Caro Cassiano:
No que me concerne, a autoridade ultima sobre estes assuntos eh o Doria...
Quantoa tua ultima observacao,  creio que vivemos, percebemos e sentimos
a vida pelo corpo, de modo que nossa invariavelmente  metaforica linguuagem
sempre tem que, em ultima instancia, ao corpo retornar;
Revogadas todas as Apolinieas disposicoes em contrario.
Abraco e Tudo de bom, ---Julio


________________________________
From: Cassiano Terra Rodrigues <cassiano.te...@gmail.com>
Sent: Wednesday, December 7, 2022 12:45 PM
To: Julio Stern <jmst...@hotmail.com>
Cc: Diego Almeida <adiego.u...@gmail.com>; Daniel Durante 
<durant...@gmail.com>; LOGICA-L <logica-l@dimap.ufrn.br>; Ricardo Pereira 
<rha...@gmail.com>; Marcelo Finger <marcelo.fin...@gmail.com>; eduardoochs 
<eduardoo...@gmail.com>
Subject: Re: [Logica-l] Meio off-topic: Construção do Reino de Deus na UFRN

Caro Júlio, escrevo rápido agora, apenas para te responder.
Eu não tenho nenhuma etimologia melhor q a tua para oferecer a não ser lembrar 
do Francisco Achcar falar isso, scientia tem a ver com o conhecer com o corpo, 
com as mãos, o segurar firme q está na raiz do verbo. Mas agora buscando 
rapidamente aqui na internet, há quem ligue scire a scindere, cindir, clivar, 
separar em 2 (teria a ver com o grego σκήπτω? é uma pergunta mesmo e não é 
retórica), e ainda até mesmo a secare, pela via do hebraico carath, que também 
quer dizer cortar. Secare é a raiz latina de sexo, o q dá uma pouco explorada 
ligação da ciência com o entendimento da vida e do corpo.
Como meu latim é parco, cedo à autoridade do Francisco e também à tua, scio é 
1a p do sing do inf scire.
Abraços,
cass.

Cassiano Terra Rodrigues
Prof. Dr. de Filosofia - IEF-H-ITA

Rua Tenente Brigadeiro do ar Paulo Victor da Silva, F0-206
Campus do DCTA
São José dos Campos
São Paulo, Brasil
CEP: 12228-463
Tel. (+55) 12 3305 8438


--
lealdade, humildade, procedimento


On Wed, Dec 7, 2022 at 1:19 AM Julio Stern 
<jmst...@hotmail.com<mailto:jmst...@hotmail.com>> wrote:
Caro Cassiano:
>>> scientia em latim vem do verbo scio - segurar, pegar firme -
Por favor, esclareca-me   a fonte desta derivacao etymologica,
pois sempre alardeei por ai a derivacao
>>>   scīre, saber  <   *skei-  cortar, separar
onde * indica uma raiz reconstituida do proto-indo-europeu.
Acho a diferenca importante e interessante.
Abraco,  ---Julio Stern







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From: logica-l@dimap.ufrn.br<mailto:logica-l@dimap.ufrn.br> 
<logica-l@dimap.ufrn.br<mailto:logica-l@dimap.ufrn.br>> on behalf of Cassiano 
Terra Rodrigues <cassiano.te...@gmail.com<mailto:cassiano.te...@gmail.com>>
Sent: Monday, December 5, 2022 10:44 AM
To: Diego Almeida <adiego.u...@gmail.com<mailto:adiego.u...@gmail.com>>
Cc: Daniel Durante <durant...@gmail.com<mailto:durant...@gmail.com>>; LOGICA-L 
<logica-l@dimap.ufrn.br<mailto:logica-l@dimap.ufrn.br>>; Ricardo Pereira 
<rha...@gmail.com<mailto:rha...@gmail.com>>; Marcelo Finger 
<marcelo.fin...@gmail.com<mailto:marcelo.fin...@gmail.com>>; eduardoochs 
<eduardoo...@gmail.com<mailto:eduardoo...@gmail.com>>
Subject: Re: [Logica-l] Meio off-topic: Construção do Reino de Deus na UFRN

Daniel, Diego, obrigado, bondade a de vcs.
Esse texto nem deveria ser chamado de meu, pois é resultado de muitas 
conversas, as daqui da lista e também outras q tenho com outros amigos e 
colegas de outros grupos. As palavras aí eu apenas registrei, há tempos vêm as 
ideias se aninhando na minha cabeça, vindas de outras e compartilhadas comigo, 
como fazemos aqui.
Acho q o ponto importante mesmo é não perdermos de vista a continuação da 
conversa com todos, por mais difícil q possa parecer. Eu mesmo não sou bom 
nisso, mas o exemplo do Daryl Davis é inspirador:
 
https://www.npr.org/2017/08/20/544861933/how-one-man-convinced-200-ku-klux-klan-members-to-give-up-their-robes
Abraços,  cass.

