Olá a todos!

Queria me delongar em algumas reflexões, se me permitem. Lembro que a
Filosofia Analítica surgiu quando Frege, fazendo uma releitura do que havia
defendido Kant, quis demonstrar que a aritmética seria analítica. Para
Kant, um juízo analítico é aquele no qual o predicado está contido no
sujeito, ou seja, estamos quebrando um "conceito maior" em "conceitos
menores". Para Kant, matemática seria sintética e *a priori. *Já Frege
defendeu que seria analítica, mas para ele ser analítico é ser derivável
apenas de leis lógicas gerais e definições. ZFC é um produto do
desenvolvimento e reformulação do programa filosófico de Frege (certamente
com influência de inúmeros outros pensadores, como Cantor, Hilbert e
Russell para citar somente três).

Para mim, a questão central da Filosofia Analítica é o fato de que, no
decorrer de seu desenvolvimento, ela transformou a ontologia em pura
epistemologia. O pontapé foi dado por Frege, como disse na passagem acima,
mas ainda mais radical foi o pensamento de Wittgenstein que originou o
positivismo lógico. No fim, parou-se de falar em ontologia. Tudo passa a
ser tido como um fenômeno estritamente linguístico, como acreditam os
formalistas ou nominalistas. Na verdade, o que ocorreu não foi a destruição
da ontologia, mas a ontologização da linguagem. Vejam, por exemplo, a ideia
de "compromisso ontológico" de Quine. Outro exemplo é a ideia de matemática
como jogo.

Já Brouwer resistiu à tentação analítica. O Ruy disse algo que não sabia,
que foi ele quem fez Wittgenstein voltar a falar de "realidade", ou seja,
de ontologia. Brower era resistente a qualquer tipo de formalização da
linguagem. A lógica intuicionista que conhecemos hoje foi formalizada por
seus seguidores. Aparentemente, a ideia que Brower tinha da matemática era
mais próxima do idealismo de Kant.

Pois bem, Lawvere foi um matemático que buscou basear seu trabalho
fundacional em Hegel. Na verdade, o Lawvere foi além, pois Hegel era um
idealista e, para o Lawvere a realidade material (e.g. a física) cumpria um
papel relevante nas formulações matemáticas. Lawvere foi um dos primeiros a
perceber o poder expressivo que a teoria de categorias trazia para a
lógica. Mais que isso, viu como a teoria de topos da geometria algébrica
fornecia uma ponte entre a lógica e a geometria.

Já conversei um pouco sobre isso com o Márcio. Ele citou os textos de Bell
sobre os infinitesimais. Guardarei para leitura futura. Até onde sei, nos
modelos da Geometria Diferencial Sintética de Kock-Lawvere (que são topos),
os infinitesimais surgem a partir da dupla-negação. São o "conjunto" que
corresponde à sentença "x tal que ¬¬(x=0)", i. e., os elementos que não são
diferentes de 0. Percebam que, na lógica clássica, esse conjunto só possui
o 0, mas na intuicionista não. Logo, a lógica adequada para o tratamento
sintético da geometria, assim como fez Leibniz e Newton, é intrinsecamente
intuicionista.

De fato, podemos dizer que as construções de Lawvere foram fortemente
guiadas pela tentativa de capturar a filosofia de Hegel, mas com um viés de
fortemente materialista. Foi surpreendente para mim descobrir que, na
verdade, Lawvere se baseou nos Manuscritos Matemáticos de Marx (onde ele
trata do cálculo infinitesimal), e possivelmente também na filosofia de
Engels, Lenin e Mao, para formular sua axiomatização da geometria
diferencial.

Na China, inclusive, o cálculo diferencial é ensinado sob a perspectiva
marxiana. Ou seja, o padrão na China é estudar a análise não-padrão. Ainda
não tive o prazer de ler esses manuscritos, ou mesmo os livros de cálculo
da China, mas parece valer a pena. Outro grupo que seguiu a linha de tentar
fundamentar a matemática com a influência de Hegel surgiu a partir dos
trabalhos de Sofya Yanovskaya, a responsável pelos estudos em lógica
matemática da URSS e pela edição dos Manuscritos Matemáticos de Marx. O
lógico húngaro Lakatos foi um de seus alunos, que também frequentava os
seminários do filósofo Lukács. Glivenko, o pai da tradução da dupla
negação, foi contemporâneo desse grupo. Uma pena que a burocracia
estalinista destruiu a possibilidade de se avançar ainda mais.

