Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-06 Por tôpico Itala Maria Loffredo D'Ottaviano
Marcos:

Esta discussão, provocada pelo bate-papo com o Samuel, ficou tão
interessante, que sugiro a você que programe um bate-papo conjunto entre
você, Samuel e Daniel.
Que tal?

Abraços,

Itala

Em sáb., 5 de ago. de 2023 às 09:23, 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <
logica-l@dimap.ufrn.br> escreveu:

> Salve Daniel,
>
> Incrível como entre nós, brasileiros, o FUTEBOL consegue explicar tantas
> coisas né?
>
> Você pegou a ideia, sim é isso mesmo.
>
> Matemática é um trabalho, e os ambientes de trabalho são os modelos... Os
> matemáticos, somos jogadores profissionais de futebol (com o BOM e o RUIM
> da sua mensagem, é a tal coisa da dor e a delícia de ser o que é...).
>
> Mas pra além daquele BOM e RUIM tem mais uma coisa: existem esses momentos
> (e na verdade os matemáticos fora da área de fundamentos sempre vivem esse
> tipo de momentos) nos quais o teorema que provamos vale em todos os
> tabuleiros, em todos os campos de jogo.
>
> Isso acontece quando provamos algo "ZFC puro", sem hipóteses adicionais.
>
> Pelo Teorema da Completude, algo que provamos "ZFC puro" é válido em todos
> os tabuleiros (e reciprocamente).
>
> Nossos cursos de graduação em Análise, Topologia, Geometria... Esses valem
> em todos os tabuleiros porque estão todos em ZFC puro. É o básico...
>
> Então talvez nessa visão semantista, ZFC tem mais a cara de "o que é comum
> a todos os tabuleiros" do que uma lista de axiomas e a teoria
> correspondente.
>
> Eu, por exemplo, por minha área de atuação, normalmente trabalho
> diretamente em modelos onde a Hipótese do Continuo não vale (meus
> resultados, nem que seja por uma questão de contexto, fazem muito mais
> sentido se HC não vale - minha dissertação de mestrado começava com um
> diagrama com 6 cardinais entre aleph_1 e c (que agora são 5 depois do
> recente p = t, um salve a Malliaris e Shelah) os quais, se vale HC,
> colapsam tudo para um ponto só, de modo que minha dissertação de mestrado
> inteira teria falado todo o tempo sobre um cardinal só...).
>
> Mas veja, é aí que eu acho que o RUIM da sua mensagem não é tão ruim assim,
>
> Se alguém produz bons teoremas sobre o futebol suíço com 7 jogadores, pelo
> menos essa área do futebol fica mais compreendida, e não deixa de ser uma
> contribuição ao futebol como um todo que
> uma parte (consistente!) dele seja melhor compreendida - pois, tem mais
> essa também,
>
> "Se mostramos que algo que vale para o
> futebol suíço, então estamos mostrando que não existe nas regras algo que
> garanta que sua negação fosse válida em todos os tabuleiros"
>
> - ou seja, mesmo que indiretamente, olhando para as negações,trabalhar aí
> no futebol suíço fala sim sobre o jogo como um todo, vejam só!
>
> ... Sempre boas nossas conversas mesmo, valeu !
>
> Até mais,
>
> []s Samuel
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
> - Mensagem original -
> De: Daniel Durante 
> Para: LOGICA-L 
> Cc: samuel , Daniel Durante , Marcos
> Silva , pin...@googlegroups.com <
> logica-l@dimap.ufrn.br>, Grupo de pesquisa CLEA 
> Enviadas: Fri, 04 Aug 2023 20:36:43 -0300 (BRT)
> Assunto: Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas
>
> Salve Samuel,
>
> Obrigado pela paciente resposta, pelas explicações e referências. Você
> sempre me surpreende com suas respostas de matemático. Claro, o JOGO!! Eu
> aqui, com minha mentalidade de contabilista, só pensando em tabuleiros e
> regras e me esquecendo do JOGO. O jogo real, para o qual as regras apenas
> delimitam as possibilidades e os tabuleiros apenas registram as jogadas. A
> matemática não é nem as regras de ZFC nem os diferentes tabuleiros em que
> dá para jogar ZFC, é o jogo que se joga com essas regras nesses tabuleiros.
>
> Acho que o seu exemplo do futebol me ajudou a entender. Há o futebol de
> campo com as regras FIFA (11 jogadores por time, campo de um certo
> tamanho,
> determinado tempo de jogo...), há o futebol de salão (5 jogadores, quadra
> pequena, bola pequena, tempo de jogo reduzido...), há o futebol suíço (7
> jodadores, outras especificidades...). Na base dessas variações,
> compatível
> com todas elas, haveria uma concepção essencial do jogo de FUTEBOL (vou
> usar maíuscula para essa concepção essencial) que é compatível com todas
> as
> versões e variações do jogo.
>
> Esses futebois são incompatíveis uns com os outros em detalhes que a
> concepção essencial (o FUTEBOL) não decide: o número de jogadores o
> tamanho
> do campo, o tempo de jogo, o tamanho do gol, o peso da bola... O FUTEBOL é
> jogado em qualquer dessas versões, qualquer desses tabuleiros. Na sua
> metáfora, o FUTEBOL é o "jogo", e cada variação (futebol de campo, de
> praia, suíço, de salão,...) é um "tabuleiro" diferente do mesmo jogo. Acho
> que é isso né?!
>
> Quando você diz que a matemática é ZFC e que você não se importa muito com
> o fato de ZFC não decidir algumas coisas, tipo a hipótese do contínuo,
> você
> está querendo dizer que ZFC 

Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-05 Por tôpico Jorge Petrucio Viana
Oi Samuel,
pelo que vejo, esse seu raciocínio (letrinhas de contrato) vale para
qualquer outra formalização da matemática...
Por ele, eu concluo que para um matemático-padrão, o sistema
$\mathcal{L}^x$ usado for Tarski e Givant no seu livro "A formalization of
set theory without variables" é a medida do básico.
"Set theory" aqui não significa ZFC, mas qualquer sistema onde a existência
de "uma certa noção relaxada de par ordenado" é um (axioma ou) teorema.
Incluindo sistemas formulados na teoria das categorias e mais...

