[obm-l] Re: [obm-l] Funções periódicas nos complexos

2013-09-02 Por tôpico Bernardo Freitas Paulo da Costa
2013/9/2 Bernardo Freitas Paulo da Costa :
> 2013/9/2 Artur Costa Steiner :
>> Olá amigos,
> Oi Artur,
>
>> Se f for uma função meromorfa, periódica e não constante, então f tem algo 
>> análogo a um período fundamental, isto é, existe um período p cujo valor 
>> absoluto é positivo e mínimo. Não sei se este p é único. Todos os múltiplos 
>> inteiros de p são períodos e estão na reta definida pelo argumento de p. No 
>> caso, por exemplo, de f(z) = exp(z), p = 2 pi i.
>
> Não, este p não é único. Existem funções meromorfas cujos períodos são
> 1 e i, que são portanto mínimos e diferentes. Mas, fora este fenômeno
> meio "especial", o que você falou está perfeitamente certo. Para ser
> formal: como f não é constante, existe um ponto z tal que f'(z) é
> diferente de zero, e portanto uma vizinhança onde f(z) != f(w) para
> todo w na vizinhança. Assim, o conjunto dos períodos {p complexo /
> f(w+p) = f(w) para todo w} é um subgrupo aditivo de C, onde zero é
> isolado. Assim (mesma demonstração que em R) existe um valor r = min =
> inf { |p| / p período, p != 0 }.

Ah, sim, faltou o exemplo:
considere a função

f(z) = sum_{m,n inteiros} 1/(z - m - n*i)^3

que é (por definição!) periódica de períodos 1 e i. É um pouco mais
chatinho ver que ela é meromorfa, porque daí você tem que provar que
ela é
- uma série convergente para z fora do reticulado {1,i} (use que 1/z^3
é integrável em R^2)
- que a derivada desta série convergente é também uma série
convergente, uniformemente sobre os compactos que não intersectam o
reticulado
porque daí ela será uma função com derivada contínua e z-linear,
portanto holomorfa em todos o C menos nos pólos do reticulado.
Para ver que ela é meromorfa nos pontos do reticulado, isole o termo
1/z^3 numa vizinhança de zero, repita os argumentos de cv uniforme e
veja que a derivada "existe".
Como f é periódica, acabou.

Outra demonstração: tome |z| < 1/3, expanda todos os termos exceto
1/z^3 em potências de z, usando 1/(z - a) = soma da série geométrica,
depois derivando a série 2 vezes, troque a ordem das somas (atenção
para aplicar Fubini direitinho) e veja que a série assim obtida é um
desenvolvimento de Laurent.

Essa é uma das funções de Weierstrass. Existe uma outra, mais
importante, que é a primitiva desta, mas é mais difícil mostrar que a
primitiva é periódica ;-) (e também é mais difícil mostrar que a
primitiva é uma função meromorfa bonitinha).

Abraços,
-- 
Bernardo Freitas Paulo da Costa

-- 
Esta mensagem foi verificada pelo sistema de antivírus e
 acredita-se estar livre de perigo.


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Instruções para entrar na lista, sair da lista e usar a lista em
http://www.mat.puc-rio.br/~obmlistas/obm-l.html
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[obm-l] Re: [obm-l] Funções periódicas nos complexos

2013-09-02 Por tôpico Bernardo Freitas Paulo da Costa
2013/9/2 Artur Costa Steiner :
> Olá amigos,
Oi Artur,

> Se f for uma função meromorfa, periódica e não constante, então f tem algo 
> análogo a um período fundamental, isto é, existe um período p cujo valor 
> absoluto é positivo e mínimo. Não sei se este p é único. Todos os múltiplos 
> inteiros de p são períodos e estão na reta definida pelo argumento de p. No 
> caso, por exemplo, de f(z) = exp(z), p = 2 pi i.

Não, este p não é único. Existem funções meromorfas cujos períodos são
1 e i, que são portanto mínimos e diferentes. Mas, fora este fenômeno
meio "especial", o que você falou está perfeitamente certo. Para ser
formal: como f não é constante, existe um ponto z tal que f'(z) é
diferente de zero, e portanto uma vizinhança onde f(z) != f(w) para
todo w na vizinhança. Assim, o conjunto dos períodos {p complexo /
f(w+p) = f(w) para todo w} é um subgrupo aditivo de C, onde zero é
isolado. Assim (mesma demonstração que em R) existe um valor r = min =
inf { |p| / p período, p != 0 }.