Em sex., 2 de dez. de 2022 20:27, Diego Almeida 
<adiego.u...@gmail.com<mailto:adiego.u...@gmail.com>> escreveu:
Texto muito interessante.

Abraços.
Diego

Em sex., 2 de dez. de 2022 às 15:39, Daniel Durante 
<durant...@gmail.com<mailto:durant...@gmail.com>> escreveu:
Salve Cassiano,

Vou usar este seu email como texto de minhas aulas 👏🏼👏🏼🙂

Saudações,
Daniel.
-----
Departamento de Filosofia - (UFRN)
http://danieldurante.weebly.com

On 29 Nov 2022, at 10:03, Cassiano Terra Rodrigues 
<cassiano.te...@gmail.com<mailto:cassiano.te...@gmail.com>> wrote:

Camaradas, após mais ou menos 1 ano e reaberto este tópico, acho q deixei 
algumas perguntas q me foram dirigidas sem resposta e aproveito o ensejo para 
retomar algumas ideias, nada off-topic, como afirmou o Júlio. Peço desculpas 
pela assistematicidade, mas escrevo sem grandes pretensões de delimitação ou 
demarcação.
Em geral, concordo com o Eduardo e, respondendo ao Daniel e ao Doria, sustento 
o q disse anteriormente sobre a oposição ciência x pseudociência. Para retomar 
um pouco, é preciso lembrar q Popper inicialmente não usava o termo, mas 
propunha seu critério de demarcação relativamente à distinção entre ciência e 
metafísica. Ele passou a usar o termo pseudociência posteriormente; e eu não 
sei quem inventou e acho q ninguém sabe ao certo. Por ex., ao menos a 
Enciclopédia da Stanford remonta ao século 17!. Se for isso mesmo, a questão da 
demarcação é um sintoma, assim como a questão da definição de o q é filosofia: 
no momento em q o conhecimento, na Europa, se fragmenta em áreas 
especializadas, surge a questão de definir o que cada um faz. Se Galileo era ao 
mesmo tempo um filósofo natural e um "scientifico", mas ainda não era um 
físico, Einstein já é um físico, um cientista profissional e também um filósofo.
O que eu quero dizer com esses exemplos? Bem, eu penso q o mais importante é 
opor a ciência ao que não é ciência, e não à falsa ciência, ou à ciência 
mentirosa (quem ousar explicar "pseudo", por favor, não sei como fazê-lo, acho 
q penso muito etimologicamente para isso). A estratégia de definir ciência pelo 
recurso às condições sine qua non etc. mostra-se muito limitante quando se 
trata no fundo de uma atitude: a genuína atitude científica nada tem q ver com 
condições suficientes ou necessárias, mas com uma genuína disposição para 
aprender. Por isso a construção coletiva do conhecimento é tão importante, pq 
desbanca inclusive as próprias proposições científicas. Não se trata de 
abandonar critérios de demarcação, ou ceder a relativismos, mas de reconhecer q 
não basta ser pesquisador, usar bem os métodos racionais ou racionalistas, para 
ter atitude científica (pensando aqui no velho Peirce: 
https://www.textlog.de/4232.html). Atualmente, há pessoas com altíssima 
educação científica ocupando altos cargos governamentais e defendendo posições 
bem duvidosas. Pode-se dizer muitas coisas do recém eleito senador e 
ex-ministro-astronauta, mas não q ele não sabe o q é ciência - acho q é 
justamente por saber q decidiu fazer parte do atual governo. Boa parte do alto 
escalão nazista também tinha grandes cientistas e muitos, inclusive, 
trabalharam por décadas na OTAN após a guerra. O nazismo tinha uma grande 
campanha negacionista, Hess era antroposófico, mas não nos esqueçamos q foi o 
uso - repito, o uso - da ciência q levou a indústria de guerra nazista a quase 
ganhar a guerra. Então, a questão é para que se usa o conhecimento, não é o 
conhecimento em si. Não existe ciência, nem conhecimento algum, pairando no ar. 
Se a abstração e o distanciamento de contextos locais é o q permite, em certo 
grau, a universalização do conhecimento, ao mesmo tempo sem aproximar de 
contextos locais é impossível aprender (o interesse específico do químico na 
tabela periódica, citado por Peirce no texto acima, é um exemplo disso). Nesse 
sentido, eu diria q a tentativa de impor um modo de conhecer e uma maneira de 
exprimir o conhecimento como a única verdade racional é um equívoco 
colonialista. Não a ciência, mas a maneira como ela é feita e imposta (a Helen 
