Só pra dizer mais umas coisas legais :

O Elon tem no livro dele (não sei mais se é o Análise Real ou o Curso
de Análise, volume 1, claro) a mesma idéia pra definir senos e
cossenos. Pra quem gosta de cálculo diferencial, esse é um prato cheio
pra lembrar como fazer algumas contas, e, melhor ainda, ver que
realmente seno e cosseno estão bem-definidas e tal:

1) seja f'' + f = 0 uma função tal que f(0) = 0, f'(0) = 1 (qualquer
semelhança com o seno é pura coincidência)
2) Chame (sei lá por quê...) g = f', e note que g'' = f''' = (-f)' =
-f' = -g, logo g'' + g = 0 também, que legal, e g' = f'' = -f
3) Note que g^2 + f^2 = 1 : derivando, dá 2gg' + 2ff' = -2gf + 2fg =
0, logo é constante, logo g^2 + f^2 = g(0)^2 + f(0)^2 = 1 + 0 = 1
4) Como g(0) = 1 > 1/2, e f' = g, temos que f é monótona crescente num
intervalo em torno de zero. Como g^2 = 1 - f^2, g é monótona
decrescente.
5) Existe um ponto x > 0 em que g(x) = 0 : senão, g seria sempre maior
do que zero (pois g(0) = 1 > 0, teorema do valor intermediário), logo
f seria sempre crescente. Olhando de novo para f' = g, temos que num
intervalinho em torno do zero, f' > 1/2, logo f > 1/2 * comprimento do
intervalinho. Como g' = -f, além desse intervalinho (digamos [0,a], g
está ABAIXO de uma reta de inclinação -f(a) < -a/2. Logo g *tem que*
cruzar zero.
6) Chame esse ponto mágico de primeira anulação de g de A (como anulação !)
Note que g'(A) = 1 ou -1 (porque g' = -f, f(A)^2 = 1 - g(A)^2 !) e
como g é positiva entre 0 e A, temos f crescente, logo f positiva,
logo f(A) = 1, logo g'(A) = -1
7) Use isso para ver que -g'(x+A) é uma solução também da equação, com
mesmas condições e o mais. Repetindo duas vezes, você descobrirá que
f(x+4A) = f(x) (atenção pros sinais)
8) Prove agora as fórmulas mágicas de soma e subtração de senos e
cossenos que você conhece usando derivada, por exemplo : f''(a+x) =
-f(a+x) é solução da equação diferencial, e (f(a)g(x) + f(x)g(a))'' =
f(a)g''(x) + f''(x)g(a) = f(a)(-g(x)) + (-f(x))g(a) = -(f(a)g(x) +
f(x)g(a)) também é solução, e note que f(a+0) = f(a) e f(a)g(0) +
f(0)g(a) = f(a)*1 +0*g(a) = f(a) e a primeira derivada também
coincide, logo as funções são iguais.
9) Essas funções estão definidas em toda a reta real, f(-x) = -f(x), e
se a gente chamar A = pi/2, temos uma nova definição de pi.

Uma idéia ainda mais ousada é definir seno e cosseno pela série deles
seno(x) = soma (-1)^n x^(2n+1) / (2n +1)!, convergente em toda a reta
(e normalmente em cada intervalo finito) pelo critério de d'Alembert.
Isso dá imediatamente a equação diferencial (pra provar que ela se
anula e o resto) e a série de Taylor, as derivadas, os limites
sin(x)/x pra x->0 etc.

