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Eleições - Desconfiança eletrônica

Correio Braziliense - 9.6.2002


O Brasil é o único país do mundo a ter uma eleição totalmente 
informatizada, sem papel. Em outubro próximo, 406 mil urnas eletrônicas vão 
registrar os votos de quase 90 milhões de eleitores brasileiros. Os avanços 
em termos de agilidade e eliminação de antigas fraudes de
apuração são inegáveis. Mas essa exclusividade tecnológica vem provocando 
mais desconfianças do que orgulho. Oferecida a 47 países, a urna eletrônica 
nacional foi rejeitada. Estudos publicados por analistas nacionais e 
internacionais somados a entrevistas realizadas pelo Correio com 
profissionais de informática apontam os motivos que fazem da urna
digital um caso tipicamente brasileiro e indicam porque nosso sistema 
eleitoral ainda é envolvido pela nuvem da desconfiança.

Primeiro, o óbvio. Todo computador (e a urna é um) pode ser infectado por 
vírus desenvolvidos para desviar votos de um candidato para outro.
Segundo, como a urna não imprime recibos dos votos é impossível confirmar 
se a opção digital foi computada corretamente pela máquina. Ou seja, não 
existe recontagem nem auditagem. Há ainda a participação da Agência 
Brasileira de Inteligência (Abin), órgão do Poder Executivo, no 
desenvolvimento de um dos programas que fazem a urna funcionar,
ingrediente que acende a imaginação dos adeptos da teoria da conspiração. 
Abaixo, um quadro com perguntas e respostas mostra as virtudes e as 
deficiências do sistema eleitoral brasileiro.


1 - Como funciona a urna eletrônica?

Os programas de computador (software) que fazem a urna funcionar executam 
as seguintes tarefas:
1. Coletam e tabulam os votos vindos do teclado.
2. Produzem, ao final da votação, o Boletim de Urna (BU), que contém a 
totalização dos votos, indicando a performance de cada candidato. Os BUs 
são impressos e gravados em disquetes.
3. As informações dos BUs são criptografadas (isto é, as informações são 
embaralhadas) para que os boletins sejam enviados das seções eleitorais 
para a junta de apuração.

2 - Os resultados apresentados pelas urnas são confiáveis?

   Sim, se levarmos em conta os resultados apresentados nas últimas 
eleições. Não houve nenhum desfecho surpreendente que pudesse sugerir o 
desvio de votos. A hipótese da existência de uma conspiração montada no 
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e na Abin com intuito de fraudar as 
eleições é remota. É pouco provável que, em conluio, o TSE e os
analistas de informática da Abin desenvolvam um programa de computador 
desonesto para ser colocado nas urnas eletrônicas a fim de desviar votos de 
um candidato para outro.

3 - Por que, então, as dúvidas em relação a transparência das eleições?

   Primeiro, nenhum softwares (programa) é à prova de fraude. Dizia-se que 
era impossível conhecer os votos secretos dos senadores. Mas a fraude do 
painel do Senado foi comprovada e mostrou a fragilidade do sistema de 
votação do Congresso. Ao impedir a análise completa de todos os programas 
instalados nas urnas pelos fiscais dos partidos políticos, o TSE diminui 
muito o nível de confiabilidade do sistema, reduzindo-o apenas à palavra 
dos técnicos do governo envolvidos de que a urna eletrônica contém 
programas honestos.

4 - Qual seria a fraude mais perigosa?

   A fraude mais perigosa seria aquela que pode ser montada dentro da urna, 
pela inserção de um programa de computador embusteiro. Se o embuste for 
inserido no software antes de ser entregue pelo TSE aos tribunais 
regionais, o alcance da fraude pode ser nacional. Um programa pirata que 
inverta, por exemplo, um em cada 33 votos digitados no teclado para um 
determinado candidato provocaria um desvio de 6% no resultado final da 
votação.

5 - Mas como o programa pirata instalado na urna vai saber para qual 
candidato desviar votos, uma vez que cada concorrente recebe um número 
particular que não é previamente conhecido?

   Nas últimas eleições, os candidatos dos principais partidos vêm 
recebendo sempre o mesmo número. Assim, os candidatos pelo PT e PSDB à 
presidência, por exemplo, devem estar associados, respectivamente, aos 
números 13 e 45.

6 - Em caso de dúvida, a votação eletrônica poderá ser auditada? É possível 
fazer um a recontagem dos votos?

   Não. O TSE criou um sistema eleitoral que não pode ter sua apuração 
conferida ou recontada, pois a urna eletrônica não emite um comprovante 
impresso do voto para ser guardado. Os votos saem da urna já somados, 
tabulados e codificados por programas de computador.

7 - Por que, então, não são impressos recibos dos votos?

   Esta é uma deficiência do sistema reconhecido pelo próprio TSE. Tanto 
que a partir das eleições de 2004, as urnas eletrônicas vão imprimir 
recibos dos votos, que depois de vistoriados pelos eleitores, serão 
depositados em urnas tradicionais que serão lacradas. Esse fator extra de 
segurança foi aprovado no Congresso no ano passado, dentro da chamada
Lei Jobim.