P

Em sáb., 5 de ago. de 2023 às 16:03, 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <
logica-l@dimap.ufrn.br> escreveu:

> Oi Petrucio,
>
> Da mesma forma que ninguém lê as letrinhas pequenas de nenhum contrato,
>
> O matemático establishment sabe (na maioria das vezes) que trabalha em
> ZFC, mesmo que só saiba dar como exemplo o Axioma da Escolha.
>
> (Muitos deles acham que a Hipótese do Continuo vale "na prática", mas isso
> é ainda outra história...)
>
> Sobre a coisa de ordem, pelo menos nisso o matemático establishment tem
> sorte, pois como os subconjuntos dos conjuntos são conjuntos, as
> (subfamilias das) famílias de subconjuntos são conjuntos, etc., dá pra
> fazer tudo em primeira ordem.
>
> Atés
>
> []s Samuel
> - Mensagem original -
> De: Jorge Petrucio Viana 
> Para: Samuel Gomes da Silva 
> Cc: Valeria de Paiva , Daniel Durante <
> durant...@gmail.com>, Marcos Silva ,
> pin...@googlegroups.com , Grupo de pesquisa CLEA <
> pina...@googlegroups.com>
> Enviadas: Sat, 05 Aug 2023 14:54:05 -0300 (BRT)
> Assunto: Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números
> e provas
>
> Boa tarde!
>
> Uma dúvida honesta (não é, simplesmente, uma provocação):
> O que vocês estão chamando de ZFC?
>
> Se for o que está, por exemplo, no livro do Devlin (ou seja, First Order
> Logic ZFC), não concordo que "para um matemático-padrão ZFC e' a medida, o
> básico" (ou algo semelhante).
>
> Pelo que vejo, matemáticos padrão trabalham, pelo menos, em terceira ordem
> e usam "naive set theory" (uma versão mais próxima de Cantor do que de
> Zermelo).
>
> Um adendo:
> Uma vez eu desafiei uma plateia de matemáticos (uns 40 mais ou menos) a
> listarem 3 (apenas 3) axiomas da Teoria dos Conjuntos.
> O máximo que consegui foi: Axioma da Escolha.
>
> P
>
> Em sáb., 5 de ago. de 2023 às 13:20, 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <
> logica-l@dimap.ufrn.br> escreveu:
>
> > Oi Valéria,
> >
> > Pois é, em ambiente de pesquisa eu concordo que a teoria básica é ZF
> > (ainda mais se a pesquisa é lógico orientada, digamos),
> >
> > Porém, porém, porém, para o tal matemático establishment que eu sempre
> > falo,
> >
> > O Axioma da Escolha está lá, mesmo que o matemático establishment não
> > perceba (porque muitas vezes ele usa o Axioma da Escolha sem perceber, é
> > preciso um certo "treino" e esforço pra ver quando o Axioma da Escolha
> foi
> > necessário ou não).
> >
> > Por exemplo: pra quem nunca pensou nisso, procure ver exatamente onde se
> > usa o Axioma da Escolha para mostrar que "a reunião enumeravel de
> > enumeraveis é enumeravel", é um uso um pouco sutil.
> >
> > Aí, nos livros de graduação em matemática, o Axioma da Escolha está lá
> > escondido. "Todo espaço vetorial tem base" - não só usa lá um Leminha de
> > Zorn na prova padrão, como foi mostrado que é uma equivalência do Axioma
> da
> > Escolha (Blass, 1984).
> >
> > Então, para o matemático establishment, acaba sendo ZFC sim.
> >
> > Abraços
> >
> > []s Samuel
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> > - Mensagem original -
> > De: Valeria de Paiva 
> > Para: Samuel Gomes da Silva 
> > Cc: Daniel Durante , Marcos Silva <
> > marcossilv...@gmail.com>, pin...@googlegroups.com <
> logica-l@dimap.ufrn.br>,
> > Grupo de pesquisa CLEA 
> > Enviadas: Sat, 05 Aug 2023 12:38:19 -0300 (BRT)
> > Assunto: Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos,
> números
> > e provas
> >
> > oi Samuel,
> > Desculpe, mas aqui eu vou dar meu pitaco de ignorante, porem convicta.
> > Eu concordo plenamente que para um matemático-padrão ZFC e' a medida, o
> > básico. MAS com o abaixo não concordo não.
> >
> > >Pelo Teorema da Completude, algo que provamos "ZFC puro" é válido em
> todos
> > os tabuleiros (e rec

Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-05 Por tôpico 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L
Oi Petrucio,

Da mesma forma que ninguém lê as letrinhas pequenas de nenhum contrato,

O matemático establishment sabe (na maioria das vezes) que trabalha em ZFC, 
mesmo que só saiba dar como exemplo o Axioma da Escolha.

(Muitos deles acham que a Hipótese do Continuo vale "na prática", mas isso é 
ainda outra história...)

Sobre a coisa de ordem, pelo menos nisso o matemático establishment tem sorte, 
pois como os subconjuntos dos conjuntos são conjuntos, as (subfamilias das) 
famílias de subconjuntos são conjuntos, etc., dá pra fazer tudo em primeira 
ordem.

Atés

[]s Samuel 
- Mensagem original -
De: Jorge Petrucio Viana 
Para: Samuel Gomes da Silva 
Cc: Valeria de Paiva , Daniel Durante 
, Marcos Silva , 
pin...@googlegroups.com , Grupo de pesquisa CLEA 

Enviadas: Sat, 05 Aug 2023 14:54:05 -0300 (BRT)
Assunto: Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e 
provas

Boa tarde!

Uma dúvida honesta (não é, simplesmente, uma provocação):
O que vocês estão chamando de ZFC?

Se for o que está, por exemplo, no livro do Devlin (ou seja, First Order
Logic ZFC), não concordo que "para um matemático-padrão ZFC e' a medida, o
básico" (ou algo semelhante).

Pelo que vejo, matemáticos padrão trabalham, pelo menos, em terceira ordem
e usam "naive set theory" (uma versão mais próxima de Cantor do que de
Zermelo).

Um adendo:
Uma vez eu desafiei uma plateia de matemáticos (uns 40 mais ou menos) a
listarem 3 (apenas 3) axiomas da Teoria dos Conjuntos.
O máximo que consegui foi: Axioma da Escolha.