> Mas pode haver outros períodos que não sejam múltiplos inteiros de p. É fácil 
> ver que estes últimos não estão sobre a reta acima citada. Ouvi, e não 
> consegui provar, que, dentre os períodos não múltiplos inteiros de p, há um 
> p' cuja distância à reta dos múltiplos inteiros de p é positiva e mínima. O 
> que eu consegui provar é que a distância euclidiana entre o conjunto dos 
> períodos da forma np, n inteiro, e o conjunto dos outros períodos é positiva.

É basicamente um argumento de "inf = min em conjuntos discretos".
Considere todos os períodos que não estão na reta pZ, chame este
conjunto de PP. Eles estão todos a distância maior ou igual a r da
origem, e pela minimalidade de p, há apenas um número finito deles em
qualquer disco de raio R. Considere portanto uma aplicação f : PP
inter D_R x [0,p] -> R dada pela distância de um ponto periódico em
D_R e um ponto no segmento 0-p. Ela é contínua, logo admite um mínimo
diferente de zero. Agora, se R é suficientemente grande, por conta da
simetria de translação, este mínimo será também o mínimo da função F :
PP x pR -> R distância. (Formalize este último argumento. Dica: comece
estimando o mínimo com um ponto qualquer q em PP.)

Hum, relendo tudo aqui, eu vi que eu me confundi com "a reta dos
múltiplos inteiros" e provei que o mínimo é para todos os pontos da
reta, e não apenas (como fica claro na parte seguinte) que são apenas
os pontos pZ e "todos os outros pontos" que você está falando. A
demonstração, entretanto, é exatamente a mesma. Não dá pra fugir da
compacidade ;-).

Dê uma olhada em "lattices" na Wikipedia (em inglês, ou, com mais
figuras ainda, "réseaux" em francês). (adendo: palavrinha chata, ela
se diz "reticulado" ou "retículo" em português... muitas diferenças em
línguas simples!)

> Parece também que p/p' não é real. E que o conjunto de todos os períodos é o 
> conjunto das combinações lineares inteiras de p e de p'. Que tais combinações 
> são períodos é imediato, mas além disto não há nenhum período que não se 
> enquadre em tais combinações.

Isso é um argumento muito legal de álgebra "linear" com coeficientes
inteiros / racionais. A idéia intuitiva é que um reticulado com mais
do que n geradores L.I. sobre Q, todos os geradores em R^n, não é
discreto. Assim, se p/q fosse real, teríamos dois geradores
independentes sobre Q, logo uma seqüência de pontos z_n -> 0 onde
f(z_n) = f(0), logo f seria constante (e aqui você usa que f é
analítica).

> Eu estou certo? Alguém conhece este assunto?

Se você quiser olhar para as funções meromorfas (bi-)periódicas, estas
são as belíssimas funções p de Weierstrass, e têm a ver com Teo dos
Números e geometria complexa. Se for mais a parte de Álgebra Linear,
tem também várias coisas (e também muitas coisas de Teo dos Números,
claro), e daí eu conheço menos...

> Abraços
>
> Artur

Abraços,
-- 
Bernardo Freitas Paulo da Costa

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2013-09-02 Por tôpico Artur Costa Steiner
Olá amigos,

Se f for uma função meromorfa, periódica e não constante, então f tem algo 
análogo a um período fundamental, isto é, existe um período p cujo valor 
absoluto é positivo e mínimo. Não sei se este p é único. Todos os múltiplos 
inteiros de p são períodos e estão na reta definida pelo argumento de p. No 
caso, por exemplo, de f(z) = exp(z), p = 2 pi i. 

Mas pode haver outros períodos que não sejam múltiplos inteiros de p. É fácil 
ver que estes últimos não estão sobre a reta acima citada. Ouvi, e não consegui 
provar, que, dentre os períodos não múltiplos inteiros de p, há um p' cuja 
distância à reta dos múltiplos inteiros de p é positiva e mínima. O que eu 
consegui provar é que a distância euclidiana entre o conjunto dos períodos da 
forma np, n inteiro, e o conjunto dos outros períodos é positiva. 

Parece também que p/p' não é real. E que o conjunto de todos os períodos é o 
conjunto das combinações lineares inteiras de p e de p'. Que tais combinações 
são períodos é imediato, mas além disto não há nenhum período que não se 
enquadre em tais combinações.

Eu estou certo? Alguém conhece este assunto?

Abraços

Artur



Artur Costa Steiner
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