8 - O sigilo do voto está garantido?

   Em caso de fraude, não. Existe a possibilidade de quebra do sigilo do 
voto individual. Isso porque o número do título de eleitoral é digitado na 
própria urna (o microterminal do mesário é conectado à urna) imediatamente 
antes do registro de seu voto. Claro que isso só ocorreria se a urna 
estivesse contaminada com um programa pirata que faria a associação entre 
voto e número de título de eleitor.

9 - É realmente preciso que a urna contenha um programa de criptografia 
(técnica que embaralha as informações coletadas pelo computador) 
desenvolvido por técnicos que fazem parte dos quadros da Abin para garantir 
a segurança da votação?

   Não. Não é preciso uma programa dessa natureza para asseguar o sigilo 
dos Boletins de Urna durante seu transporte, uma vez que eles são impressos 
na origem (nas seções eleitorais) e no destino (nas juntas de apuração). 
Registre-se que não seria preciso criptografar os dados de totalização da 
urna para transmissão (das zonas eleitorais para os
TREs), uma vez que são públicos os dados a serem transmitidos. O que 
realmente importa no transporte do boletim de urna é a preservação da sua 
integridade e não do seu sigilo.

10 - O que fez o TSE para evitar fraudes na votação?

   O Tribunal criou um programa chamado Política de Desenvolvimento 
Estanque (PDE). De acordo com o TSE, os três programas de computador 
(software) que fazem a urna funcionar foram desenvolvidos por empresas 
diferentes. Com isso, evitou-se que uma mesma empresa ou grupo de técnicos 
conhecesse a totalidade dos softwares, fato que permitiria mais facilmente 
a instalação, por parte de analistas desonestos, de um virus na urnas capaz 
de desviar votos.

11 - E é eficaz esse tipo de prevenção?

   Não. Segundos estudos publicados por especialistas da área de 
Informática aos quais o Correio teve acesso, seria possível introduzir em 
qualquer um dos três programas que fazem a urna funcionar uma espécie de 
vírus (um programa oculto) que poderia adulterar os votos. A PDE, somente, 
não garante a integridade do sistema. Impede, é verdade, que haja uma 
fraude externa. Mas não a possibilidade de uma fraude montada por 
especialistas envolvidos na programação das urnas.

12 - As velhas fraudes eleitorais acabaram com a votação eletrônica?

   Não. Algumas fraudes antigas não foram eliminadas só porque o voto 
passou a ser eletrônico e sem papel. Fraudes como a dos eleitores 
fantasmas, na qual o mesário libera o voto de vários títulos eleitorais 
numa mesma visita de seu comparsa à cabine, ainda podem acontecer. Nas 
eleições de 2000, o TSE descobriu uma fraude desse tipo. Laudo concluído
pelo tribunal confirmou irregularidades na eleição para prefeito de 
Camaçari (BA). A fraude aconteceu no recadastramento eleitoral. Eleitores 
fantasmas foram incluídos no cadastro e mesários desonestos votaram 
eletronicamente por eles.

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O Voto de Borzeguim

Por Roberto Requião

Estão dadas todas as possibilidades de fraude e de quebra do sigilo de 
voto, graças a resistência para que as urnas eletrônicas fossem dotadas de 
impressoras que garantissem sua auditoria.

   Vejam, uma balança eletrônica de um supermercado é uma máquina de boa 
precisão e relativa segurança. No entanto, se um telefone celular for 
acionado ao lado dela, a balança desregula-se, imediatamente.

   Da mesma forma o computador. Por mais sofisticado que seja, ele é 
passível de interferência. E a urna eletrônica é um computador programado 
para o voto. Dizer que é à prova de fraude, é uma temeridade. Diziam o 
mesmo do painel eletrônico do Senado.

   Sem a possibilidade de auditar a coleta dos votos, ficamos na 
dependência da seriedade de quem opera o sistema. No caso, o TSE 
comporta-se como o paraguaio da propaganda: ‘‘La garantía soy yo’’.

   Uma urna eletrônica imune à fraude é uma urna eletrônica que permita a 
auditagem dos votos, que possibilite a conferência, garantindo tanto a 
vontade do eleitor quanto o sigilo de sua escolha. Na medida em que você 
não pode conferir, não sabe se aquilo que você digitou é o que foi 
registrado pela máquina.

   Caso todas as urnas eletrônicas tivessem sido dotadas de um sistema de 
impressão do voto, teria sido afastada a possibilidade de adulteração do 
resultado, já que seria possível a conferência da votação.

   Acho incrível que diante da sofisticação da fraude eletrônica, do apuro 
técnico dos ‘‘hackers’’, ainda persista a resistência para impedir que o 
nosso sistema de votação seja totalmente confiável. Todas as explicações 
que o TSE deu para justificar essa teimosa posição não me convencem. 
Parafraseando Clareta Petacci, afastando o duce Benito: ‘‘Não nos venham de 
borzeguins ao leito’’.