Esse texto da Sofya ilustra bem o que se pensava na época:
https://www.marxists.org/reference/subject/philosophy/works/ru/kolman.htm

Uma citação:

'I cannot pass over without a comment on old Hegel, who they say had no
profound mathematical scientific education. Hegel knew so much about
mathematics that none of his pupils were in a position to publish the
numerous mathematical manuscripts among his papers. The only man to my
knowledge to understand enough about mathematics and philosophy to be able
to do that is Marx.' [Engels, Letter to A. Lange, March 29, 1865]

Assim como disse o Ruy, a mim também parece que, de alguma maneira, essa
dualidade entre álgebra e geometria é a mesma dualidade que existe entre
sintaxe e semântica, entre linguagem e produção de sentido. A teoria de
categorias exerce uma função relevante nessa formulação, mas em especial a
teoria de topos. Tem muita coisa interessante em teoria de topos que ainda
há de ser explorada. Por exemplo, grosso modo, partindo de um topos no qual
a HC é verdadeira, é possível construir topos no qual a HC é falsa usando o
processo de feixificação pela topologia da dupla negação.

Em termos filosóficos, porém, Lawvere era materialista. Sempre procurou
aplicações da teoria de topos na física. Segundo ele, Cantor negou Mengen
em Kardinalen, ou seja, desproviu a noção de conjuntos de qualquer
"coesividade". Essa ausência de coesividade foi então negada quando ocorreu
a fundamentação da matemática usual (em especial, da geometria) em termos
da teoria de conjuntos. Mesmo Frege via como paradoxal a ideia de cardinal
de Zermelo, já que seria uma coleção de objetos diferentes mas
indistinguíveis (ou seja, um cardinal é uma coleção de objetos dos quais
retiramos qualquer outra informação a não ser o fato de serem diferentes).
Indo nessa linha de raciocínio, Lawvere chegou à formulação de "topos
coesivo" como um ambiente no qual a filosofia hegeliana seria capturada (o
quanto isso acontece de fato é algo que está muito além dos meus
conhecimentos de causa).

A conclusão a que consigo chegar a partir das leituras que tive
oportunidade de fazer por enquanto é que não existiria, nessa concepção, um
"intelecto universal anterior", mas sim uma realidade única de que fazemos
parte, a que todos temos acesso e com que nos relacionamos.  As construções
matemáticas partem, antes de tudo, mas não exclusivamente, da interação
entre intelecto e realidade "externa", material. O acesso é limitado e,
portanto, o intelecto busca se aperfeiçoar de maneira dialética.

Isso não nos impede de reconhecer "estruturas" intrínsecas à forma como
pensamos, pelo contrário. A teoria de conjuntos captura grande parte do que
há de mais essencial no pensamento humano, assim como a lógica. O que
acontece é que não podemos negligenciar a ontologia, epistemologia e o
papel que ambas cumprem no desenvolvimento da própria matemática e da
lógica. Não dá para reduzir uma coisa na outra, muito menos separá-las
completamente. Dessa forma, reduzir a teoria de conjuntos a ZFC é um tanto
quanto restritivo. Seria reduzir algo muito mais complexo a uma determinada
escolha em específico. Seria destruir a ontologia e a epistemologia, ou
melhor, seria "ontologizar" ou "epistemologizar" a matemática e a lógica.

Enfim, há muito a ser explorado. Embora tenha fugido demasiadamente das
formulações usuais, espero que possa ser útil de alguma forma.

Em ter., 8 de ago. de 2023 às 11:58, Ruy Jose Guerra Barretto de Queiroz <
r...@cin.ufpe.br> escreveu:

> Caros,
>
> Peço permissão para acrescentar um elemento a essa bela troca de ideias:
> os questionamentos de Brouwer no que diz respeito ao papel da linguagem na
> matemática estimulam uma grande reflexão, e, na minha opinião, não é à toa
> que Wittgenstein é levado a retomar o trabalho sobre a relação "linguagem
> vs mundo/realidade" ao ser "provocado" pela palestra de Brouwer em Viena. O
> que me ocorre nesse momento é o papel da linguagem enquanto instrumento de
> perceber e raciocinar sobre uma realidade. Não apenas em seu aspecto
> estritamente "sintático", mas sobretudo na sua dimensão de significado,
> propósito, etc. E aqui entra o papel das conexões entre "linguagens" (ou
> "jogos de linguagem") e as pontes construídas entre "áreas" da Matemática,
> entre elas: geometria vs álgebra (Descartes), cálculo diferencial vs
> geometria (Poincaré, Chern, et al.), lógica matemática e conjuntos (Cantor,
> Hilbert, Zermelo, Fraenkel), curvas elípticas e formas modulares
> (Taniyama-Shimura), topologia algébrica vs categorias, etc. Mais
> recentemente, lógica/teoria da prova vs homotopia, permitindo a revelação
> e/ou consolidação de pontes que permitem vislumbrar "generalizações" nunca
> dantes percebidas, nem tanto por seus aspectos estritamente de formato, mas
> sobretudo de utilização dos seus elementos na revelação e utilidade de
> conexões entre diferentes "mundos" da matemática.
>
> Ruy
>
>
> Em ter., 8 de ago. de 2023 às 11:24, 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <
> logica-l@dimap.ufrn.br> escreveu:
>
>> Oi gente,
>>
>> Sim, mesmo que o matemático establishment faça aquela escolha sobre
>> "estar"/"pode ser"/"deve ser" do prefácio do Enderton, pra a maioria isso é
>> só um xiszinho numa resposta que ele não está interessado na pergunta, é
>> isso mesmo. Acho que eu falei isso na live também.
>>
>> Abraços
>>
>> []s Samuel
>> ----- Mensagem original -----
>> De: Daniel Durante <durant...@gmail.com>
>> Para: LOGICA-L <logica-l@dimap.ufrn.br>
>> Cc: Daniel Durante <durant...@gmail.com>, jmstern <jmst...@hotmail.com>,
>> LOGICA-L <logica-l@dimap.ufrn.br>, marciopalmares <
>> marciopalma...@gmail.com>, Petrucio Viana <petrucio_vi...@id.uff.br>,
>> Marcos Silva <marcossilv...@gmail.com>, Grupo de pesquisa CLEA <
>> pina...@googlegroups.com>, valeria.depaiva <valeria.depa...@gmail.com>,
>> Cassiano Terra Rodrigues <cassiano.te...@gmail.com>, samuel <
>> sam...@ufba.br>
>> Enviadas: Tue, 08 Aug 2023 09:45:55 -0300 (BRT)
>> Assunto: Re: ao
>>
>> Ah! Faltou dizer que uma boa crônica não só ajuda a gente a entender o
>> mundo, como talvez até a melhorá-lo. ??
>>
>> Em terça-feira, 8 de agosto de 2023 às 09:27:07 UTC-3, Daniel Durante
>> escreveu:
>>
>> > Concordo com você, Julio. Os lógicos e o pessoal dos fundamentos não
>> são
>> > legisladores e nem juízes da matemática. São apenas cronistas.
>> >
>> > Saudações,
>> > Daniel.
>> >
>> > Em terça-feira, 8 de agosto de 2023 às 07:54:10 UTC-3, jmstern escreveu:
>> >
>> >> > "Todo matemático, em geral, escolhe uma das seguintes alternativas:
>> >> > A matemática está inteiramente internalizada na Teoria dos Conjuntos;
>> >> > A matemática pode ser inteiramente internalizada na Teoria dos
>> >> Conjuntos;
>> >> > A matemática deve ser inteiramente internalizada na Teoria dos
>> >> Conjuntos"
>> >>
>> >> Car(a/o)s:
>> >> Permitam-me apresenta uma visao alternativa:
>> >>
>> >> -- A maioria dos matematicos, simplesmente Nao esta interessada nesta
>> >> questao.
>> >> Esta questao eh pertinente para -- Fundamentos da Matematica -- ,
>> >> uma Area Especifica muito interessante, para uma minoria que gosta do
>> >> assunto,
>> >> mas provavelmente desnecessaria para o trabalho da maioria dos
>> >> matematicos.
>> >>
>> >> Reproduzo a seguir um pequeno trecho do artigo:
>> >>