P

Em sáb., 5 de ago. de 2023 às 13:20, 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <
logica-l@dimap.ufrn.br> escreveu:

> Oi Valéria,
>
> Pois é, em ambiente de pesquisa eu concordo que a teoria básica é ZF
> (ainda mais se a pesquisa é lógico orientada, digamos),
>
> Porém, porém, porém, para o tal matemático establishment que eu sempre
> falo,
>
> O Axioma da Escolha está lá, mesmo que o matemático establishment não
> perceba (porque muitas vezes ele usa o Axioma da Escolha sem perceber, é
> preciso um certo "treino" e esforço pra ver quando o Axioma da Escolha foi
> necessário ou não).
>
> Por exemplo: pra quem nunca pensou nisso, procure ver exatamente onde se
> usa o Axioma da Escolha para mostrar que "a reunião enumeravel de
> enumeraveis é enumeravel", é um uso um pouco sutil.
>
> Aí, nos livros de graduação em matemática, o Axioma da Escolha está lá
> escondido. "Todo espaço vetorial tem base" - não só usa lá um Leminha de
> Zorn na prova padrão, como foi mostrado que é uma equivalência do Axioma da
> Escolha (Blass, 1984).
>
> Então, para o matemático establishment, acaba sendo ZFC sim.
>
> Abraços
>
> []s Samuel
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
> - Mensagem original -
> De: Valeria de Paiva 
> Para: Samuel Gomes da Silva 
> Cc: Daniel Durante , Marcos Silva <
> marcossilv...@gmail.com>, pin...@googlegroups.com ,
> Grupo de pesquisa CLEA 
> Enviadas: Sat, 05 Aug 2023 12:38:19 -0300 (BRT)
> Assunto: Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números
> e provas
>
> oi Samuel,
> Desculpe, mas aqui eu vou dar meu pitaco de ignorante, porem convicta.
> Eu concordo plenamente que para um matemático-padrão ZFC e' a medida, o
> básico. MAS com o abaixo não concordo não.
>
> >Pelo Teorema da Completude, algo que provamos "ZFC puro" é válido em todos
> os tabuleiros (e reciprocamente).
> Nossos cursos de graduação em Análise, Topologia, Geometria... Esses valem
> em todos os tabuleiros porque estão todos em ZFC puro. É o básico...
> Então talvez nessa visão semantista, ZFC tem mais a cara de "o que é comum
> a todos os tabuleiros" do que uma lista de axiomas e a teoria
> correspondente.
>
> ZF e' básico, o C(choice) tem muita gente que não quer não, que prefere
> botar um asterisco numa prova qdo precisa de choice, pra alertar os
> distraídos. e o número dessas pessoas, que se preocupam com resultados mais
> construtivos, ou baseados em formulações alternativas de fundamentos e'
> cada vez maior. não sei se significativamente maior no "rank and file" dos
> matemáticos tradicionais, mas certamente bem maior nessa comunidade entre
> matemática e informática que diz q trabalha com ciência da computação.
>
> Tem muita gente, que nem você, cuja pesquisa só faz sentido se certas
> premissas tradicionais não valem: a maioria do pessoal de "teoria de tipos"
> se enquadra nessa. (pra não falar dos sub-estruturalistas!) E mesmo todo
> mundo nessa nova onda de 'Proof Assistants' pra uma nova matemática "(
>
> https://www.nytimes.com/2023/07/02/science/ai-mathematics-machine-learning.html
> )
>  faz parte da t

Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-05 Por tôpico Jorge Petrucio Viana
Boa tarde!

Uma dúvida honesta (não é, simplesmente, uma provocação):
O que vocês estão chamando de ZFC?

Se for o que está, por exemplo, no livro do Devlin (ou seja, First Order
Logic ZFC), não concordo que "para um matemático-padrão ZFC e' a medida, o
básico" (ou algo semelhante).

Pelo que vejo, matemáticos padrão trabalham, pelo menos, em terceira ordem
e usam "naive set theory" (uma versão mais próxima de Cantor do que de
Zermelo).

Um adendo:
Uma vez eu desafiei uma plateia de matemáticos (uns 40 mais ou menos) a
listarem 3 (apenas 3) axiomas da Teoria dos Conjuntos.
O máximo que consegui foi: Axioma da Escolha.

P

Em sáb., 5 de ago. de 2023 às 13:20, 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <
logica-l@dimap.ufrn.br> escreveu:

> Oi Valéria,
>
> Pois é, em ambiente de pesquisa eu concordo que a teoria básica é ZF
> (ainda mais se a pesquisa é lógico orientada, digamos),
>
> Porém, porém, porém, para o tal matemático establishment que eu sempre
> falo,
>
> O Axioma da Escolha está lá, mesmo que o matemático establishment não
> perceba (porque muitas vezes ele usa o Axioma da Escolha sem perceber, é
> preciso um certo "treino" e esforço pra ver quando o Axioma da Escolha foi
> necessário ou não).
>
> Por exemplo: pra quem nunca pensou nisso, procure ver exatamente onde se
> usa o Axioma da Escolha para mostrar que "a reunião enumeravel de
> enumeraveis é enumeravel", é um uso um pouco sutil.
>
> Aí, nos livros de graduação em matemática, o Axioma da Escolha está lá
> escondido. "Todo espaço vetorial tem base" - não só usa lá um Leminha de
> Zorn na prova padrão, como foi mostrado que é uma equivalência do Axioma da
> Escolha (Blass, 1984).
>
> Então, para o matemático establishment, acaba sendo ZFC sim.
>
> Abraços
>
> []s Samuel
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
> - Mensagem original -
> De: Valeria de Paiva 
> Para: Samuel Gomes da Silva 
> Cc: Daniel Durante , Marcos Silva <
> marcossilv...@gmail.com>, pin...@googlegroups.com ,
> Grupo de pesquisa CLEA 
> Enviadas: Sat, 05 Aug 2023 12:38:19 -0300 (BRT)
> Assunto: Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números
> e provas
>
> oi Samuel,
> Desculpe, mas aqui eu vou dar meu pitaco de ignorante, porem convicta.
> Eu concordo plenamente que para um matemático-padrão ZFC e' a medida, o
> básico. MAS com o abaixo não concordo não.
>
> >Pelo Teorema da Completude, algo que provamos "ZFC puro" é válido em todos
> os tabuleiros (e reciprocamente).
> Nossos cursos de graduação em Análise, Topologia, Geometria... Esses valem
> em todos os tabuleiros porque estão todos em ZFC puro. É o básico...
> Então talvez nessa visão semantista, ZFC tem mais a cara de "o que é comum
> a todos os tabuleiros" do que uma lista de axiomas e a teoria
> correspondente.
>
> ZF e' básico, o C(choice) tem muita gente que não quer não, que prefere
> botar um asterisco numa prova qdo precisa de choice, pra alertar os
> distraídos. e o número dessas pessoas, que se preocupam com resultados mais
> construtivos, ou baseados em formulações alternativas de fundamentos e'
> cada vez maior. não sei se significativamente maior no "rank and file" dos
> matemáticos tradicionais, mas certamente bem maior nessa comunidade entre
> matemática e informática que diz q trabalha com ciência da computação.
>
> Tem muita gente, que nem você, cuja pesquisa só faz sentido se certas
> premissas tradicionais não valem: a maioria do pessoal de "teoria de tipos"
> se enquadra nessa. (pra não falar dos sub-estruturalistas!) E mesmo todo
> mundo nessa nova onda de 'Proof Assistants' pra uma nova matemática "(
>
> https://www.nytimes.com/2023/07/02/science/ai-mathematics-machine-learning.html
> )
>  faz parte da turma.
>
> Então concordo sim que a matemática e' o jogo e não os tabuleiros ou os
> campos ou as regras, mas essa essência do jogo muda, se os jogadores
> mudarem.
>
> abraços,
> Valeria
>
> On Sat, Aug 5, 2023 at 5:23 AM 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <
> logica-l@dimap.ufrn.br> wrote:
>
> > Salve Daniel,
> >
> > Incrível como entre nós, brasileiros, o FUTEBOL consegue explicar tantas
> > coisas né?
> >
> > Você pegou a ideia, sim é isso mesmo.
> >
> > Matemática é um trabalho, e os ambientes de trabalho são os modelos... Os
> > matemáticos, somos jogadores profissionais de futebol (com o BOM e o RUIM
> > da sua mensagem, é a tal coisa da dor e a delícia de ser o que é...).
> >
> > Mas pra além daquele BOM e RUIM tem mais uma coisa: existem esses
> momentos
> > (e na verdade os matemático

Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-05 Por tôpico 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L
Oi Valéria,

Pois é, em ambiente de pesquisa eu concordo que a teoria básica é ZF (ainda 
mais se a pesquisa é lógico orientada, digamos),

Porém, porém, porém, para o tal matemático establishment que eu sempre falo,

O Axioma da Escolha está lá, mesmo que o matemático establishment não perceba 
(porque muitas vezes ele usa o Axioma da Escolha sem perceber, é preciso um 
certo "treino" e esforço pra ver quando o Axioma da Escolha foi necessário ou 
não).

Por exemplo: pra quem nunca pensou nisso, procure ver exatamente onde se usa o 
Axioma da Escolha para mostrar que "a reunião enumeravel de enumeraveis é 
enumeravel", é um uso um pouco sutil.

Aí, nos livros de graduação em matemática, o Axioma da Escolha está lá 
escondido. "Todo espaço vetorial tem base" - não só usa lá um Leminha de Zorn 
na prova padrão, como foi mostrado que é uma equivalência do Axioma da Escolha 
(Blass, 1984).

Então, para o matemático establishment, acaba sendo ZFC sim.

Abraços

[]s Samuel 




















- Mensagem original -
De: Valeria de Paiva 
Para: Samuel Gomes da Silva 
Cc: Daniel Durante , Marcos Silva 
, pin...@googlegroups.com , 
Grupo de pesquisa CLEA 
Enviadas: Sat, 05 Aug 2023 12:38:19 -0300 (BRT)
Assunto: Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e 
provas

oi Samuel,
Desculpe, mas aqui eu vou dar meu pitaco de ignorante, porem convicta.
Eu concordo plenamente que para um matemático-padrão ZFC e' a medida, o
básico. MAS com o abaixo não concordo não.

>Pelo Teorema da Completude, algo que provamos "ZFC puro" é válido em todos
os tabuleiros (e reciprocamente).
Nossos cursos de graduação em Análise, Topologia, Geometria... Esses valem
em todos os tabuleiros porque estão todos em ZFC puro. É o básico...
Então talvez nessa visão semantista, ZFC tem mais a cara de "o que é comum
a todos os tabuleiros" do que uma lista de axiomas e a teoria
correspondente.

ZF e' básico, o C(choice) tem muita gente que não quer não, que prefere
botar um asterisco numa prova qdo precisa de choice, pra alertar os
distraídos. e o número dessas pessoas, que se preocupam com resultados mais
construtivos, ou baseados em formulações alternativas de fundamentos e'
cada vez maior. não sei se significativamente maior no "rank and file" dos
matemáticos tradicionais, mas certamente bem maior nessa comunidade entre
matemática e informática que diz q trabalha com ciência da computação.

Tem muita gente, que nem você, cuja pesquisa só faz sentido se certas
premissas tradicionais não valem: a maioria do pessoal de "teoria de tipos"
se enquadra nessa. (pra não falar dos sub-estruturalistas!) E mesmo todo
mundo nessa nova onda de 'Proof Assistants' pra uma nova matemática "(
https://www.nytimes.com/2023/07/02/science/ai-mathematics-machine-learning.html
)
 faz parte da turma.