Outra coisa : o Liouville provou um teorema descrevendo um algoritmo
de integração que decide se uma função é integrável ou não em "termos
simples" (com uma definição do que sejam "termos simples", claro). Ela
usa uns conceitos de Álgebra pra funcionar, e é bem interessante do
ponto de vista moderno : considerar todas as funções de uma vez só é
permite provar o teorema, enquanto uma análise caso a caso não. Um
link (não achei um pdf com a demo, mas deve dar pra encontrar) :
http://www.sosmath.com/calculus/integration/fant/fant.html

2009/3/24 Ralph Teixeira <ralp...@gmail.com>:
> Oi, Bouskela. Você tem uma certa razão... Mas, sinceramente, o que
> diabos é e^x? Mais espcificamente, o que é e^pi, por exemplo? Dá para
> definir por limites usando números racionais, mas dá um certo
> trabalhinho...
>
> Então tem um pessoal que prefere DEFINIR o logaritmo pela integral, e
> DEFINIR a função e^x como sendo a inversa do ln (assim, este tal de
> "e" por definição seria o número cujo ln é 1!). Neste novo "universo",
> as coisas se encaixam elegantemente (e, de bônus, responde-se a
> pergunta do meu parágrafo anterior). Mais detalhadamente, a ordem
> lógica desse pessoal é:
>
> *Alerta! Texto DENSO a seguir! Nada difícil, mas está denso!*
>
> 0. Não sabemos o que é ln, nunca ouvimos falar de "e", não temos a
> mínima idéia do que seja a^x quando x não é racional.
> 1. Para x em (0,+Inf), definimos ln(x)=Int(1 a x) 1/t dt. Assim,
> d(lnx)/dx=1/x e ln1=0.
> 2. Conclua que ln(x) é crescente (pois a derivada é +).
> (2a. Em particular, note que ln2>ln1=0.)
> 3. Mostre que ln(x^r)=r.ln(x) (pelo menos para r racional)
> -- Um jeito é: tome h(x)=ln(x^r)-rln(x); derivando, usando a Regra da
> Cadeia e (1), vem h'(x)=0. Então h(x)=h(1)=0.
> 4. Usando 2a e 3, temos que ln(2^r)=r.ln2 pode ser tão grande quanto
> quisermos se r for grande, e tão negativo quanto quisermos se r for
> bem negativo. Assim, a imagem desta misteriosa ln(x) é o intervalo
> (-Inf, +Inf).
> 5. Por (2), lnx é monótona, então invertível; vamos chamar sua inversa
> de exp(x):(-Inf, +Inf) -> (0,+Inf) (estes intervalos vêm de (4) e
> (1)).
> 6. Mostre que exp(rx)=exp(x)^r (pelo menos para r racional)
> -- Um jeito: use que exp(rx)=exp(rln(exp(x)))=exp(ln(exp(x)^r))=exp(x)^r.
> 7. DEFINIÇÃO: e=exp(1). Assim, exp(x)=exp(x.1)=exp(1)^x=e^x (pelo
> menos para x racional)
> 8. Agora é o contrário: a gente vai MOSTRAR que e=lim ln(1+1/x)^x
> quando x vai para Inf. Como? Use L´Hôpital nesta indeterminação do
> tipo "1^(+Inf)".
> 9. DEFINIÇÃO: x^y=exp(y.lnx) sempre que x>0, para qualquer y,
> inclusive y irracional.
>
> Parece que dá MUITO mais trabalho (poxa, são uns 10 teoreminhas
> encadeados)... Mas, no processo, a gente prova elegantemente todas as
> propriedades dos logaritmos e das exponenciais (bom, tem algumas que
> eu não pus aqui, mas que saem de maneira similar).
>
> Quando a gente dá Cálculo 1 *para a matemática* aqui na UFF, a gente
> reserva uma aula de 2 horas para falar disso. Eu começo a aula fazendo
> o passo 0. Aí eu pergunto: quanto é ln(a.b)? Quanto é ln(10^6)? Quanto
> vale e? Respostas corretas (antes do passo 1): não tenho ideia, nunca
> vi mais gordoooooo, "é", que "é"? :) :) :)
>
> Abraço a todos,
>                Ralph
>


-- 
Bernardo Freitas Paulo da Costa

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Instruções para entrar na lista, sair da lista e usar a lista em
http://www.mat.puc-rio.br/~obmlistas/obm-l.html
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