>> >> Julio Michael Stern (2020). Prof. Carlos Edgard Harle: Boas Lembranças
>> e
>> >> Sábias Lições. Revista Matematica Universitária, 2020, 2, 56-61.
>> >> <
>> https://www.ime.usp.br/~jmstern/wp-content/uploads/2020/12/Ste20RMU.pdf>
>> >>  doi: 10.21711/26755254/rmu202025
>> >> <https://doi.org/10.21711/26755254/rmu202025>
>> >>
>> >> ------------------------------------
>> >>
>> >> 2.3.  [Terceira Licao:]
>> >> Em engenharia, a construção de uma casa começa pelo trabalho nos
>> >> fundamentos.
>> >> Em matemática, os fundamentos são feitos no final, para suportar a
>> casa
>> >> que já temos!
>> >>
>> >> Enquanto fazia meu mestrado, tive notícia de uma suposta prova
>> topológica
>> >> de inconsistência de ZFC (a teoria de conjuntos de Zermelo–Fraenkel
>> >> acrescida pelo Axioma da Escolha), uma ferramenta padrão de
>> fundamentos da
>> >> matemática. Lá fui eu, muito preocupado, conversar a respeito com meu
>> >> orientador.
>> >> O Harle logo me tranquilizou, explicando que, verdadeira ou não, a
>> >> notícia pouco impacto teria sobre nosso trabalho em geometria
>> [Lorentziana/
>> >> Riemanniana].
>> >> Para o Harle, o papel da geometria seria o de tratar racional e
>> >> sistematicamente uma classe de problemas que se nos apresentam no
>> mundo em
>> >> que vivemos; situação semelhante à de outras disciplinas científicas
>> ou
>> >> especialidades da matemática.
>> >>
>> >> Na visão do Harle, o papel da área de fundamentos seria o de prover
>> uma
>> >> base comum que atendesse às necessidades de um programa avançado e
>> >> abrangente de axiomatização de todas estas disciplinas.
>> >> Tal programa seria altamente meritório; todavia, eu deveria ter sempre
>> em
>> >> mente a terceira lição, como acima enunciada.
>> >>
>> >> Muito mais tarde na vida, encontrei uma perspectiva (em minha visão)
>> >> semelhante, na citação seguinte atribuída a Kurt Gödel, vide Mehlberg
>> >> (1962, p.86), Lakatos(1978, p.27) e Stern (2011, p.645-647). Mais uma
>> vez,
>> >> esta lição, que aprendi com o Harle, sobre o papel que cabe em
>> ciências
>> >> exatas a seus fundamentos axiomáticos, veio a influenciar
>> >> significativamente meu trabalho futuro.
>> >>
>> >> [...] o papel das assim chamadas ‘fundações’ é comparável à função
>> >> exercida, nas teorias físicas, por hipóteses explicativas. [...] A
>> real
>> >> função dos axiomas é a de explicar os fenômenos descritos pelos
>> teoremas
>> >> deste sistema, e não o de prover uma genuína ‘fundação’ para estes
>> >> teoremas. (Kurt Gödel)
>> >>
>> >> --------------------------------------
>> >>
>> >> No artigo seguinte, faco uma analise mais detalhada desta (minha?)
>> visao
>> >> "empiricista" da matematica:
>> >>
>> >> Julio Michael Stern (2011). Constructive Verification, Empirical
>> >> Induction, and Falibilist Deduction: A Threefold Contrast.
>> *Information*,
>> >> 2, 4, 635-650.
>> >> <
>> https://www.ime.usp.br/~jmstern/wp-content/uploads/2020/10/Ste11Axi.pdf>
>>
>> >> doi:10.3390/info2040635 <http://doi.org/10.3390/info2040635>
>> >>
>> >> Como referencia fundamentais (pun intended) para esta posicao, cito:
>> >>
>> >> Arpad Szabo (1978). The Beginnings of Greek Mathematics; Akademiai
>> >> Kiado:  Budapest, Hungary.
>> >>
>> >> Imre Lakatos, J. Worall, E. Zahar, eds. (1976). Proofs and
>> Refutations:
>> >> The Logic of Mathematical Discovery;  Cambridge University Press:
>> >> Cambridge, UK.
>> >>
>> >> Imre Lakatos (1978). Philosophical Papers. V.1 -- The Methodology of
>> >> Scientific Research Programmes. V.2. -- Mathematics, Science, and
>> >> Epistemology. Cambridge University Press: Cambridge, UK.
>> >>
>> >> ------------------------------------------
>> >>
>> >> Notem ainda que Logica tem varios papeis relevantes nesta discussao.
>> >>
>> >> - Um papel, aceito e tradicional, da Logica e teoria dos conjuntos eh
