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Sent: Saturday, November 20, 2004 6:07
PM
Subject: [VotoEletronico] Fw: [GHENTE-L]
Fw: <constrgn> Agradecimento ao Apoio Popular - Carlos Lessa
Olá,
É assunto fora da pauta, mas interessa a todo brasileiro
nacionalista.
Maximus Santiago
Niterói
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Sent: Saturday, November 20, 2004 5:24 PM
Subject: [GHENTE-L] Fw: <constrgn> Agradecimento ao Apoio
Popular - Carlos Lessa
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From:
Sent: Saturday, November 20, 2004 5:15 PM
Subject: <constrgn> Agradecimento ao Apoio Popular - Carlos
Lessa
Agradecimento ao Apoio
Popular
Estou muito comovido pelo apoio diversificado que venho recebendo.
Organizações populares, partidos políticos, velhos amigos, intelectuais que
respeito, artistas brasileiros que admiro. Apoio de pessoas que não conheço
pessoalmente, em todos cantos deste imenso país.
Tenho que esclarecer as
razões pelas quais deixei a reitoria da minha universidade, a Universidade
Federal do Rio de Janeiro, tendo sido eleito por 85% dos votos dos meus
companheiros, para ser presidente do BNDES. Eu sou e me sinto muito bem como
professor, retorno na próxima semana para as minhas funções como professor.
Jamais aspirei ser banqueiro. Porém aceitei a missão, convocado pelo
presidente Lula.
Aceitei porque, em primeiro lugar, o convite vinha de
Lula, que para mim é um símbolo vigoroso da criatividade, da resistência e da
mobilidade social do povo brasileiro. Fiquei emocionado ao ouvir Lula dizer,
ao ser diplomado presidente da República, que aquele havia sido o primeiro
diploma de sua vida e explicar que não tem certeza da data do seu nascimento,
o que exemplifica como a pobreza retira direitos fundamentais do povo
brasileiro.
Aceitei a convocação porque o presidente me deu apoio para
compor uma diretoria integrada por profissionais do BNDES e do Banco Central,
todos bons professores. Aceitei a convocação do presidente para uma função
estratégica, que ele assim anunciou: dirigir o Banco dos sonhos dos
brasileiros.
Interpretei o convite para ser parceiro de um projeto de
desenvolvimento nacional com inclusão social. Cooperar com esse sonho me levou
a ser um homem da situação, o que mudava minha trajetória de vida, na qual
estive sempre na oposição ao sistema que oprime o povo brasileiro. Antes,
estive na situação apenas em um breve período no governo de João Goulart, o
que mais tarde deu origem ao meu exílio. No outro único momento em que estive
na situação foi quando aceitei o convite de Ulysses Guimarães para ser diretor
do Fim Social.
Ao longo da minha vida sedimentei uma convicção importante.
Considero a soberania e a robustez da nação pré-condição fundamental para a
solução do problema social. Para mim isto impõe o primado dos interesses
nacionais sobre os demais interesses.
Sou da geração que viu a Segunda
Guerra Mundial. Vi a bomba. Vi milhões de pessoas serem exterminadas por
razões religiosas, geopolíticas, razões estúpidas diante do valor da vida
humana. Sonhei com a Carta dos Direitos Fundamentais da Pessoa Humana,
proclamada pela ONU. Acreditei que, se a humanidade afastasse o fantasma da
guerra, seria possível dar a todos os habitantes do planeta condições básicas
de uma vida digna:educação, saúde, habitação e lazer.
Sou de uma antiga
família da elite brasileira carioca. Convivi na minha juventude com amigos das
favelas do meu bairro. Jogavam futebol muito melhor do que eu e sabiam muito
mais de como lidar com as moças. Eu sabia que não tinham muito dinheiro, mas
não percebia a distância social que nos separava.
Vim percebê-la fora do
Rio de Janeiro, quando jovem fui trabalhar para Miguel Arraes no Plano diretor
de Recife. Conheci as favelas do Pina e de Boa Viagem. Foi para mim um choque
brutal. Como era possível que outros, a elite brasileira, concordassem com as
condições trágicas de vida daquelas pessoas? A partir desse momento, recortei
em minha cabeça dois grupos: as elites insensíveis e o povo sacrificado e
abandonado deste país.
De conservador virei um revoltado. E me perguntei: o
que fazer para, usando a linguagem do saudoso Teotônio Vilela, resgatar a
dívida social? A formação de economista me deu pistas teóricas e informações
práticas que me fizeram acreditar ser possível um sonho, o desenvolvimento
nacional com inclusão social. Em resumo, uma civilização
brasileira.
Percebi elites de vários formatos,
identifiquei as contra-elites e fiquei cada vez mais fascinado pelo povão
brasileiro. Uma pergunta sempre me perseguiu. Como conseguiram sobreviver com
tão pouco e com elites tão descomprometidas com o sonho civilizatório?
Aos
poucos fui conhecendo em profundidade o povo brasileiro. Um povo extremamente
criativo em arte de sobrevivência. Percebi com clareza como este povo criou a
favela, organizou o lugar, resolveu o problema de urbanismo e de arquitetura,
criou códigos de conduta e desenvolveu uma solidariedade básica: a comunidade,
inventada pelo povo para sobreviver.
