhoso. Mas eu estou
>> longe de ser popular como o Saramago.
>>
>> Assim, gostaria de chamar a atenção para a irrelevância da seguinte
>> afirmação, ainda que aceitemos que é verdadeira: "Qualquer brasileiro ou
>> timorense letrado pode compreender o português de Portugal". Isto é
>> irrelevante por duas razões.
>>
>> Primeiro, o "pode" só seria vagamente relevante se restringirmos
>> fortemente os mundos possíveis em que estamos pensando -- pois certamente
>> um brasileiro que noutro mundo possível tenha emigrado para Portugal aos
>> seis meses não terá dificuldade com a minha prosa. Mas isto é irrelevante.
>> O que queremos é falar de um brasileiro comum vivendo no Brasil, sem grande
>> contacto com o português de Portugal. E neste caso estamos de facto falando
>> apenas do esforço de ir ao dicionário em vários casos em que eu uso termos
>> que as pessoas comuns no Brasil desconhecem (uma vez um leitor brasileiro
>> criticou muito amavelmente uma tradução minha de "pequeno-almoço" pensando
>> que o texto original era francês e eu estava a cometer um galicismo,
>> desconhecendo por completo que em Portugal "café da manhã" se diz
>> "pequeno-almoço"... e sem se ter dado ao trabalho de ir ao Aurélio).
>>
>> Segundo, a frase, ainda que verdadeira, é irrelevante porque o que
>> preocupa o editor é precisamente a falta de paciência do leitor para
>> comprar um livro popular que o obriga a ir ao dicionário para saber uma
>> coisa tão simples e irrelevante como o significado de "pequeno-almoço".
>>
>> Em conclusão, parece-me que a decisão de um editor em fazer versões
>> brasileiras de livros portugueses, e vice-versa, é legítima, tal como é
>> legítimo não o fazer. E todo o editor preferiria esta segunda opção, até
>> por ser bem mais barata.
>>
>>
>> 2012/9/28 Tony Marmo <marmo.t...@gmail.com>
>>
>>> João Marcos, o óbvio obviamente existe, inclusive para traduções. Se não
>>> existisse, aí que seria impossível traduzir.
>>>
>>> A grande virada da Linguística nos anos 1960 passou crucialmente pelo
>>> reconhecimento da competência inata dos falantes nativos contra essas
>>> doutrinas arcaicas de que ninguém sabe sua própria língua, que ninguém
>>> entende outros dialetos, etc. Mas, ao contrário do que os preconceitos
>>> sem
>>> base científica dizem, qualquer falante nativo de Português, nascido e
>>> criado no Brasil ou em Timor-Leste, uma vez alfabetizado, pode entender
>>> Camões, Machado de Assis ou Agostinho Neto. Não há a menor necessidade de
>>> adaptar autores para os públicos entenderem, muito menos de querer chamar
>>> essas adaptações de traduções. As pessoas têm capacidades cognitivas
>>> mínimas e isso deve ser respeitado e reconhecido.
>>>
>>> Em 28 de setembro de 2012 09:17, Joao Marcos <botoc...@gmail.com>
>>> escreveu:
>>>
>>> > Parabéns ao Desidério pelo lançamento do novo livro!
>>> >
>>> > O título original foi claramente bem traduzido ao português
>>> > brasileiro.  Aliás, como não há nada realmente "óbvio" em matéria de
>>> > traduções entre línguas naturais, para o caso particular das variantes
>>> > lusitana e brasileira da nossa língua construí na minha limitada
>>> > experiência além-mar um pequeno dicionário:
>>> >   http://goo.gl/thDmW
>>> > É fa[c]to que estão lá expressões como "em direto" e "porreiro", em
>>> > particular, bem como o "eléctrico", o "autocarro", o "protão", e o
>>> > bife da "vazia", entre mais de mil outros espécimes linguísticos.  Não
>>> > há, obviamente, nenhuma pretensão de completude, e a última
>>> > a[c]tualização do documento foi feita há sete anos.
>>> >
>>> > Abraços,
>>> > Joao Marcos
>>> >
>>> > PS: a expressão "em tempo real" é amplamente conhecida e usada no
>>> Brasil.
>>> >
>>> >
>>> > 2012/9/27 Desidério Murcho <desiderio.mur...@gmail.com>:
>>> > > Caros amigos da Lógica-L
>>> > >
>>> > > Estão todos convidados a mandar-me axiomas e teoremas para cima da
>>> > cabeça,
>>> > > mas não regras de inferência, no lançamento do meu livro popular,
>>> > *Filosofia
>>> > > ao Vivo*. O livro será lançado pela Oficina Raquel no Rio de
>>> Janeiro, no
>>> > > sábado, dia 6 de Outubro, na Estação das Letras, entre as 11 e as 14
>>> > horas.
>>> > > O livro é a versão brasileira do meu inesperado sucesso português
>>> > *Filosofia
>>> > > em Directo*, que em apenas 104 páginas procura explicar o que é a
>>> > filosofia
>>> > > fazendo-a, em vez de falar sobre ela -- e mesmo assim, encontrei
>>> espaço
>>> > > para explicar a importância da lógica, falando sobre ela, mas sem a
>>> > fazer.
>>> > > Um autêntico feito, que me mereceria palavras elogiosas mais
>>> calorosas,
>>> > não
>>> > > fosse eu o autor, e por isso sei bem que sou uma besta.
>>> > >
>>> > > O convite está aqui: http://dmurcho.com/
>>> > >
>>> > > --
>>> > > Com os melhores cumprimentos,
>>> > > Desidério Murcho
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>>> > > Universidade Federal de Ouro Preto
>>> > > Departamento de Filosofia
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Com os melhores cumprimentos,
Desidério Murcho

Universidade Federal de Ouro Preto
Departamento de Filosofia

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