>> >> justamente o de construir ferramentas para Fundamentos Axiomaticos da
>> >> Matematica, sendo ZFC o paradigma mais conhecido.
>> >>
>> >> Outros papeis relevantes (na minha opiniao) da Logica seriam os de:
>> >>
>> >> > Estudar os processos -- Indutivos -- (sim, sim; Indutivos, nao
>> >> dedutivos!) que levam a abstracao de estruturas matematicas a partir
>> da
>> >> formalizacao de teorias Fisicas (ou em outras ciencias empiricas), e
>> >>
>> >> > Estudar a melhor forma de construir e oganizar Ontologias da (ou de
>> >> partes da) Matematica e a melhor forma para sua  insercao nas ou
>> >> interacao com as ontologias de ciencias empiricas.
>> >>
>> >> Tudo de bom,
>> >> ---Julio Stern
>> >>
>> >>
>> >> ------------------------------
>> >> *From:* 'Samuel Gomes da Silva' via LOGICA-L <logi...@dimap.ufrn.br>
>> >> *Sent:* Monday, August 7, 2023 5:45 PM
>> >> *To:* Daniel Durante <dura...@gmail.com>
>> >> *Cc:* LOGICA-L <logi...@dimap.ufrn.br>; marciopalmares <
>> >> marciop...@gmail.com>; LOGICA-L <logi...@dimap.ufrn.br>; Petrucio
>> Viana <
>> >> petruci...@id.uff.br>; Marcos Silva <marcos...@gmail.com>; Grupo de
>> >> pesquisa CLEA <pin...@googlegroups.com>; valeria.depaiva <
>> >> valeria...@gmail.com>; Cassiano Terra Rodrigues <cassian...@gmail.com>
>> >> *Subject:* [Logica-l] Re: ao
>> >>
>> >> Caros,
>> >>
>> >> A mensagem do Cassiano eu preciso digerir mais, hehe,
>> >>
>> >> Daniel, sua analogia com "geometria é álgebra" é pertinente sim,
>> >>
>> >> E na verdade me lembrou do prefácio de um excelente livro de graduação
>> de
>> >> Teoria dos Conjuntos, o do Enderton: se não me falha a memória, vai na
>> >> seguinte linha:
>> >>
>> >> "Todo matemático, em geral, escolhe uma das seguintes alternativas:
>> >>
>> >> A matemática está inteiramente internalizada na Teoria dos Conjuntos;
>> >>
>> >> A matemática pode ser inteiramente internalizada na Teoria dos
>> Conjuntos;
>> >>
>> >> A matemática deve ser inteiramente internalizada na Teoria dos
>> Conjuntos"
>> >>
>> >> Apesar do que alguém poderia pensar, mesmo com o meu "matemática é
>> ZFC",
>> >> eu tendo a pensar mais pela segunda alternativa, talvez nesse espírito
>> de
>> >> "ambiente de trabalho".
>> >>
>> >> (E como pintura do cachimbo, claro...)
>> >>
>> >> Abraços
>> >>
>> >> []s Samuel
>> >>
>> >> PS: Ah sim, isso de "geometria é álgebra"
>> >> tem a haver com a internalização da geometria dentro da álgebra, aí da
>> >> mesma forma a pessoa pode decidir entre "está", "pode ser", "deve
>> ser"...
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >>
>> >> ----- Mensagem original -----
>> >> De: Daniel Durante <dura...@gmail.com>
>> >> Para: LOGICA-L <logi...@dimap.ufrn.br>
>> >> Cc: marciopalmares <marciop...@gmail.com>, LOGICA-L <
>> >> logi...@dimap.ufrn.br>, samuel <sam...@ufba.br>, Petrucio Viana <
>> >> petruci...@id.uff.br>, Daniel Durante <dura...@gmail.com>, Marcos
>> Silva <
>> >> marcos...@gmail.com>, Grupo de pesquisa CLEA <pin...@googlegroups.com>,
>>
>> >> valeria.depaiva <valeria...@gmail.com>, Cassiano Terra Rodrigues <
>> >> cassian...@gmail.com>
>> >> Enviadas: Mon, 07 Aug 2023 10:41:05 -0300 (BRT)
>> >> Assunto: Re: ao
>> >>
>> >> Oi Marcio e colegas,
>> >>
>> >> Eu acho, Marcio, que quando Samuel fala que a matemática é ZFC, ele
>> não
>> >> está querendo dizer isso literalmente, no sentido de que os números
>> são
>> >> certos conjuntos e que as funções são conjuntos de pares com certas
>> >> propriedades,... Ele está falando de um jeito menos literal. Os
>> números
>> >> são
>> >> qualquer coisa que se comporte como aqueles conjuntos se comportam em
>> ZFC
>> >> e
>> >> as funções são qualquer coisa que se comporte como aqueles conjuntos
>> de
>> >> pares se comportam em ZFC.
>> >>
>> >> Porque veja, junto com dizer que a matemática é ZFC ele diz também que
