On Oct  6, 2014, anah...@anahuac.eu wrote:

> Desde quando ser uma ativista do Software Livre virou sinônimo de não
> usar produtos da google?

Sei lá.  Acho que nunca foi.

Eu, por exemplo, uso ceph (sistemas de arquivo distribuído) e twister
(µblog P2P) e ambos trazem como dependência a biblioteca leveldb, um
produto do Google disponível como Software Livre.

Capaz que haja outros programas que uso que sejam implementados em go e
carreguem como dependência o sistema de execução dessa linguagem, também
produto do google e também disponível como Software Livre.

Um dos meus telefones roda Replicant, uma versão levemente modificada (e
Livre!) do sistema Android, este produto do Google *quase* Livre.

Embora meu motor favorito de busca na Internet seja o DuckDuckGo (ainda
não instalei o yacy), que por sua vez utiliza resultados do Google,
ocasionalmente faço uma busca por imagens no Google Images, porque esse
ainda dá pra usar sem Javascript privativo.

Já o Google Maps, sem chance.  Outros, nem sei...  Faz tempo que fechei
minha conta no Google.  Mas não foi por questões de Software Livre.  Foi
por desrespeito à privacidade no lançamento do Google Wave.
http://www.fsfla.org/blogs/lxo/pub/2010-02-14-bye-bye-google


Não é sempre que concordo com o javaman, mas acho que ele acertou na
mosca.  Temos um Movimento Software Livre, e uma Fundação Software Livre
original e outras irmãs, que chegam a fazer recomendações com relação a
temas de intimidade, privacidade, segurança, nuvens etc, mas que não
perdem (ou não deveriam perder) o foco de sua missão, delimitada como
Software Livre.

Daí a FSF usar Twitter (segundo consta, suficientemente usável sem o
Javascript privativo deles), recomendar não usar a interface web com JS
privativo do gmail (mas não chegar a recomendar que não se use gmail de
forma alguma), e recomendar não usar F*k (não só por causa das questões
de privacidade, mas, segundo entendo, principalmente porque não dá pra
usar sem JS privativo).

A questão da migração do software para a nuvem levanta questões de
liberdade que, em alguns casos, são análogas às do Software Livre,
outras que são idênticas, outras que são bem diferentes e outras que são
inteiramente novas.

É certo que dá pra enxergar nos preceitos do movimento Software Livre
uma semente para algo mais amplo, que possa cobrir e generalizar essas
questões para o ambiente nuvem/móvel para o qual a sociedade vem sendo
empurrada.  Muitas das linhas guias têm a ver, em última instância, com
a liberdade do usuário, que inspira o lema “Software Livre para uma
sociedade livre”.


Veja que no movimento Software Livre, algumas situações exigiram
análises profundas para chegar a conclusões razoavelmente coerentes,
ainda que, para alguns, pareçam incoerentes.  Para dar um exemplo,
refiro-me à questão dos firmwares privativos embutidos em dispositivos
periféricos, considerados equivalentes a circuitos de hardware e
portanto aceitáveis como não piores, em termos de liberdade do usuário,
em contraste com firmwares privativos distribuídos separadamente, que,
ao serem instalados, evidenciam sua diferença de circuitos de hardware e
o consequente prejuízo à liberdade do usuário.

Se há divergências quanto a essa e outras questões, mesmo dentro da
comunidade de Software Livre como tal, como poderíamos esperar que todos
os ativistas de Software Livre concordem com uma mesma posição em
assuntos que não dizem respeito diretamente às quatro liberdades de
software essenciais para que o usuário não perca a autonomia nas
computações que faz em seu próprio computador?  As generalizações não
são óbvias nem imediatas, e levam em contas aspectos que sequer existiam
antes.

Então, embora eu concorde com o que observe como sua visão geral e plano
estratégico a respeito das questões de liberdade individual para uma
sociedade conectada livre, não me parece que seja correto puxar todas
essas ideias para dentro do escopo do movimento Software Livre sem um
debate muito amplo.

No fim, pode até ser que, ao fim de um debate amplo, cheguemos todos às
mesmas conclusões, e que todos concordemos que as questões, embora não
sejam as mesmas, podem ser reduzidas às mesmas, e norteadas pelos mesmos
princípios, levar às mesmas conclusões e estratégias.  Mas, no mínimo,
está faltando esse debate amplo.

Também pode ser que cheguemos a conclusões diferentes, como
frequentemente chegam a conclusões diferentes debates que se propõem a
tentar unificar Software Livre e Cultura Livre, em que nosso movimento
não vê as 4 liberdades como essenciais para obras culturais
não-funcionais, enquanto a Cultura Livre toma posição diferente e tem
até sua própria definição de copyleft.

No caso de chegarmos a conclusões diferentes quanto às questões
nebulosas, pode ser que possamos continuar agindo todos juntos como
ativistas de Software Livre, assim como nós do Software Livre quase
sempre podemos cooperar com esforços de desenvolvimento de software mais
inspirados pela OSI.  Mas isso não impede que cada um faça o seu
ativismo, para (o infinito e) além do movimento Software Livre, nas
questões que dizem respeito ao uso de serviços de comunicação, de
armazenamento de dados, etc, cada qual no movimento organizado (ou não)
que tenha escolhido.

Torço para que não precisemos de outros movimentos e novos conflitos
para nos dividir, mas se for inevitável (já que não se força ninguém a
apoiar um movimento com que não concorde), torço para que ao menos não
surjam conflitos entre esses novos ou futuros movimentos e o movimento
Software Livre que nos tem unido até aqui.

-- 
Alexandre Oliva, freedom fighter    http://FSFLA.org/~lxoliva/
You must be the change you wish to see in the world. -- Gandhi
Be Free! -- http://FSFLA.org/   FSF Latin America board member
Free Software Evangelist|Red Hat Brasil GNU Toolchain Engineer
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