Prezada Ana Lúcia Carvalho,
Toda contestação junto ao TSE, sobre a tecnologia usada nas eleições, foi indeferida baseada em mentiras, falácias, ou simplesmente ignorada. Apenas dois exemplos: 1) Numa das eleições passadas, um dos partidos concorrentes entrou com requerimento junto ao TSE, alegando que não havia sido permitido aos partidos fiscalizarem os programas constantes das urnas. O pedido foi feito com mais de um mês de antecedência em relação ao dia da eleição. O requerimento não foi julgado, e foi arquivado no ano seguinte, após as eleições, por 'perda de objeto'. 2) O projeto de lei apresentado ao congresso, foi deturpado por pressão do ministro do TSE que, à época declarou perante o congresso que, como compensação às alterações, os partidos teriam direito de fiscalizar TODOS os programas das urnas. Na fiscalização ocorrida recentemente, os partidos não tiveram acesso ao fonte dos dois sistemas operacionais utilizados nas urnas (um conjunto de urnas utiliza o VirtuOS, e outro conjunto utiliza uma versão do Windows). Um funcionário da Microbase, empresa fornecedora do sistema operacional VirtuOS, esteve durante toda o período da fiscalização oferecendo aos partidos o código fonte, desde que cada partido interessado pagasse R$ 250.000,00 por ele. A democracia nesse país tem preço, nas dependências do TSE. A conclusão desse episódio é que o ministro do TSE mentiu quando afirmou que os partidos teriam acesso a TODOS os programas da urna. Quanto ao papel da imprensa em mostrar as novidades, creio que faz parte desse papel também mostrar o contraditório, vale dizer: os prós e os contras, deixando ao leitor a tarefa de decidir se uma tecnologia é bem vinda ou não. Mostrar apenas um lado da questão é induzi-lo a uma conclusão. Como citei em minha mensagem, o atual secretário de informática do TSE elenca apenas empecilhos técnicos e de nível educacional. Embora ainda sejam entraves, pode-se perfeitamente vislumbrar a solução destes em algum momento futuro. Mas, propositadamente (?), deixa-se de citar a questão do sigilo, pois não se vislumbra solução para isso. O que não se pode é aplicar a tecnologia, sabendo que há uma implicação inconstitucional, para depois pensar em como resolver, como fazem atualmente com a urna eletrônica. Diversas tecnologias foram apresentadas à sociedade e nem todas são aceitas. Para não ficar apenas na questão de tecnologias de informática e telecomunicações, basta lembrar, por exemplo, do CFC. Aceitar qualquer tecnologia como inexorável é ignorar que as tecnologias só são benéficas a uma sociedade, se servem aos interesses dessa sociedade. A questão é: Qual é o interesse da nossa sociedade? Será a comodidade? Será a rapidez na apuração das eleições? Ou será a garantia do processo democrático? Confesso que esse será o primeiro número que não levarei para casa, para compartilhar com amigos da área. Ficaria constrangida em dar a impressão que trabalho numa empresa que idolatra a tecnologia sem se responsabilizar com as conseqüências de sua aplicação. O pioneirismo do Serpro sempre foi de encontro às necessidades da sociedade. É essa a imagem que pretendo manter junto às pessoas que conheço. Atenciosamente, Eneida Melo Ana-Lucia Carvalho Para: Eneida Melo/SERPRO@SERPRO 03/09/2002 16:26 cc: Assunto: Re: Surpreendente(Document link: Eneida Melo) Ana Lucia Almeida Fernandes De Carvalho - COEMP/GABDP Prezada Eneida, Sua preocupação e ponderações são absolutamente pertinentes. Mas ninguém consegue barrar o avanço tecnológico. O voto via internet poderá facilitar a vida de muita gente que não pode sair de casa para votar, como os doentes ou idosos. Para evitar o mau uso desta tecnologia será preciso criar mecanismos que assegurem a liberdade de escolha e o voto livre. É um desafio a mais para a democracia. Ou então, contestar tal tecnologia junto à Justiça Eleitoral. O nosso papel como imprensa é mostrar as novidades aos leitores. Atenciosamente, Ana Lúcia Carvalho Editora-executiva da Revista Tema do Serpro Eneida Melo Para: [EMAIL PROTECTED] 03/09/2002 15:59 cc: Assunto: Surpreendente Eneida Gomes de Sousa Melo - CECAT/CEDES/SUNCE Prezada Editora, Costumo sempre ler os exemplares da revista TEMA, interessando-me sobremaneira pelas matérias sobre governo eletrônico, particularmente sobre os sítios que dão maior transparência aos atos públicos. Independentemente de serem assinadas ou de serem de responsabilidade da revista, são sempre matérias bem embasadas e, invariavelmente, coerentes. Por esse motivo, surpreendeu-me a publicação, no Nº 162 desta revista, do artigo Voto na Web, baseado em entrevista com o atual secretário de informática do TSE, cujo nome, após tamanho descalabro, recuso-me a pronunciar. Demonstrando total desconhecimento dos aspectos envolvidos num processo eleitoral, e de sua importância numa democracia, o autor inicia o artigo tentando deixar o leitor embevecido com o 'pioneirismo' do país, como se estivéssemos mais interessados em marcar pontos na "história eleitoral mundial", mesmo que para isso a democracia tenha que ser sacrificada. Logo no primeiro parágrafo afirma ser possível que os eleitores possam exercer sua cidadania votando sem sair de casa. Cita processos de criptografia e certificação digital, como se esses pudessem garantir a fidelidade da vontade do eleitor. Elenca como empecilhos as dificuldades com telefonia e energia elétrica, bem como o analfabetismo digital e a baixa escolaridade. "Tudo isso deve ser considerado" - pondera o secretário. Pondera? É ponderada uma pessoa que, deliberadamente?, se abstém de citar o aspecto do sigilo do voto? Será tão difícil para esse indivíduo inferir que a garantia do sigilo do voto desaparecerá? Será tão difícil deduzir o quão fácil se tornará a compra de votos? E do quão seguro será, para o 'comprador de votos', verificar se o voto dado foi o desejado, estando ao lado do eleitor na hora do voto, para só então pagar por ele, seja de que forma for? As novas tecnologias que integram informática e telecomunicações têm muito a auxiliar à democracia, contanto que os ocupantes de cargos com poder de decisão ajam de forma responsável. Infelizmente o que se vê é tentativas de auto-promoção, aliadas ao fascínio que a tecnologia provoca em muitos, impedindo-os de enxergar os problemas reais. A lenda de Narciso cabe melhor nesse caso do que na Gestão de Conhecimentos. A de Ícaro também. Atenciosamente, Eneida Melo ______________________________________________________________ O texto acima e' de inteira e exclusiva responsabilidade de seu autor, conforme identificado no campo "remetente", e nao representa necessariamente o ponto de vista do Forum do Voto-E O Forum do Voto-E visa debater a confibilidade dos sistemas eleitorais informatizados, em especial o brasileiro, e dos sistemas de assinatura digital e infraestrutura de chaves publicas. __________________________________________________ Pagina, Jornal e Forum do Voto Eletronico http://www.votoseguro.org __________________________________________________