oi Samuel, muito obrigada! vou printar e ler com cuidado! pois nao tenho o tempo necessario pro curso todo! Valeu mesmo!!! Posso colocar no meu blog uma versao em ingles? abs Valeria
On Wed, Oct 9, 2019 at 10:12 AM 'Samuel Gomes' via LOGICA-L < logica-l@dimap.ufrn.br> wrote: > Olá todos, olá Valeria, > > Bem, dado o chamamento a opinar, vou fazer alguns comentários adicionais > sobre alguns dos posts anteriores, de maneira rápida e curta... Quando eu > quis compilar tudo o que eu gostaria de falar sobre a Hipótese do Contínuo, > em 2015, o que saiu foi um minicurso de três sessões, cada uma com mais de > 60 slides ! Posso enviar o arquivo para quem me pedir off-list (e aceito > convites para ministrar esse minicurso por aí, obviamente...). > > 1) O enunciado original de Cantor para CH é exatamente como Doria citou: > não existe subconjunto da reta de tamanho intermediário entre o tamanho dos > naturais e o tamanho da reta. Se assumimos o Axioma da Escolha (para que > todo cardinal seja um aleph, i.e., para que toda cardinalidade seja > bem-ordenável, digamos), aí temos o enunciado bonitinho do 2^{aleph_0} = > aleph_1. > > Tem coisas muito interessantes sobre esse enunciado original de Cantor, > "não existir tamanho intermediário". Primeiro: ele pode ser demonstrado > usando o Axioma da Determinação ! Lembrar, porém, que o Axioma da > Determinação (o qual declara, informalmente, que jogos cujo alvo sejam > subconjuntos da reta sempre vão ter estratégia vencedora para algum dos > jogadores) é incompatível com o Axioma da Escolha. > > Outra coisa muito interessante: se generalizamos de uma certa forma > natural esse enunciado para qualquer conjunto infinito, chegamos num > enunciado que podemos considerar como sendo a "Hipótese Generalizada do > Contínuo", mas sem referência a alephs (essencialmente: "se X tem injeção > para um certo Y que tem injeção para Partes de X, então Y tem que ser > equipotente ou a X ou a Partes de X, não havendo possibilidades > intermediárias"). Pois bem, esse enunciado generalizado implica o Axioma da > Escolha !!! Isso não é muito divulgado por aí. Fiz um trabalho com um aluno > de iniciação e destrinchamos essa equivalência, tenho os slides do projeto > dele, também posso enviar para quem estiver interessado. > > 2) Outro fato que não é muito divulgado por aí: parafraseando Paulo > Freire, "Cantor não acordou um dia às oito horas da manhã e conjecturou a > Hipótese do Contínuo". > > O que ocorre é que Cantor não conseguiu PRODUZIR, com seus métodos, nenhum > conjunto de tamanho intermediário. Slogan: "para conjuntos que possam ser > razoavelmente descritos, a Hipótese do Contínuo é verdadeira". O nascimento > da Teoria dos Conjuntos pode ser traçado ao Teorema de Cantor-Bendixson, no > qual Cantor enxergou uma recursão transfinita de comprimento maior do que > omega brincando com pontos de acumulação de subconjuntos da reta. Pois bem, > o Teorema de Cantor-Bendixson diz que: fechados não-enumeráveis da reta são > necessariamente equipotentes à reta (diz um pouco mais do que isso, mas por > hoje digamos que seja isso). A construção garante que, dado um fechado > não-enumerável, esse fechado deve conter um subconjunto perfeito - i.e., um > fechado sem pontos isolados. Pois bem, um lindo argumento com árvores > binárias garante que qualquer subconjunto perfeito contém uma cópia do > Conjunto de Cantor, e portanto tem a cardinalidade do contínuo. > > "Conter uma cópia do conjunto de Cantor" é uma propriedade que garante à > uma dada classe de conjuntos um certo carimbo de "regularidade", de "bom > comportamento". > Essa propriedade, conter uma cópia do Conjunto de Cantor, é chamada > "propriedade do conjunto perfeito". Por exemplo, os analíticos (= projeções > de borelianos) possuem essa propriedade (Luzin, 1917). Notar que se uma > certa classe de conjuntos possui a propriedade do conjunto perfeito, então > um contra-exemplo para a Hipótese do Contínuo não vai sair dessa classe !!! > Assim, a Hipótese do Contínuo vale para toda classe de subconjuntos com a > tal propriedade do conjunto perfeito, como são os fechados e os > analíticos...