>> >> ZFC
>> >> não tem modelo canônico e que a matemática não são nem as regras do
>> jogo,
>> >> nem os diversos tabuleiros onde o jogo é jogado - nem os axiomas de
>> ZFC,
>> >> nem seus muitos modelos.
>> >>
>> >> A matemática não é a formalização de ZFC e também não é cada uma das
>> >> possíveis estruturas que verificam os axiomas. A matemática seria
>> aquilo
>> >> que todas as estruturas que verificam os axiomas têm em comum.
>> >>
>> >> Aí, cabe tanto os matemáticos contemporâneos que nem sabem quais são
>> os
>> >> axiomas de ZFC, mas que os respeitam, porque vivem em (jogam) versões
>> >> desse
>> >> jogo, ainda que talvez nem saibam disso. E cabe também, em certo
>> sentido,
>> >> os matemáticos do passado que também jogavam versões desse jogo sem
>> saber.
>> >>
>> >> Talvez, se a gente procurar na história, a gente encontre os momentos
>> em
>> >> que as regras do jogo foram se estabelecendo, e o jogo foi sendo
>> >> consolidado. Nessa visão dá para entender até o protesto de Valéria,
>> por
>> >> exemplo, que nos lembrou que muitos matemáticos se recusam a utilizar
>> o
>> >> axioma da escolha e se limitam a jogadas que cabem em ZF, uma versão
>> >> simplificada do jogo.
>> >>
>> >> E protestos desse tipo ajudam também a explicar e acomodar as
>> abordagens
>> >> fundacionais alternativas. Qual seria a principal motivação de quem
>> pensa
>> >> em fundar a matemática na Teoria das Categorias, ou na Teoria dos
>> Tipos?
>> >> Eu
>> >> acho que a principal motivação é ajustar o JOGO para alguma
>> divergência
>> >> que
>> >> não se encaixa perfeitamente em ZFC.
>> >>
>> >> Acho que um bom exemplo para entender isso é a relação da geometria
>> com a
>> >> álgebra. Veja, não sou matemático e se eu tiver falando bobagem, vocês
>> >> simplesmente desconsiderem. Mas vejo a afirmação de que a matemática é
>> >> ZFC
>> >> de um modo paralelo à afirmação de que a geometria é álgebra.
>> >>
>> >> Em um certo sentido, isso está correto. Que eu saiba, não há nada na
>> >> geometria que não caiba na álgebra, no sentido de que não há nenhum
>> >> resultado geométrico que não tenha contrapartida algébrica. Então, em
>> um
>> >> sentido matemático, de resultados, geometria é álgebra. Mas é claro
>> que
>> >> Euclides, ou os geômetras de régua e compasso não são algebristas e
>> não
>> >> estavam fazendo álgebra. É claro que conseguimos entender certas
>> >> estruturas, relações e conceitos muito melhor e mais claramente na
>> >> geometria que na álgebra, que todos temos intuições geométricas, mas
>> que
>> >> só
>> >> alguns poucos de nós, matematicamente treinados, têm as intuições
>> >> algébricas equivalentes.
>> >>
>> >> Então, em um outro sentido muito forte, geometria não é álgebra. Mas
>> esse
>> >> outro sentido muito forte, não é o sentido matemático. Em um sentido
>> >> matemático, de resultados matemáticos, geometria é álgebra.
>> >>
>> >> Então, pensando nesses termos, eu concordo com a tese de Samuel de que
>> a
>> >> matemática é ZFC. Mas isso não me impede de concordar se o Eduardo
>> Ochs
>> >> ou
>> >> alguém da teoria das categorias me disser que a matemática é Teoria
>> das
>> >> Categorias ou outra teoria qualquer, desde que as eventuais
>> divergências
>> >> extensionais entre a teoria nova e ZFC sejam convincentemente
>> >> justificadas.
>> >>
>> >> Não sei se o Samuel, que é o "pai da criança", enxerga sua própria
>> >> abordagem desse jeito. Mas é assim que eu vejo. E nesses termos, eu
>> >> concordo com ela.
>> >>
>> >> Saudações,
>> >> Daniel.
>> >>
>> >> --
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>> >> Lógica <logi...@dimap.ufrn.br>
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>> >> Para ver esta discussão na web, acesse
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