Oi gente,

Sim, mesmo que o matemático establishment faça aquela escolha sobre 
"estar"/"pode ser"/"deve ser" do prefácio do Enderton, pra a maioria isso é só 
um xiszinho numa resposta que ele não está interessado na pergunta, é isso 
mesmo. Acho que eu falei isso na live também.

Abraços

[]s Samuel 
----- Mensagem original -----
De: Daniel Durante <durant...@gmail.com>
Para: LOGICA-L <logica-l@dimap.ufrn.br>
Cc: Daniel Durante <durant...@gmail.com>, jmstern <jmst...@hotmail.com>, 
LOGICA-L <logica-l@dimap.ufrn.br>, marciopalmares <marciopalma...@gmail.com>, 
Petrucio Viana <petrucio_vi...@id.uff.br>, Marcos Silva 
<marcossilv...@gmail.com>, Grupo de pesquisa CLEA <pina...@googlegroups.com>, 
valeria.depaiva <valeria.depa...@gmail.com>, Cassiano Terra Rodrigues 
<cassiano.te...@gmail.com>, samuel <sam...@ufba.br>
Enviadas: Tue, 08 Aug 2023 09:45:55 -0300 (BRT)
Assunto: Re: ao

Ah! Faltou dizer que uma boa crônica não só ajuda a gente a entender o 
mundo, como talvez até a melhorá-lo. ??

Em terça-feira, 8 de agosto de 2023 às 09:27:07 UTC-3, Daniel Durante 
escreveu:

> Concordo com você, Julio. Os lógicos e o pessoal dos fundamentos não são 
> legisladores e nem juízes da matemática. São apenas cronistas.
>
> Saudações,
> Daniel.
>
> Em terça-feira, 8 de agosto de 2023 às 07:54:10 UTC-3, jmstern escreveu:
>
>> > "Todo matemático, em geral, escolhe uma das seguintes alternativas: 
>> > A matemática está inteiramente internalizada na Teoria dos Conjuntos;
>> > A matemática pode ser inteiramente internalizada na Teoria dos 
>> Conjuntos;
>> > A matemática deve ser inteiramente internalizada na Teoria dos 
>> Conjuntos" 
>>
>> Car(a/o)s: 
>> Permitam-me apresenta uma visao alternativa: 
>>
>> -- A maioria dos matematicos, simplesmente Nao esta interessada nesta 
>> questao. 
>> Esta questao eh pertinente para -- Fundamentos da Matematica -- , 
>> uma Area Especifica muito interessante, para uma minoria que gosta do 
>> assunto,   
>> mas provavelmente desnecessaria para o trabalho da maioria dos 
>> matematicos.  
>>   
>> Reproduzo a seguir um pequeno trecho do artigo: 
>>  
>> Julio Michael Stern (2020). Prof. Carlos Edgard Harle: Boas Lembranças e 
>> Sábias Lições. Revista Matematica Universitária, 2020, 2, 56-61. 
>> <https://www.ime.usp.br/~jmstern/wp-content/uploads/2020/12/Ste20RMU.pdf>
>>  doi: 10.21711/26755254/rmu202025 
>> <https://doi.org/10.21711/26755254/rmu202025>
>>  
>> ------------------------------------
>>
>> 2.3.  [Terceira Licao:] 
>> Em engenharia, a construção de uma casa começa pelo trabalho nos 
>> fundamentos. 
>> Em matemática, os fundamentos são feitos no final, para suportar a casa 
>> que já temos! 
>>    
>> Enquanto fazia meu mestrado, tive notícia de uma suposta prova topológica 
>> de inconsistência de ZFC (a teoria de conjuntos de Zermelo–Fraenkel 
>> acrescida pelo Axioma da Escolha), uma ferramenta padrão de fundamentos da 
>> matemática. Lá fui eu, muito preocupado, conversar a respeito com meu 
>> orientador. 
>> O Harle logo me tranquilizou, explicando que, verdadeira ou não, a 
>> notícia pouco impacto teria sobre nosso trabalho em geometria [Lorentziana/ 
>> Riemanniana]. 
>> Para o Harle, o papel da geometria seria o de tratar racional e 
>> sistematicamente uma classe de problemas que se nos apresentam no mundo em 
>> que vivemos; situação semelhante à de outras disciplinas científicas ou 
>> especialidades da matemática. 
>>
>> Na visão do Harle, o papel da área de fundamentos seria o de prover uma 
>> base comum que atendesse às necessidades de um programa avançado e 
>> abrangente de axiomatização de todas estas disciplinas. 
>> Tal programa seria altamente meritório; todavia, eu deveria ter sempre em 
>> mente a terceira lição, como acima enunciada. 
>>
>> Muito mais tarde na vida, encontrei uma perspectiva (em minha visão) 
>> semelhante, na citação seguinte atribuída a Kurt Gödel, vide Mehlberg 
>> (1962, p.86), Lakatos(1978, p.27) e Stern (2011, p.645-647). Mais uma vez, 
>> esta lição, que aprendi com o Harle, sobre o papel que cabe em ciências 
>> exatas a seus fundamentos axiomáticos, veio a influenciar 
>> significativamente meu trabalho futuro. 
>>
>> [...] o papel das assim chamadas ‘fundações’ é comparável à função 
>> exercida, nas teorias físicas, por hipóteses explicativas. [...] A real 
>> função dos axiomas é a de explicar os fenômenos descritos pelos teoremas 
>> deste sistema, e não o de prover uma genuína ‘fundação’ para estes 
>> teoremas. (Kurt Gödel) 
>>    
>> --------------------------------------
>>
>> No artigo seguinte, faco uma analise mais detalhada desta (minha?) visao 
>> "empiricista" da matematica:  
>>
>> Julio Michael Stern (2011). Constructive Verification, Empirical 
>> Induction, and Falibilist Deduction: A Threefold Contrast.  *Information*,  
>> 2, 4, 635-650. 
>> <https://www.ime.usp.br/~jmstern/wp-content/uploads/2020/10/Ste11Axi.pdf>  
>> doi:10.3390/info2040635 <http://doi.org/10.3390/info2040635> 
>>
>> Como referencia fundamentais (pun intended) para esta posicao, cito: 
>>
>> Arpad Szabo (1978). The Beginnings of Greek Mathematics; Akademiai 
>> Kiado:  Budapest, Hungary.  
>>
>> Imre Lakatos, J. Worall, E. Zahar, eds. (1976). Proofs and Refutations: 
>> The Logic of Mathematical Discovery;  Cambridge University Press: 
>> Cambridge, UK. 
>>
>> Imre Lakatos (1978). Philosophical Papers. V.1 -- The Methodology of 
>> Scientific Research Programmes. V.2. -- Mathematics, Science, and 
>> Epistemology. Cambridge University Press: Cambridge, UK. 
>>
>> ------------------------------------------ 
>>
>> Notem ainda que Logica tem varios papeis relevantes nesta discussao. 
>>
>> - Um papel, aceito e tradicional, da Logica e teoria dos conjuntos eh 
>> justamente o de construir ferramentas para Fundamentos Axiomaticos da 
>> Matematica, sendo ZFC o paradigma mais conhecido. 
>>
>> Outros papeis relevantes (na minha opiniao) da Logica seriam os de: 
>>
>> > Estudar os processos -- Indutivos -- (sim, sim; Indutivos, nao 
>> dedutivos!) que levam a abstracao de estruturas matematicas a partir da 
>> formalizacao de teorias Fisicas (ou em outras ciencias empiricas), e 
>>  
>> > Estudar a melhor forma de construir e oganizar Ontologias da (ou de 
>> partes da) Matematica e a melhor forma para sua  insercao nas ou 
>> interacao com as ontologias de ciencias empiricas.       
>>  
>> Tudo de bom, 
>> ---Julio Stern 
>>     
>>
>> ------------------------------
>> *From:* 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <logi...@dimap.ufrn.br>
>> *Sent:* Monday, August 7, 2023 5:45 PM
>> *To:* Daniel Durante <dura...@gmail.com>
>> *Cc:* LOGICA-L <logi...@dimap.ufrn.br>; marciopalmares <
>> marciop...@gmail.com>; LOGICA-L <logi...@dimap.ufrn.br>; Petrucio Viana <
>> petruci...@id.uff.br>; Marcos Silva <marcos...@gmail.com>; Grupo de 
>> pesquisa CLEA <pin...@googlegroups.com>; valeria.depaiva <