(no sentido de que, para os fechados por exemplo, não existem > tamanhos intermediários) > > Obviamente que "ser Lebesgue mensurável" é um carimbo de bom comportamento > possivelmente ainda maior; porém, existem projetivos (= conjuntos obtidos a > partir de uma quantidade finita de projeções e complementos partindo de um > boreliano) não Lebesgue mensuráveis assumindo-se V = L, o tal Axioma da > Construtibilidade. > > (O Axioma da Determinação prova que todo subconjunto da reta é Lebesgue > mensurável...) > > 3) Não sei exatamente o que Gödel queria provar quando fez a construção do > modelo dos construtíveis; nós teoristas de conjuntos simplesmente pensamos > em V = L como uma prova da *consistência* da Hipótese do Contínuo (e do > Axioma da Escolha, de quebra...). O que eu posso dizer é que Cohen, o tal > que inventou o forcing para mostrar a consistência da negação da Hipótese > do Contínuo, esse sim acreditava e declarou abertamento lá no seu livro > (procurem lá nas últimas duas páginas...) que a cardinalidade do contínuo > deveria estar até acima de aleph_omega, que é o limite dos aleph_n. > > O que Cohen parece pensar - e que eu, quando estou quase acordando de > manhã ou quase dormindo de noite, tendo a pensar do mesmo jeito - é que o > Axioma das Partes é uma espécie de animal selvagem, e exatamente por não > poder ser dominado o continuo (que, como disse o Miraglia, mais > estruturalmente do que ser a cardinalidade da reta é a cardinalidade das > partes de omega !!!) não poderia ser alcançado nem usando o Axioma da > Substituição a partir de omega... Rodrigo Freire tem uma visão muito mais > lúcida do que eu nesse sentido, já conversamos a respeito, hehe. > > 4) A coisa do aleph_2: a maioria das tentativas razoáveis de falsear a > Hipótese do Contínuo acaba levando o contínuo para aleph_2. Para começar, o > Proper Forcing Axiom (que é uma versão mais forte do Axioma de Martin, > sendo que este pode ser encarado como uma espécie de versão generalizada do > Teorema de Baire para cardinais entre aleph_0 e o continuo) manda o > contínuo para aleph_2; isso começa a envolver grandes cardinais, porque a > consistência do Proper Forcing Axiom é usualmente obtida a partir de > cardinais supercompactos. > > (Sem citar nomes: diz a lenda que, nos anos 90, um lógico brasileiro > declarava que, se mudarmos a lógica subjacente da Teoria dos Conjuntos - > não sei exatamente como, essa história eu só ouvi falar mesmo -, então > poderia ser DEMONSTRADO que o contínuo vale aleph_2 !!!) > > 5) Os trabalhos de Woodin nos anos 90 meio que misturam tudo o que eu > falei nos 4 comentários anteriores. Ele escreveu dois surveys no Notices of > American Society sobre esse trabalho, e também tem aquele famoso artigo da > revista Quanta Magazine/Scientific American de +- 2013 ("Dispute over > infinite divides mathematicians"). > > Contando assim em linhas gerais: como disse Miraglia, existe essa idéia de > que deveria haver um "novo" axioma que decidisse a questão do continuum. > Pois bem, o trabalho do Woodin nos anos 90 meio que entende esse axioma > como sendo PD - o Axioma da Determinação Projetiva, o qual declara que os > projetivos são determinados !!! Lembrar que AD, no qual todo subconjunto > seria determinado, é incompatível com o Axioma da Escolha... "Não quero que > todos subconjuntos da