Então concordo sim que a matemática e' o jogo e não os tabuleiros ou os
campos ou as regras, mas essa essência do jogo muda, se os jogadores
mudarem.

abraços,
Valeria

On Sat, Aug 5, 2023 at 5:23 AM 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <
logica-l@dimap.ufrn.br> wrote:

> Salve Daniel,
>
> Incrível como entre nós, brasileiros, o FUTEBOL consegue explicar tantas
> coisas né?
>
> Você pegou a ideia, sim é isso mesmo.
>
> Matemática é um trabalho, e os ambientes de trabalho são os modelos... Os
> matemáticos, somos jogadores profissionais de futebol (com o BOM e o RUIM
> da sua mensagem, é a tal coisa da dor e a delícia de ser o que é...).
>
> Mas pra além daquele BOM e RUIM tem mais uma coisa: existem esses momentos
> (e na verdade os matemáticos fora da área de fundamentos sempre vivem esse
> tipo de momentos) nos quais o teorema que provamos vale em todos os
> tabuleiros, em todos os campos de jogo.
>
> Isso acontece quando provamos algo "ZFC puro", sem hipóteses adicionais.
>
> Pelo Teorema da Completude, algo que provamos "ZFC puro" é válido em todos
> os tabuleiros (e reciprocamente).
>
> Nossos cursos de graduação em Análise, Topologia, Geometria... Esses valem
> em todos os tabuleiros porque estão todos em ZFC puro. É o básico...
>
> Então talvez nessa visão semantista, ZFC tem mais a cara de "o que é comum
> a todos os tabuleiros" do que uma lista de axiomas e a teoria
> correspondente.
>
> Eu, por exemplo, por minha área de atuação, normalmente trabalho
> diretamente em modelos onde a Hipótese do Continuo não vale (meus
> resultados, nem que seja por uma questão de contexto, fazem muito mais
> sentido se HC não vale - minha dissertação de mestrado começava com um
> diagrama com 6 cardinais entre aleph_1 e c (que agora são 5 depois do
> recente p = t, um salve a Malliaris e Shelah) os quais, se vale HC,
> colapsam tudo para um ponto só, de modo que minha dissertação de mestrado
> inteira teria falado todo o tempo s

Re: [Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-05 Por tôpico Valeria de Paiva
oi Samuel,
Desculpe, mas aqui eu vou dar meu pitaco de ignorante, porem convicta.
Eu concordo plenamente que para um matemático-padrão ZFC e' a medida, o
básico. MAS com o abaixo não concordo não.

>Pelo Teorema da Completude, algo que provamos "ZFC puro" é válido em todos
os tabuleiros (e reciprocamente).
Nossos cursos de graduação em Análise, Topologia, Geometria... Esses valem
em todos os tabuleiros porque estão todos em ZFC puro. É o básico...
Então talvez nessa visão semantista, ZFC tem mais a cara de "o que é comum
a todos os tabuleiros" do que uma lista de axiomas e a teoria
correspondente.

ZF e' básico, o C(choice) tem muita gente que não quer não, que prefere
botar um asterisco numa prova qdo precisa de choice, pra alertar os
distraídos. e o número dessas pessoas, que se preocupam com resultados mais
construtivos, ou baseados em formulações alternativas de fundamentos e'
cada vez maior. não sei se significativamente maior no "rank and file" dos
matemáticos tradicionais, mas certamente bem maior nessa comunidade entre
matemática e informática que diz q trabalha com ciência da computação.

Tem muita gente, que nem você, cuja pesquisa só faz sentido se certas
premissas tradicionais não valem: a maioria do pessoal de "teoria de tipos"
se enquadra nessa. (pra não falar dos sub-estruturalistas!) E mesmo todo
mundo nessa nova onda de 'Proof Assistants' pra uma nova matemática "(
https://www.nytimes.com/2023/07/02/science/ai-mathematics-machine-learning.html
)
 faz parte da turma.

Então concordo sim que a matemática e' o jogo e não os tabuleiros ou os
campos ou as regras, mas essa essência do jogo muda, se os jogadores
mudarem.

abraços,
Valeria

On Sat, Aug 5, 2023 at 5:23 AM 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <
logica-l@dimap.ufrn.br> wrote:

> Salve Daniel,
>
> Incrível como entre nós, brasileiros, o FUTEBOL consegue explicar tantas
> coisas né?
>
> Você pegou a ideia, sim é isso mesmo.
>
> Matemática é um trabalho, e os ambientes de trabalho são os modelos... Os
> matemáticos, somos jogadores profissionais de futebol (com o BOM e o RUIM
> da sua mensagem, é a tal coisa da dor e a delícia de ser o que é...).
>
> Mas pra além daquele BOM e RUIM tem mais uma coisa: existem esses momentos
> (e na verdade os matemáticos fora da área de fundamentos sempre vivem esse
> tipo de momentos) nos quais o teorema que provamos vale em todos os
> tabuleiros, em todos os campos de jogo.
>
> Isso acontece quando provamos algo "ZFC puro", sem hipóteses adicionais.
>
> Pelo Teorema da Completude, algo que provamos "ZFC puro" é válido em todos
> os tabuleiros (e reciprocamente).
>
> Nossos cursos de graduação em Análise, Topologia, Geometria... Esses valem
> em todos os tabuleiros porque estão todos em ZFC puro. É o básico...
>
> Então talvez nessa visão semantista, ZFC tem mais a cara de "o que é comum
> a todos os tabuleiros" do que uma lista de axiomas e a teoria
> correspondente.
>
> Eu, por exemplo, por minha área de atuação, normalmente trabalho
> diretamente em modelos onde a Hipótese do Continuo não vale (meus
> resultados, nem que seja por uma questão de contexto, fazem muito mais
> sentido se HC não vale - minha dissertação de mestrado começava com um
> diagrama com 6 cardinais entre aleph_1 e c (que agora são 5 depois do
> recente p = t, um salve a Malliaris e Shelah) os quais, se vale HC,
> colapsam tudo para um ponto só, de modo que minha dissertação de mestrado
> inteira teria falado todo o tempo sobre um cardinal só...).
>
> Mas veja, é aí que eu acho que o RUIM da sua mensagem não é tão ruim assim,
>
> Se alguém produz bons teoremas sobre o futebol suíço com 7 jogadores, pelo
> menos essa área do futebol fica mais compreendida, e não deixa de ser uma
> contribuição ao futebol como um todo que
> uma parte (consistente!) dele seja melhor compreendida - pois, tem mais
> essa também,
>
> "Se mostramos que algo que vale para o
> futebol suíço, então estamos mostrando que não existe nas regras algo que
> garanta que sua negação fosse válida em todos os tabuleiros"
>
> - ou seja, mesmo que indiretamente, olhando para as negações,trabalhar aí
> no futebol suíço fala sim sobre o jogo como um todo, vejam só!
>
> ... Sempre boas nossas conversas mesmo, valeu !
>
> Até mais,
>
> []s Samuel
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
> - Mensagem original -
> De: Daniel Durante 
> Para: LOGICA-L 
> Cc: samuel , Daniel Durante , Marcos
> Silva , pin...@googlegroups.com <
> logica-l@dimap.ufrn.br>, Grupo de pesquisa CLEA 
> Enviadas: Fri, 04 Aug 2023 20:36:43 -0300 (BRT)
> Assunto: Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas
>
> Salve Samuel,
>
> Obrigado pela paciente resposta, pelas explicações e referências. Você
> sempre me surpreende com suas respostas de matemático. Claro, o JOGO!! Eu
> aqui, com minha mentalidade de contabilista, só pensando em tabuleiros e
> regras e me esquecendo do JOGO. O jogo real, para o qual as 

[Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-05 Por tôpico Daniel Durante
> "Se mostramos que algo que vale para o 
> futebol suíço, então estamos mostrando que não existe nas regras algo que 
> garanta que sua negação fosse válida em todos os tabuleiros"
> 
> - ou seja, mesmo que indiretamente, olhando para as negações,trabalhar aí no 
> futebol suíço fala sim sobre o jogo como um todo, vejam só!

Perfeito, Samuel! Você me convenceu. O aspecto bom é mesmo muito bom e o ruim, 
ainda que exista, não é tão ruim assim. De novo eu estava olhando a coisa por 
uma janelinha menor do que a sua varanda panorâmica!

Abraços,
Daniel.

-- 
LOGICA-L
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[Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-04 Por tôpico Daniel Durante
Salve Samuel,

Obrigado pela paciente resposta, pelas explicações e referências. Você 
sempre me surpreende com suas respostas de matemático. Claro, o JOGO!! Eu 
aqui, com minha mentalidade de contabilista, só pensando em tabuleiros e 
regras e me esquecendo do JOGO. O jogo real, para o qual as regras apenas 
delimitam as possibilidades e os tabuleiros apenas registram as jogadas. A 
matemática não é nem as regras de ZFC nem os diferentes tabuleiros em que 
dá para jogar ZFC, é o jogo que se joga com essas regras nesses tabuleiros.

Acho que o seu exemplo do futebol me ajudou a entender. Há o futebol de 
campo com as regras FIFA (11 jogadores por time, campo de um certo tamanho, 
determinado tempo de jogo...), há o futebol de salão (5 jogadores, quadra 
pequena, bola pequena, tempo de jogo reduzido...), há o futebol suíço (7 
jodadores, outras especificidades...). Na base dessas variações, compatível 
com todas elas, haveria uma concepção essencial do jogo de FUTEBOL (vou 
usar maíuscula para essa concepção essencial) que é compatível com todas as 
versões e variações do jogo.

Esses futebois são incompatíveis uns com os outros em detalhes que a 
concepção essencial (o FUTEBOL) não decide: o número de jogadores o tamanho 
do campo, o tempo de jogo, o tamanho do gol, o peso da bola... O FUTEBOL é 
jogado em qualquer dessas versões, qualquer desses tabuleiros. Na sua 
metáfora, o FUTEBOL é o "jogo", e cada variação (futebol de campo, de 
praia, suíço, de salão,...) é um "tabuleiro" diferente do mesmo jogo. Acho 
que é isso né?!

Quando você diz que a matemática é ZFC e que você não se importa muito com 
o fato de ZFC não decidir algumas coisas, tipo a hipótese do contínuo, você 
está querendo dizer que ZFC não se interessa em estipular a cardinalidade 
do contínuo tanto quanto o FUTEBOL não se interessa em estipular o número 
de jogadores de cada time. Seja com 11 ou com 7 jogadores, ainda é FUTEBOL. 
Seja qual for a cardinalidade do contínuo, ainda é ZFC, ainda é matemática.

Então, os axiomas de ZFC seriam como aquelas regras fundamentais 
compatíveis com todos os futebóis. E por isso, eles não decidem algumas 
minúcias. Eles admitem variações. Já a hipótese do contínuo seria como a 
regra que diz o número de jogadores. Pode ser diferente para versões 
diferentes.

Ok. Isso é bem interessante mesmo. Nunca tinha pensado assim. Mas tem uma 
coisa. Quando a gente tira par ou impar e vai jogar de verdade, a gente 
SEMPRE vai ter que ESCOLHER alguma dessas variantes que decidem as coisas 
que o FUTEBOL não decide. A flexibilidade (o inacabamento) do FUTEBOL cobra 
um preço. Ninguém, nunca, jamais joga SÓ FUTEBOL. A gente sempre joga 
alguma versão do FUTEBOL. Mesmo em uma pelada de rua onde se inventa regras 
na hora.

Se você acha que a matemática é ZFC e aceita que ZFC não decide algumas 
coisas. Então eu acho que você está se comprometendo com o seguinte fato:

(*) Tanto quanto não dá para jogar só FUTEBOL, não dá para fazer só 
matemática (jogar só ZFC). Sempre que a gente usar ZFC, a gente precisa 
também complementar as suas aberturas. 

Por que? Porque se estamos em uma abordagem ortodoxa, que assume a lógica 
clássica, a verdade como correspondência, e trata ZFC como uma teoria de 
primeira ordem, então:

(1) Sendo HC (a hipótese do contínuo) uma sentença de primeira ordem 
fechada, HC é ou verdadeira ou falsa, não há outra opção.

(2) Dizer que HC é verdadeira é dizer que a sentença que exprime HC 
corresponde aos fatos, e dizer que HC é falsa, é dizer que a sentença que a 
exprime não corresponde aos fatos.

(3) Mas quais são esses fatos? Você mesmo disse que ZFC não tem um modelo 
canônico. Cada interpretação que verifica todos os axiomas de ZFC é um 
"tabuleiro", uma versão do jogo ZFC que decide as coisas que ZFC não 
decide. Fecha suas aberturas.