   Sendo menos profano, recordo aqui as discussões sobre a existência de 
Deus, em minhas aulas de Teologia na Universidade Católica do Paraná. Uma 
das provas da existência do Senhor, era o consenso universal sobre ela. Já 
que todos acreditavam, Ele existia. Pois bem, uma das provas da 
inexistência da confiabilidade da urna eletrônica é a sua rejeição 
universal. Oferecida a 47 países, foi recusada por todos.

   Sem mecanismos que garantam a auditoria, não teremos a segurança do voto 
do brasileiro, resta-nos, a todos que acreditamos em Deus, rezar para que a 
fraude seja afastada, amém. Ou talvez, vade retro santanás.

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Secular história de fraudes

Por Thiago Vitale


   A história do voto no Brasil pode ser contada em dois capítulos. No
primeiro, que compreende os períodos colonial e imperial, as fraudes e o
voto censitário dominavam. No segundo, que começa com a república e dura
até hoje, as irregularidades nas votações permaneceram. Mas, por outro
lado, os avanços éticos e tecnológicos do processo eleitoral brasileiro
não podem ser ignorados.

   O primeiro código eleitoral aplicado ao Brasil não foi escrito por
brasileiros. As Ordenações do Reino, elaboradas em Portugal na Idade
Média, regulamentaram o pleito de 1821, quando os cidadãos brasileiros
elegeram seus representantes na Corte de nossos ‘‘descobridores‘‘. No
ano seguinte, a pedido de Dom Pedro I, foi criada a primeira legislação
eleitoral brasileira, que regeu as eleições para a Assembléia Geral
Constituinte em 1822. Como resultado da assembléia eleita, em março
1824, Dom Pedro I promulga nossa primeira constituição.

   Até a proclamação da República, em 1889, só podiam votar no Brasil
homens livres com renda igual ou superior a 1,5 tonelada de mandioca.
Escravos e mulheres não podiam votar. As mulheres só conquistaram o
direito ao voto com a Constituição de 1934. Na Nova Zelândia, primeiro
país a liberar o voto feminino, elas já tinham o direito desde 1893.

Fraudes

   As condições precárias de apuração e voto sempre tornaram as eleições
brasileiras de fácil manipulação. Até 1842, havia voto por procuração,
onde um eleitor transferia seu direito de voto a outra pessoa.
   Para complicar ainda mais, não existia título de eleitor. Assim, o
votante era identificado pelos membros da mesa de votação ou por alguma
testemunha que o acompanhasse até o local da votação.

   Em 1881, a Lei Saraiva tentou colocar ordem na casa com a criação do
título de eleitor. O documento continha nome, nascimento, filiação,
estado civil e profissão sem, contudo, ter a foto do eleitor. A farra
era grande. Durante anos, pessoas mortes e crianças ‘‘votaram‘‘ nas
eleições. Sem contar os eleitores que votavam em municípios diferentes.

   As eleições brasileiras só começaram a ficar mais confiáveis a partir
de 1932, com a criação da Justiça Eleitoral, reivindicação do Tenentismo
e da Revolução de 1930. Além de um novo Código Eleitoral, foram criados
os Tribunais Regionais Eleitorais (TRE) e o Tribunal Superior Eleitoral
(TSE).

   A alegria dos que sonhavam com eleições livres e diretas duraria
pouco. Logo apareceu Getúlio Vargas e, com ele, a ditadura e o Estado
Novo. De 1937 a 1945, não houve eleições no Brasil e a Justiça Eleitoral
permaneceu extinta. O Congresso Nacional foi fechado. Vargas não
suportou a onda democrática pós-Segunda Guerra e sucumbiu em 1945. Logo
vieram as primeiras eleições e Eurico Dutra foi eleito com 54,2% dos
votos. Mas as fraudes ainda rondavam as disputas eleitorais. No fim da
década de 50, um recadastramento e a adição da fotografia no título de
eleitor comprovaram que haviam 1,8 milhão de eleitores fantasmas no
Brasil.

   A década de 80 e a redemocratização chegaram. Em 1979, o bipartidarismo 
obrigatório e extinto e surgem novos partidos. Aos poucos, a idéia de 
eleições diretas começam a tomar corpo no país. Em 1984, multidões saem às 
ruas na tentativa de forçar eleições livres.
Eram as Diretas Já. Em fevereiro de 1985, a emenda constitucional que 
previa eleições diretas não passa no Congresso Nacional. Mas já não havia 
mais como ir contra a vontade da população. Em 1988, a Constituição prevê 
eleição direta para escolher os governantes e libera, também, o voto para 
maiores de 16 e analfabetos.

[ ]s
     Eng.  Amilcar Brunazo Filho - Santos, SP
     EU QUERO VER MEU VOTO !
     moderador do Fórum do Voto Eletrônico
             www.votoseguro.org
     moderador do Movimento em Defesa da Língua Portuguesa
             www.novomilenio.inf.br/idioma

             "Eu não sei se o TSE frauda as eleições com a
              urna eletrônica, nem se ele deixa fraudar, mas
              de uma coisa eu tenho absoluta certeza: ele
              não deixa investigar de jeito nenhum"  - PGSA.

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