reta sejam determinados, mas quero que os projetivos > sejam !!!" > > Não existe uma implicação direta, mas a maquinaria de grandes cardinais e > axiomas de forcing que Woodin construiu para obter a consistência de PD > acaba caindo em versões ainda mais fortes do Axioma de Martin (MM - > Martin's Maximum), e, de modo similar ao Axioma de Forcing Próprio, esses > axiomas de forcing acabam levando o contínuo para aleph_2. > > O que é curioso é que, depois de todo esse trabalho de mais ou menos 25 > anos que apontava para a negação da Hipótese do Contínuo, o que Woodin vem > fazendo nos últimos dez anos vai no caminho oposto: ele está em busca de um > certo "V = Ultimate L", que seria uma espécie de modelo padrão para a > Teoria dos Conjuntos que teria algumas similaridades com V = L, porém seria > compatível com "grandes grandes cardinais", o que não ocorre com V = L; "Se > V = L, não existem mensuráveis" (Dana Scott). Isso de grandes grandes > cardinais não é erro de digitação: os grandes grandes cardinais são aqueles > que são definidos em termos de imersões elementares não-triviais do > universo em modelos internos, e sabe-se que eles são "maiores ou iguais" > (em termos de consistência) aos mensuráveis. Um cardinal mensurável é, > tipicamente, um ponto crítico de uma imersão elementar não-trivial (= o > menor ordinal que é movido pela imersão). > > > .... Resumo da ópera: > > 1) A Hipótese do Contínuo vale para conjuntos que possam ser razoavelmente > descritos; > > 2) A Hipótese Generalizada do Contínuo, que vale no modelo construtível e > portanto é consistente, é mais uma afirmação nesse sentido: se tudo > fosse muito organizado, "construtível", até a Hipótese Generalizada do > Contínuo seria verdadeira; > > 3) Porém, da mesma forma que o Axioma da Escolha faz com que apareçam > monstrinhos que não são mensuráveis - e aqui a organização vai no sentido > contrário, de construir monstros, como no Paradoxo de Banach-Tarski !!! -, > então assumir que existam conjuntos não-construtíveis/não-organizados > possibilita que existam contra-exemplos para a Hipótese do Contínuo; mas > esses contra-exemplos são, em certo sentido, "conjuntos feios"; > > 4) O Axioma da Determinação prova a Hipótese do Contínuo como Cantor a > conjecturou - porém, AD é incompatível como Axioma da Escolha ! Porém, o > Axioma da Determinação Projetiva parece uma opção razoável que decide o > contínuo como sendo aleph_2 porém necessita de grandes cardinais para ter > sua consistência com ZFC demonstrada. > > ... Como em toda boa aula, espero que vocês saiam do meu texto com mais > perguntas do que tinham antes, mas para boa parte delas muito possivelmente > eu não sei a resposta !!!! > > Atés, > > []s Samuel > > > > > > > > > > > > > > > > On Tuesday, October 8, 2019 at 2:24:48 PM UTC-3, Rodrigo Freire wrote: >> >> Artigo horroroso. >> >> >> >> https://blogs.oglobo.globo.com/ciencia-matematica/post/o-que-maquina-pode-aprender.html >> >> >> >> >> -- > Você recebeu essa mensagem porque está inscrito no grupo "LOGICA-L" dos > Grupos do Google. > Para cancelar inscrição nesse grupo e parar de receber e-mails dele, envie > um e-mail para logica-l+unsubscr...@dimap.ufrn.br. > Para ver essa discussão na Web, acesse > https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/cdbbafc0-2f86-4728-b79a-6185ced8384f%40dimap.ufrn.br > <https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/cdbbafc0-2f86-4728-b79a-6185ced8384f%40dimap.ufrn.br?utm_medium=email&utm_source=footer> > . > -- Valeria de Paiva http://vcvpaiva.github.io/ http://www.cs.bham.ac.uk/~vdp/ -- Você está recebendo esta mensagem porque se inscreveu no grupo "LOGICA-L" dos Grupos do Google. 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