(4) Isso significa que sem ser heterodoxo (sem abandonar a lógica clássica, 
ou a verdade como correspondência) ninguém nunca joga só ZFC. A gente 
sempre ESCOLHE alguma versão de ZFC para jogar. Porque em qualquer contexto 
em que ocorra a sentença que exprime a hipótese do contínuo, esta sentença 
estará vinculada a alguma interpretação específica que faz o que ZFC se 
nega: decide se esta sentença é verdadeira ou falsa.


Eu acho isso bom e ruim:

- É BOM, porque coloca lá dentro da matemática a possibilidade de escolha, 
a liberdade. E quem é que não gosta de escolha e liberdade?

- Mas é RUIM, porque onde há escolha e liberdade, sempre há também limites. 
Cada vez que a gente "joga" matemática e tem que complementar as aberturas 
de ZFC com nossas escolhas, a gente, junto com isso, delimita e restringe 
nossos resultados ao alcance das escolhas que fizemos. E assim a gente 
diminui a generalidade da matemática.

Mais uma vez, obrigado pelo papo. Adoro conversar com você sobre essas 
coisas que entendo muito pouco. Suas respostas quase sempre apontam para 
algum lado que eu nunca tinha olhado.

Saudações,
Daniel.

Em sexta-feira, 4 de agosto de 2023 

[Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-04 Por tôpico 'samuel' via LOGICA-L
Salve Daniel, prazer falar com você, como sempre também, e pelo visto se 
você estivesse na live ela não terminaria pois seus
questionamentos são bastante interessantes e a coisa iria embora no 
tempo... 

Primeiro, registrar que "o meu amigo de Brasília" já me deu bronca dizendo 
que não era exatamente aquilo que ele me disse
anteriormente, hahaha, 

Então, eu desde o final do meu doutorado (2004), início da minha carreira 
na UFBA (2006), tenho essa visão da matemática que eu falei na live
(eu lembro que no começo do mestrado eu pensava diferentemente, de modo 
bastante mais ingênuo),

E tenho primeiramente que dizer: eu não me coloco como "o porta-voz de como 
os matemáticos pensam", e nem "de como os teoristas de conjuntos pensam", 
quase tudo que eu coloquei na live são visões "personalíssimas" (pra usar 
essa palavra que está na moda...) minhas. E sim, ter uma visão
pessoal ajuda a passear por esse ambiente cheio de ovos no chão - mas, uma 
coisa eu posso dizer, eu como matemático vindo da Lógica
e ativo na comunidade brasileira de Lógica e tendo por isso bastante 
contato com a Filosofia, o matemático padrão, "establishment", não
tem essas preocupações com fundação da matemática não e, mais importante, 
em geral o matemático padrão não é chamado a se posicionar
"filosoficamente" sobre sua epistemologia própria do que seja a matemática, 
isso eu sempre faço por questão por gostar mesmo desse tipo
de discussão (sempre gostei, talvez por isso enveredei pela Teoria dos 
Conjuntos...)  e por minha atuação dentro da lógica como um todo. 

Então vamos lá: tem uma frase que eu gosto muito que é "eu sou eu e minhas 
circunstâncias" (que acabei de colocar no Google aqui, não conhecia
o autor e não sei qual a teoria na qual ela se coloca, então não posso nem 
comprar nem vender essa teoria na sua completude...), mas é uma frase que 
eu gosto.

Pra mim, matemática é meio assim: é ela e suas circunstâncias...

Aí, por facilidade mesmo (o que concordo que alguém pode achar que é 
"preguiça ou covardia", touché), eu coloco: matemática é ZFC. 

Na minha analogia com tabuleiros, matemática é O JOGO, o qual pode ser 
jogado EM QUALQUER TABULEIRO QUE NÃO VIOLE AS
REGRAS. 

Aí, quando eu digo que sou semantista, pra mim não tem existe contradição 
nisso porque porque, exatamente por gostar muito de resultados de 
consistência, qualquer coisa que não leve a contradição TERÁ O SEU 
TABULEIRO ESPECÍFICO ONDE ELA VALE (e aí nesse caso a noção de "verdade" é
mais de "ser válido em algum modelo" - o que, pelo Teorema de Completude, 
equivale a não levar a contradição...). É nessa pegada que eu digo
que sou semantista. Se vale em algum modelo, eu considero DO JOGO. 

Essa coisa do JOGO, a gente pode pensar também em O ESPORTE.

Futebol é um ESPORTE, e que é jogado em todo o mundo, alguns lugares na 
areia, alguns lugares na grama, alguns lugares na grama
sintética (para desespero do Zico), em alguns lugares a trave é de madeira, 
noutros lugares não tem trave e a gente coloca duas
pedras no chão onde a bola tem que passar... Mas tudo isso é FUTEBOL. 

E o FUTEBOL existe como jogo, e pode ser jogado EM MUITOS AMBIENTES - cada 
quadra/campinho de futebol pelo mundo seria UM MODELO. 

Em todas essas instanciações do jogo, eu não posso pegar a bola com a mão. 
"Não pegar a bola com a mão" é um axioma. É da base
da teoria. Isso vai valer EM TODOS OS AMBIENTES. (Seria o "ZFC absoluto", 
algo que, como consequência sintática de ZFC, é 
também consequência semântica e valeria em todos os ambientes... Tem muito 
do Teorema de Completude embutido aí no que
estou dizendo, como podem perceber...)

Se a gente levasse a ferro e fogo e quisesse que O FUTEBOL DECIDISSE TUDO, 
que a REGRA FOSSE ATÉ OS ÚLTIMOS DETALHES, a gente acabaria chegando na 
conclusão que "o futebol só pode ser jogado com essa bola, por estes 
jogadores e no maravilhoso estádio monumental de Wembley,
na Inglaterra, onde o jogo foi criado"... Isso seria meio reducionista, não 
?

Então pra mim A MATEMÁTICA É O ESPORTE... Onde ele puder ser jogado sem 
violar as regras básicas, "é do jogo". Mesmo que
esse jogo não me diga exatamente qual é o tamanho da reta... 