Descobri um povo maravilhoso no campo.
O caipira que constrói a riqueza nacional a partir da fertilidade da terra,
vivendo em pequenas propriedades, em condições ultraprecárias. Percebi a
imensa contribuição dessa gente para ocupação real do território
brasileiro.
Olhei de perto os imigrantes europeus, asiáticos e do Oriente
Médio. Vi seus filhos fazerem avançar a cidadania e contribuírem de mil formas
para o caldeirão brasileiro. O caldeirão do povo brasileiro. Vi o imigrante
português dando sempre uma contribuição decisiva. Vi os afro-brasileiros,
descendentes de escravos para os quais a elite brasileira nada fez. Vi os
caboclos amazônicos criando uma forma adaptativa única e garantindo para a
Nação a ocupação de um imenso pedaço deste país.
Em resumo, vi um povo
resistente, criativo e, para a minha maior surpresa, espantosamente alegre.
Tenho pelo povo brasileiro a confiança de que nele está a possibilidade de uma
contribuição original para a civilização mundial, porque:
1- Não somos
arrogantes. Deixamos o recém-chegado ao país à vontade para empreender, para
conhecer nossos defeitos e nossas qualidades.
2- Assimilamos qualquer coisa
que venha de fora e a impregnamos de brasilidade.
3- Sabemos dar
importância à cooperação, pois o povo aprendeu que não pode sobreviver sem a
solidariedade.
4- Praticamente não temos preconceitos raciais, religiosos
etc.
5- Gostamos de tudo o que é misturado. Música, comida a quilo,
feijoada com sushi, X-tudo...
Em contraponto, tornei-me um historiador
econômico para conhecer melhor o papel da elite nacional que:
1- Fez a
independência, mas manteve a escravidão.
2- Que depois aboliu a escravidão
da maneira mais canalha possível, sem reforma agrária, sem escola pública, sem
direitos trabalhistas.
3- Que criou uma República que na prática manteve as
oligarquias no comando e o povo sob controle.
4- Que criou o clientelismo,
transformando o que deveria ser direito em favor.
5- Que sempre procurou
afastar qualquer contra-elite e, quando alguma teve sucesso, foi capaz de
levar ao suicídio o presidente Getúlio Vargas.
6- Que adotou,
entusiasticamente e operacionalmente, o rótulo comunista para ser aplicado a
quem quisesse contrariar.
7- Que deu suporte ao regime autoritário enquanto
este lhe serviu.
8- Que passou a ser democrática por conveniência.
9-
Que tenta fazer que o povo ache o político um ser essencialmente corrupto,
inútil e astuto.
10- Que, sob o rótulo autoritário ou democrata, usa o
Estado de forma desbragada e despudorada a favor de seus
interesses.
Conheço nossas contra-elites. Tenho o maior respeito pelas suas
intenções e pelos seus esforços, porém suspeito que não percebem coisas
básicas do povo brasileiro. Esse povo é heterogêneo, não é classificável pelo
corte clássico burguês/proletário, ou pela categoria terrivelmente abstrata e
a-histórica, de trabalhador. Não percebem que o povo está criando por
movimentos, por novas formas, por novas regras, uma sociedade que poderá vir a
ser realmente inclusiva.
A nossa contra-elite não gosta muito de aprender
com o povo. Se gostasse, respeitaria a mãe crecheira, a nova confissão
religiosa, a relação com a birosca, o sistema do aprendiz etc. Sou
neopopulista. Amo o povo brasileiro e acho que a história fez dele um ente
amoroso, capaz de criar uma civilização afetuosa e alegre. Não há nada mais
civilizado que ver o povo criar uma festa de passagem de ano na orla de
Copacabana, com quase dois milhões de pessoas festejando em completa harmonia
e, insistentemente, acreditando num futuro melhor. Não há nada mais civilizado
do que ver o povo que celebra festas como a de Parintins ou a de Barretos,
verdadeiros rituais que renovam a crença de que este pode ser um país melhor
para os brasileiros.
Sou neonacionalista. Não há solidariedade
internacional. A regra do mundo é quem pariu Matheus que o embale. Por isso
precisamos ter sob controle e em produção nacional vacinas, remédios,
sementes, estoques de alimento, equipamentos para que as Forças Armadas possam
realmente garantir que a Amazônia continue sendo de nossos filhos e
netos.
Nossas elites querem desfrutar do padrão de vida de Nova York ou de
Miami e ter mão-de-obra doméstica ultrabarata. Querem colocar no exterior uma
boa parte da riqueza que aqui construíram. Querem continuar a ganhar o máximo
possível aqui e ter sempre aberta a possibilidade de se converterem em seres
internacionais, sem nenhuma responsabilidade pelo que acontece no Brasil. Ao
nosso povo, corresponde o desafio de preservar a nacionalidade. E este povo
está construindo a Nação Brasileira, consolidando a nossa oportunidade de
firmar uma alternativa de civilização.
Carlos
Lessa.