Longino tem um argumento parecido: é possível organizar um laboratório de 
maneira sexista, mas seria razoável afirmar q as equações são sexistas? Em que 
medida a linguagem q usamos para exprimir o conhecimento é desvinculada de 
outras dimensões das nossa próprias vidas?). De fato, uma luta dos povos 
indígenas é para q os seus modos de saber sejam reconhecidos como legitimamente 
científicos, já q localmente funcionam. Para isso, combinam essa reivindicação 
à exigência de acesso às modernas metodologias e condições para fazer ciência. 
Pois é também um outro fato que não existe uma única comunidade, pois não há 
uma única humanidade, há muitas comunidades e comunidades são sempre imaginadas 
(sigo aqui mal e grosseiramente Benedikt Anderson). Não é possível sustentar 
práticas comunitárias acriticamente e correr o risco de as essencializar e 
nesse ponto acho q Gellner realmente tem muito a dizer.
Mas, com a licença de Gellner e sem intenção de pesar demais a linguagem, 
scientia em latim vem do verbo scio - segurar, pegar firme - e traduz o grego 
episteme - compreensão, étimo ligado a pistis, crença. Assim, quem busca a 
scientia, busca a compreensão, busca uma crença q dure frente à instabilidade 
dos fatos; e quem busca a sofia, busca a algo mais q isso, já que sofia é mais 
saber do que episteme (Aristóteles assim definia). Parece q em certo momento da 
história, ciência e filosofia, q nasceram juntas, trocaram de lugar no berço e 
daí cresceram separadamente. Mas ciência e filosofia são impulsos fundamentais 
da natureza humana e nunca deixarão de ser, enquanto houver gente, haverá 
ciência e filosofia, assim como religiões e outras crenças - em todas as partes 
do mundo, por quaisquer pessoas. Historiadores, antropólogos, cientistas, 
poetas e até mesmo o senso comum estão a nos mostrar cotidianamente a 
insuficiência das pretensões universalistas e essencialistas da filosofia 
ocidental. Mais fortemente a partir do século XX, essa crítica é feita 
inclusive no seio da própria tradição filosófica (até que alguém diga que eu 
estou erradíssimo, desconstrução de Derrida, o conceito deleuziano de rizoma, 
até mesmo os paradigmas de Kuhn seriam exemplos disso). Concordo em gênero, 
número e grau (expressão esta, aliás, q a ciência da linguística desautoriza): 
por mais que se tente esconder, é certo que o saber grego foi intrinsecamente 
influenciado pelo egípcio; é certo que, desde a Antiguidade, a África, não 
apenas a saariana, tem saberes ancestrais de grande impacto e inestimável 
importância histórica; é certo que os que se julgam racionais são muito menos 
do que se imaginam. E há tantos outros "é certo" que são emudecidos. Tudo isso 
deveria estar muito mais presente na escola da criança e na pesquisa 
universitária. Mas também é necessário muito critério para não combater 
equívoco com equívoco, um essencialismo com outro.
O que está em jogo, ao que me parece, é a reivindicação de o que há de mais 
importante, mais difícil e mais fundamental - o estatuto de quem é humano e tem 
direitos (e privilégios, em se tratando de projetos de poder). Por isso há os 
ataques que visam a desqualificar o saber científico e o filosófico, pois me 
parece q tais ataques identificam esse saber com um legado (seja ele 
ocidental-colonialista, egípcio, africano, chinês, indiano etc.) que, por sua 
natureza original, define um modo superior de pensar e sobretudo de ser (o uso 
da dicotomia ciência x pseudociência serve bem a isso e me parece igualmente 
equivocado - isto é, como sugeriu o Daniel, devemos então conceder q os 
psicanalistas não pensam racionalmente? Os cara-pálidas deviam experimentar uma 
terapia com jabuticaba - como a desse poema aqui: 
https://youtu.be/z-xxy9_8duM). E se for o caso de usar o termo "ciência" ou o 
termo "filosofia" num sentido que transborde suas determinantes históricas 
greco-ocidentais, que ele designe então, não uma essência fechada no passado, 
mas sim um devir aberto ao futuro.
Saudações e perdão se fui enfadonho.
cass.





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