Muito obrigado pela contribuição, Luiza. A participação feminina nesse tipo de 
debate é fundamental, sobretudo de alguém que se dedica ao tema, né?Acho que, 
se o tema gerou polêmica, é do interesse do grupo e precisa ser sujeito a 
discussão arrazoada contando com o máximo de opiniões. Obviamente, quanto mais 
qualificada for a opinião (e a sua é muito qualificada), melhor. Enviado do meu 
smartphone Samsung Galaxy.
-------- Mensagem original --------De : Luiza Ramos <luizaspra...@gmail.com> 
Data: 22/10/2019  11:15  (GMT-03:00) Para: Abílio <abilio.rodrig...@gmail.com> 
Cc: Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA 
<logica-l@dimap.ufrn.br> Assunto: Re: [Logica-l] Criticar mal gosto não é 
"conservadorismo " Boa tarde,Acompanhei o debate sem me pronunciar pois de fato 
acho que parecia pouco profícuo levantar a questão nesse ambiente, no entanto 
como muitos homens se pronunciaram aqui sobre a questão da mulher e sobre o 
feminismo acredito que posso contribuir um pouco nesse aspecto. Sobre a 
ressignificação dos termos vagabunda e vadia e sobre a marcha das vadias, 
convém esclarecer que estas são propostas de grupos que se dizem feminista mas 
que estão muito distante das teorias feministas. Como apontado muitas vezes por 
estas, a marcha das vadias representa um tipo de mulher que tem autonomia sobre 
seu corpo e isto não é o caso de grande parte das mulheres que sofrem violência 
sexual e doméstica. Este tipo de pauta pode acabar reforçando a opressão de 
grupos de mulheres não-brancas e não-elitizadas uma que ao pregar  liberdade 
sexual acaba por contribuir ainda mais para a sexualização do corpo feminino. 
Por exemplo, este tipo de discurso raso pode contribuir para jovens meninas se 
submeterem a dominação sexual masculina confundindo-a com liberdade. Ainda, 
tais palavras fazem parte de um vocabulário colonialista e patriarcal que, na 
opinião de feministas sérias como Grada Kilomba, deve sim ser condenado e 
esvaziado de importância. Conservadorismo, nesse caso, me parece perpetuar tal 
vocabulário.Finalmente, esse tipo de questão nada tem a ver com o problema de 
desumanização sofrido pelas mulheres cientistas ao longo do tempo, incluindo 
Marie Curie, que como disse o professor Walter não se interessou em 
qualificar-se como vagabunda em nenhum momento mas sim ocupou-se de contribuir 
para o avanço cientifico e se colocou como modelo para futuras cientistas. Esse 
tipo de contribuição parece muito mais efetivo que qualquer discurso 
panfletário e sensacionalista, assim, entrando no mérito do texto, como 
pesquisadora e feminista que me considero, acredito que o texto é ruim nesta 
perspectiva. O que há ali é uma apropriação da opressão sofrida por Marie Curie 
para uma pauta superficial e rasteira do feminismo suave do nosso tempo. Tal 
feminismo suave nada contribui para as discussões relevantes que precisam ser 
tratadas e reforçam o tipo de discurso raso ( a palavra machista aparece quatro 
vezes no texto) que vemos hoje explorado pela grande mídia e marcas, quando 
encontramos camisetas de marcas que exploram trabalho escravo utilizando esses 
chavões. O texto não funciona como divulgação científica pois não aborda nada 
efetivo do trabalho de Marie e também não funciona combatendo opressões, pois 
está no lugar comum da vitimização e redução do discurso à uma ideologia 
particular. Conheci pessoalmente a autora quando veio à Brasília dar uma 
palestra sobre Mulheres na Ciência e já na época fiquei decepcionada com a 
superficialidade da palestra e da falta de interesse da mesma em conversar com 
as estudantes ali presente. Muitas mulheres tem contribuido para a inclusão de 
outras mulheres no meio científico mas o fazem com mudanças locais e ações ao 
invés de discursos. Atenciosamente,Luiza RamosEm seg, 21 de out de 2019 às 
15:23, Abílio <abilio.rodrig...@gmail.com> escreveu:Colegas,

Estou chegando atrasado na conversa.
Entendo que o titulo possa ser desconfortavel para algumas pessoas.
Pra mim nao é nem um pouco.

Mas o txt é otimo e muitissimo oportuno nos tempos da burrice e
cretinice que grassam no nosso pobre pais.
Sim, hoje, no Brasil, vagabunda - assim como viado, esquerdopata,
comunista etc. - tornaram-se elogios.

