Manifesto pela recuperação dos bens comuns da humanidade

http://www.alfarrabio.org/index.php?itemid=3029

A implantação de cercas nos campos da Inglaterra, para seu uso somente
por aqueles que deles se apossavam, conheceu uma aceleração nos
séculos XV e XVI, e deflagrou um processo de privatização de bens de
uso comum das sociedades humanas. Logo em seguida o mundo passou a ser
dominado pela lógica do sistema capitalista de produção, em que tudo
pode ser transformado em dinheiro, e a industrialização abriu as
portas para a produção em massa. O processo de privatização se
associou então a uma mercantilização desenfreada, exacerbando a
ganância e a competição.

O resultado disso é que a Humanidade vive, nos dias de hoje, uma crise
de civilização, em que um conjunto de crises pode levar à destruição
das sociedades humanas e do planeta Terra, com o aprofundamento dos
traços mais regressivos da sociedade moderna: crescimento das
desigualdades sociais, frenesi consumista, destruição da natureza,
militarização das relações internacionais, seqüestro dos poderes
públicos pelos mercados e pelo produtivismo, apropriação violenta de
recursos naturais, retrocessos democráticos.

De um lado da esquizofrenia hoje dominante, a produção de armamentos é
fonte interminável de lucros; a destruição do meio ambiente gera um
crescimento econômico desigual e excludente; a industria farmacêutica
aufere ganhos fabulosos atendendo às necessidades somente daqueles que
podem pagar os altos preços dos remédios que produzem; o controle da
produção e da venda de sementes leva ao suicídio pequenos produtores
agrícolas pelas dividas que contraem; a criação do dinheiro como
instrumento facilitador das trocas se encontra privatizada pelos
bancos que, ainda quando agora se revelam como o coração de uma
economia cassino, especulativa e desvinculada da economia real, são
reforçados pelos remédios governamentais à atual crise financeira.

De outro lado, não se compartilham conhecimentos que permitiriam o
acesso de grandes parcelas da população à solução de seus problemas;
tampouco são considerados os conhecimentos e as estrategias
socioprodutivas construídas por comunidades ao longo de sua história e
que permitiriam e emergência de alternativas frente a mercantilização
da vida; a preservação da floresta necessária à continuidade da vida
no planeta é considerada obstáculo ao desenvolvimento; a pesquisa
científica não serve à luta contra endemias que dizimam populações
inteiras; descobertas e outras contribuições úteis para a humanidade
se tornam inacessíveis, protegidas por patentes e direitos autorais
defendidos cegamente; grandes produções agrícolas de efeito ambiental
desconhecido e intensas explorações minerais de grande impacto
socioambiental se espalham pela Terra para fornecer combustível e
matéria prima para manter os níveis de comodidade dos mais ricos e um
padrão de produção e consumo insustentável.

O Fórum Social Mundial de 2009, em Belem do Pará, no Brasil, ocorre em
um momento muito especial, em que a globalização neoliberal,
impulsionada pelas finanças desacorrentadas de qualquer controle
público e legitimadas pela ideologia do livre mercado, fracassa
espetacularmente.

O momento é muito especial também porque, ao mesmo tempo, no mundo
inteiro emerge uma nova consciência de que há bens que em nenhuma
hipótese podem ser privatizados ou mercantilizados, como bens de uso
comum de todos os seres humanos e da própria natureza.

Os subscritores do presente Manifesto, lançado no Fórum Social Mundial
de 2009, conclamam todos os cidadãos do mundo e suas organizações a se
engajarem na ação pela desprivatização e desmercantilização desses
bens, como uma bandeira assumida por toda a Humanidade.

Que cada um no lugar em que vive e no seu campo de luta, assumindo uma
postura de cooperação como um valor essencial à vida humana, se
mobilize:

- para ampliar e aprofundar essa nova consciência que está emergindo
que reivindica a defesa dos recursos ambientais e socioculturais como
bens coletivos e o direito universal a uma proteção ambiental equânime
contra a discriminação sócio-territorial e as desigualdades promovidas
pelo mercado;

- para apoiar a ação das organizações que se lançam na defesa da água
e dos rios, da terra, das sementes, do conhecimento, da ciência, das
florestas, dos mares, do vento, da comunicação e da intercomunicação,
da cultura, da música e demais artes, dos serviços públicos de
educação, saúde, saneamento, do dinheiro, das sabedorias ancestrais;

- para articular as lutas de suas próprias organizações, reforçando-se
mutuamente, nas campanhas e iniciativas propostas e desenvolvidas com
esses objetivos.

Os subscritores do presente Manifesto se comprometem a atuar
intensamente para recuperar, para o uso comum dos seus semelhantes, na
co-responsabilidade e sob o controle social, todos os bens e serviços
necessários à vida.



-- 
Fabianne Balvedi
GNU/Linux User #286985
http://fabs.tk
"Vem
Vencer
o automóvel
Vem
vem ser
o auto-móvel"
Paulo Esmanhoto
_______________________________________________
PSL-Brasil mailing list
PSL-Brasil@listas.softwarelivre.org
http://listas.softwarelivre.org/mailman/listinfo/psl-brasil
Regras da lista:
http://twiki.softwarelivre.org/bin/view/PSLBrasil/RegrasDaListaPSLBrasil

Responder a