>> valeria...@gmail.com>; Cassiano Terra Rodrigues <cassian...@gmail.com>
>> *Subject:* [Logica-l] Re: ao 
>>  
>> Caros,
>>
>> A mensagem do Cassiano eu preciso digerir mais, hehe,
>>
>> Daniel, sua analogia com "geometria é álgebra" é pertinente sim,
>>
>> E na verdade me lembrou do prefácio de um excelente livro de graduação de 
>> Teoria dos Conjuntos, o do Enderton: se não me falha a memória, vai na 
>> seguinte linha:
>>
>> "Todo matemático, em geral, escolhe uma das seguintes alternativas:
>>
>> A matemática está inteiramente internalizada na Teoria dos Conjuntos;
>>
>> A matemática pode ser inteiramente internalizada na Teoria dos Conjuntos;
>>
>> A matemática deve ser inteiramente internalizada na Teoria dos Conjuntos"
>>
>> Apesar do que alguém poderia pensar, mesmo com o meu "matemática é ZFC", 
>> eu tendo a pensar mais pela segunda alternativa, talvez nesse espírito de 
>> "ambiente de trabalho".
>>
>> (E como pintura do cachimbo, claro...)
>>
>> Abraços
>>
>> []s Samuel 
>>
>> PS: Ah sim, isso de "geometria é álgebra"
>> tem a haver com a internalização da geometria dentro da álgebra, aí da 
>> mesma forma a pessoa pode decidir entre "está", "pode ser", "deve ser"...
>>
>>
>>
>>
>>
>>  
>>
>>
>>
>>
>>
>>
>>
>>
>>
>>
>>
>> ----- Mensagem original -----
>> De: Daniel Durante <dura...@gmail.com>
>> Para: LOGICA-L <logi...@dimap.ufrn.br>
>> Cc: marciopalmares <marciop...@gmail.com>, LOGICA-L <
>> logi...@dimap.ufrn.br>, samuel <sam...@ufba.br>, Petrucio Viana <
>> petruci...@id.uff.br>, Daniel Durante <dura...@gmail.com>, Marcos Silva <
>> marcos...@gmail.com>, Grupo de pesquisa CLEA <pin...@googlegroups.com>, 
>> valeria.depaiva <valeria...@gmail.com>, Cassiano Terra Rodrigues <
>> cassian...@gmail.com>
>> Enviadas: Mon, 07 Aug 2023 10:41:05 -0300 (BRT)
>> Assunto: Re: ao
>>
>> Oi Marcio e colegas,
>>
>> Eu acho, Marcio, que quando Samuel fala que a matemática é ZFC, ele não 
>> está querendo dizer isso literalmente, no sentido de que os números são 
>> certos conjuntos e que as funções são conjuntos de pares com certas 
>> propriedades,... Ele está falando de um jeito menos literal. Os números 
>> são 
>> qualquer coisa que se comporte como aqueles conjuntos se comportam em ZFC 
>> e 
>> as funções são qualquer coisa que se comporte como aqueles conjuntos de 
>> pares se comportam em ZFC.
>>
>> Porque veja, junto com dizer que a matemática é ZFC ele diz também que 
>> ZFC 
>> não tem modelo canônico e que a matemática não são nem as regras do jogo, 
>> nem os diversos tabuleiros onde o jogo é jogado - nem os axiomas de ZFC, 
>> nem seus muitos modelos.
>>
>> A matemática não é a formalização de ZFC e também não é cada uma das 
>> possíveis estruturas que verificam os axiomas. A matemática seria aquilo 
>> que todas as estruturas que verificam os axiomas têm em comum.
>>
>> Aí, cabe tanto os matemáticos contemporâneos que nem sabem quais são os 
>> axiomas de ZFC, mas que os respeitam, porque vivem em (jogam) versões 
>> desse 
>> jogo, ainda que talvez nem saibam disso. E cabe também, em certo sentido, 
>> os matemáticos do passado que também jogavam versões desse jogo sem saber.
>>
>> Talvez, se a gente procurar na história, a gente encontre os momentos em 
>> que as regras do jogo foram se estabelecendo, e o jogo foi sendo 
>> consolidado. Nessa visão dá para entender até o protesto de Valéria, por 
>> exemplo, que nos lembrou que muitos matemáticos se recusam a utilizar o 
>> axioma da escolha e se limitam a jogadas que cabem em ZF, uma versão 
>> simplificada do jogo.  
>>
>> E protestos desse tipo ajudam também a explicar e acomodar as abordagens 
>> fundacionais alternativas. Qual seria a principal motivação de quem pensa 
>> em fundar a matemática na Teoria das Categorias, ou na Teoria dos Tipos? 
>> Eu 
>> acho que a principal motivação é ajustar o JOGO para alguma divergência 
>> que 
>> não se encaixa perfeitamente em ZFC.
>>
>> Acho que um bom exemplo para entender isso é a relação da geometria com a 
>> álgebra. Veja, não sou matemático e se eu tiver falando bobagem, vocês 
>> simplesmente desconsiderem. Mas vejo a afirmação de que a matemática é 
>> ZFC 
>> de um modo paralelo à afirmação de que a geometria é álgebra.
>>
>> Em um certo sentido, isso está correto. Que eu saiba, não há nada na 
>> geometria que não caiba na álgebra, no sentido de que não há nenhum 
>> resultado geométrico que não tenha contrapartida algébrica. Então, em um 
>> sentido matemático, de resultados, geometria é álgebra. Mas é claro que 
>> Euclides, ou os geômetras de régua e compasso não são algebristas e não 
>> estavam fazendo álgebra. É claro que conseguimos entender certas 
>> estruturas, relações e conceitos muito melhor e mais claramente na 
>> geometria que na álgebra, que todos temos intuições geométricas, mas que 
>> só 
>> alguns poucos de nós, matematicamente treinados, têm as intuições 
>> algébricas equivalentes.
>>
>> Então, em um outro sentido muito forte, geometria não é álgebra. Mas esse 
>> outro sentido muito forte, não é o sentido matemático. Em um sentido 
>> matemático, de resultados matemáticos, geometria é álgebra.
>>
>> Então, pensando nesses termos, eu concordo com a tese de Samuel de que a 
>> matemática é ZFC. Mas isso não me impede de concordar se o Eduardo Ochs 
>> ou 
>> alguém da teoria das categorias me disser que a matemática é Teoria das 
>> Categorias ou outra teoria qualquer, desde que as eventuais divergências 
>> extensionais entre a teoria nova e ZFC sejam convincentemente 
>> justificadas.
>>
>> Não sei se o Samuel, que é o "pai da criança", enxerga sua própria 
>> abordagem desse jeito. Mas é assim que eu vejo. E nesses termos, eu 
>> concordo com ela.
>>
>> Saudações,
>> Daniel.
>>
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LOGICA-L
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