Abraços

Abilio

On Sun, 20 Oct 2019 at 23:50, Joao Marcos <botoc...@gmail.com> wrote:
>
> Poderíamos talvez defender que o estudo da argumentação, e de certa
> forma também a interpretação de textos, caem sob os tópicos de
> interesse desta lista.
>
>
> [[
> Dou por aceito que não precisamos defender Marie Curie.  Albert
> Einstein disse o que havia a dizer, em uma carta que enviou a ela em
> 23 de novembro de 1911, logo depois de Curie retornar da Suécia com
> seu segundo prêmio Nobel para encontrar seu nome denegrido pela
> imprensa e sua casa apedrejada pela furiosa turba de conservadores de
> extrema-direita:
>
> "If the rabble continues to occupy itself with you, then simply don’t
> read that hogwash, but rather leave it to the reptile for whom it has
> been fabricated."
> https://einsteinpapers.press.princeton.edu/vol8-trans/34
> ]]
>
>
> O que eu observei até agora, no debate nesta lista sobre o texto da
> física Marcia Barbosa, foi:
>
> (1) A menção a um texto de uma cientista relatando um bem conhecido
> caso de misoginia na ciência.  O texto foi desqualificado antes mesmo
> de ser lido devido ao uso do termo "vagabunda" no título.
> Aparentemente o objetivo principal daquela menção foi o emprestar
> força adicional à desqualificação de outro texto ---absolutamente
> desastroso--- publicado no mesmo blog, escrito por outro autor, sobre
> um tema completamente diverso.
>
> (2) O texto já citado, que diz respeito ao empoderamento feminino, foi
> acusado, das formas mais variadas, de "MAU gosto".  Um dos motivos
> principais, mais uma vez, parece ter sido o uso ---essencial--- da
> palavra "vagabunda".  Os outros motivos apontados são um pouco mais
> difusos, e mais ou menos "criativos".
>
> (3) Supostamente haveria no dito texto uma proposta de ressignificação
> semântica pela qual "vagabunda" passaria a ser um elogio.
>
> Não tenho o que dizer sobre o ponto (1), e já disse o que tinha para
> dizer sobre o ponto (2).  Eu próprio não teria hesitado em escrever um
> texto com esta palavra no título, fosse ela essencial ao conteúdo.
> Quanto ao ponto (3), se houvesse uma real tentativa de
> *ressignificação* das expressões "vagabundas" e "vadias", como
> aconteceu por exemplo com os termos "gay" e "queer", então seria de se
> supor que as mulheres hoje _desejassem_ ser tratadas por "vagabundas"
> ou "vadias".  Não me parece que seja o caso ---ou pelo menos não
> ainda, pois a linguagem tem sua dinâmica.  Resta-me, assim, a opção da
> *ironia* (ou, no mínimo, da estratégia de chamar a atenção pela via da
> *polêmica*), que afinal me parece ter sido bem praticada pela autora
> do texto.
>
>
> [[
> Sobre a apropriação por parte das mulheres dos termos opressores _para
> tentar revalorizá-los_ (como no mote "se ser livre é ser vadia, então
> somos todas vadias") encontrei um texto recente interessante, escrito
> da perspectiva da Análise Dialógica do Discurso [Bakhtin]:
> http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2019000200209
> Como disse um colega, portanto, pode haver, também neste ponto,
> "espaço interessante para reflexão".
> ]]
>
>
> Ainda sobre as mensagens anteriores dos colegas:
>
> > Talvez ela não saiba das histórias  das"jovens polacas". Se sabe, é  pior 
> > ainda.
> > É  de todo modo uma referência infeliz, que me faz não gostar da notinha.
>
> As "jovens polacas" jamais foram referidas no texto.  Parece de todo
> modo irrelevante saber se a autora do texto conhece a expressão, ou
> mesmo se Marie Curie teria sido assim chamada no Brasil, como sem
> dúvida teriam feito naquela época os tabloides franceses.
>
>
> [[
> Um dos _menos_ virulentos ataques a Marie Curie foi publicado no Le
> Figaro (o jornal diário mais antigo da França), em 26 de novembro de
> 1910:
> "Nous avons déjà plus de femmes de lettres qu’un pays civilisé ne peut
> supporter. Que les dieux favorables nous épargnent une génération de
> femmes de science!"
> https://polonia.histegeo.org/Curie_Academie.swf (p.7)
>
> A propósito, esta é a realidade que aponta modernamente o mesmo jornal
> (conservador e de direita):
> http://madame.lefigaro.fr/societe/les-europeens-estiment-que-la-science-a-haut-niveau-nest-pas-faite-pour-les-femmes-160915
> (curiosamente, enquanto o artigo de 1910 deplora a possibilidade de
> prêmios científicos concedidos por "júris femininos", o artigo de 2015
> diz respeito a uma sondagem promovida pela fundação L'Oréal, que hoje
> patrocina tais prêmios)
> ]]
>
>
> > não tem essa de politicamente ressignificar o preconceito que fez uma 
> > vítima ilustre
>
> O _preconceito_ certamente não foi ressignificado pela autora do
> texto.  Quando muito poderíamos dizer que a palavra que expressa esse
> preconceito foi usada como uma provocação.  E, claramente, a
> provocação funcionou.
>
> Abraçxs,
> Joao Marcos
>
>
> [[
> Como disse o filósofo da linguagem Humpty Dumpty, citado também no
> artigo feminista cujo link se encontra acima, e grande influência de
> Ludwig Wittgenstein:
>
> 'When I use a word,' Humpty Dumpty said in rather a scornful tone, 'it
> means just what I choose it to mean — neither more nor less.'
> 'The question is,' said Alice, 'whether you can make words mean so
> many different things.' '
> The question is,' said Humpty Dumpty, 'which is to be master — that's all.'
> ]]
>
>
> PS: Walter, tendo em vista que você era amigo pessoal da Hilda Hilst,
> surpreende-me sobremaneira que você agora assuma esta postura
> "linguística" conservadora...
>
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