Aí a coisa da Hipótese do Contínuo que você disse, só aí já teríamos uma 
quantidade "do tamanho do universo" de matemáticas
possíveis se pensarmos no tamanho da reta ("o continuum"): por um resultado 
de Easton, "o contínuo pode ser tudo o que ele pode ser", no sentido
de que a única restrição é que o tamanho da reta não pode ter cofinalidade 
enumerável. Nesse sentido, começando com um modelo
da Hipótese Generalizada do Contínuo de "ground model", a gente pode fazer 
um forcing até que simples (um forcing pra cada valor
que eu queira, no caso) e fazer com que o contínuo seja aleph_2, ou 
aleph_3, ou aleph_4, ou aleph_{omega + 1} - aleph_omega não
pode ser pela questão da cofinalidade -, e a quantidade de ordinais de 
cofinalidade não enumerável é a mesma quantidade de ordinais
que é a mesma quantidade de 

[Logica-l] Re: Coletivo Lógica Viva: sobre infinitos, números e provas

2023-08-03 Por tôpico Daniel Durante
 

Grandes Samuel, Marcos Silva e Colegas,


Parabéns pela conversa de bar online, Samuel e Marcos. Ouvir o Samuel é 
sempre um grande prazer, e ouvi-lo respondendo as perguntas perspicazes do 
Marcos Silva é muito melhor. Pena que perdi ao vivo. Adorei o papo. Ouvi 
hoje.


Tá aqui o link para quem quiser assistir. Recomendo:

https://www.youtube.com/live/fHihPJqhsfA?feature=share


Deixa eu fazer uma pergunta, Samuel. Quando você diz, meio provocativo, que 
a matemática é ZFC ( ou a TC) o que você quer dizer com isso?


Você quer dizer que a matemática é UM dos tabuleiros (ou modelos) onde as 
regras de ZFC se aplicam?


Ou você quer dizer que a matemática é a própria ZFC (as regras)?


Acho que é o primeiro caso. Afinal, você é um matemático, não um lógico, ou 
um computeiro, ou um filósofo que não entende nada de matemática (como eu).


Mas você, num dado  momento, disse que o pessoal da Teoria de Conjuntos —  
incluindo você mesmo — costuma se ver como semantista e, questionado pelo 
Marcos, você disse algo que eu entendi como afirmando que ser um semantista 
significa privilegiar as estruturas nas quais as regras se aplicam, e não 
as próprias regras.


Mas aí eu fico confuso, Samuel. Porque se a matemática é ZFC e se você é um 
semantista, então a matemática é o tabuleiro onde ZFC pode ser jogada, e 
não as regras do jogo ZFC.


Mas se ZFC não decide sentenças fechadas de sua linguagem, tal como a 
hipótese do contínuo, então as regras de ZFC não determinam univocamente o 
tabuleiro onde ela pode ser jogada. E então, há muitas matemáticas. Cada 
tabuleiro diferente em que ZFC pode ser jogada é uma matemática diferente.


E sabemos que alguns desses tabuleiros são ESSENCIALMENTE diferentes, ou 
seja, que não são isomórficos, porque sabemos que alguns deles são 
compatíveis com a hipótese do contínuo enquanto outros são incompatíveis 
com a hipótese do contínuo (compatíveis com sua negação).


Mas se você é um semantista, com tendência realista, isso me parece uma 
posição bem estranha. Você seria um pluralista matemático. 


Me parece que você se compromete com a seguinte concepção: “não é que 
existe uma realidade matemática objetiva e independente da mente. Na 
verdade existem pelo menos duas. “


Talvez existam muitas. Você diz que gosta de resultados de independência. 
Então talvez saiba se existe alguma sentença fechada S da linguagem de ZFC 
que é independente tanto de  (ZFC + HC) quanto de (ZFC + ¬HC)? Se houver, 
então já teríamos pelo menos 4 matemáticas — 4 tabuleiros não isomórficos 
para ZFC. Talvez haja infinitas matemáticas?


Mas, para além de 1, a quantidade não importa. Este caso me parece 
contradizer o famoso ditado. Dois não é bom. Dois já é demais.


Eu, que entendo quase nada de TC, prefiro interpretar os resultados de 
independência como provas de "inacabamento" da teoria -- inacabamento para  
não falar incompletude, já que você mesmo disse que não há uma 
interpretação canônica para ZFC.


Os caras não terminaram a teoria. Faltam axiomas. Eu concordo com “seu 
amigo de Brasília” que é um absurdo ZFC não decidir a hipótese do contínuo.


Isso só pode ser preguiça ou covardia dos matemáticos  

Façam aí uma convenção internacional e decidam. Você disse, ou pelo menos 
foi assim que eu entendi o que você disse, que nos tabuleiros mais quentes 
do momento, aqueles que parecem mais promissores, com mais aplicações e 
conexões, a hipótese do contínuo é falsa. Pois então, decidam aí entre os 
notáveis, ou em uma votação democrática (não, matematicocrática) que só são 
aceitáveis tabuleiros isomórficos incompatíveis com a hipótese do contínuo. 
Declarem os demais ilegais e aceitem a inscrição da negação da hipótese do 
contínuo no clube dos  axiomas.


É tipo o que fizeram com Plutão. O pobre foi expulso do clube dos planetas 
e, que eu saiba, nada aconteceu em Plutão para justificar a expulsão. O que 
os astrônomos fizeram foi complementar com  novas cláusulas as regras de 
admissão no clube dos planetas mesmo. Dizem que depois Plutão foi 
readmitido com ressalvas… não sei, parei de acompanhar.


Por que os matemáticos não fazem isso? Por que eles não admitem que ZFC 
está inacabada e declaram a Hipótese do Contínuo ou sua negação como 
axioma? Acho que é porque quase todos eles são, assim como você, 
semantistas. Um axioma é apenas uma descrição linguística desengonçada, 
feia, formal de um aspecto  da realidade matemática abstrata objetiva, 
bela, harmônica e perfeita.


Primeiro viria o tabuleiro, a realidade matemática, depois as regras, as 
teorias matemáticas. Só dá para acabar (ou incrementar) ZFC depois de saber 
com qual das duas sentenças, HC ou ¬HC o tabuleiro é compatível. Mas, como 
tem mais de um tabuleiro, alguns compatíveis com HC outros com ¬HC, e 
nenhum deles é considerado canônico, os matemáticos ficam paralisados e não 
decidem a questão.


Eu entendo e admiro esta postura dos matemáticos. Eles são como músicos que 
tiram as harmonias de ouvido, que têm