On Jun 10, 2008, "Glauber Machado Rodrigues (Ananda)" <[EMAIL PROTECTED]> wrote:
> Esse é um PVT que eu enviei para o Alexandre Oliva, ele achou melhor > responder na lista. Valeu, Glauber! Desculpa a demora. Estou me preparando pra uma conferência com negociações complicadas semana que vem, então estou tendo de me dedicar muito à preparação. Temia talvez não conseguir responder antes de viajar, pois já nem lembro o que foi que eu pensei em responder quando pedi pra voltar pra lista pública. Enfim, vamos lá... > 2008/6/6 Alexandre Oliva <[EMAIL PROTECTED]>: >> Ou você tava só brincando, pra zoar comigo? :-) > Hehehe. Teve uma zoaçãozinha mesmo, Aah, então tá. Tranqüilo. Pelo amor e pelo humor, vale tudo :-) > RMS é um cara que devemos escutar. O povo fala que ele é esquisofrênico etc, > mesmo assim tem um monte de gente de cabeça boa concordando com ele. Então > acho que ele está raciocinando bem. Logo, o pensamento da FSF só seria coisa > de esquisofrênico se todas as pessas que concordam com RMS também fossem. Certamente não podemos descartar esta última possibilidade ;-) > A primeira vez que li o gnu manifesto pensei "cara, isso não vale só para o > Unix não, todo software deveria ser assim". De fato, isso está coberto implicitamente em "Why I Must Write GNU". O mesmíssimo argumento se aplica a qualquer software que qualquer pessoa precise. Curiosamente, a justificativa mais específica para o porquê de ele ter de escrever GNU (e não Software Livre em geral) não está naquela seção: é o fato de ele ser um experiente desenvolvedor de sistemas operacionais. Aquela coisa que ele fala na palestra dele de que, se você vê alguém se afogando e você sabe nadar e não tem mais ninguém por perto e não é o Bush :-), então você tem obrigação moral de ir lá ajudar a pessoa. > Então depois as pessoas pensam "como se faz isso? Ah, é assim assim, > copyleft e tal. Qual são os sistemas que já são assim? Ah tem o projeto gnu > e tal". A idéia que quero passar é a de que o projeto GNU e a FSF são a > primeira casa de muita gente que pensava suficientemente parecido para se > dar o trabalho de querer aprender e implementar SL. Então, e isso, ao mesmo tempo que é bom, também gera um monte de confusão. Tipo, quanta gente não confunde RMS com FSF com GNU com GPL com copyleft com Software Livre? Na boa, se cada um desses conceitos viesse de uma fonte diferente, seria bem mais simples de a gente explicar. Tipo, o fato de que a mesma FSF fundada pelo mesmo RMS que criou o projeto GNU, a definição de Software Livre, inventou o copyleft, e lançou a GPL, faz muita gente misturar as coisas. Fica pensando que Software Livre tem que ser copyleft, ou tem que ser GPL, que o direito autoral tem que ser atribuído à FSF, que tem que ser parte do projeto GNU, que tudo do projeto GNU é da FSF e está sob GPL, esse monte de mitos e confusões que a gente não se cansa de tentar esclarecer, e luta pra não desanimar pois parece que quanto mais a gente esclarece, mais os inimigos (e outros que se acham amigos) geram confusão. Tipo, da primeira vez que tive oportunidade de encontrar, no ano passado, um dos membros do conselho da OSI, que trabalha no Apache, ele teve dificuldade de acreditar que Software Livre não precisava ser GPL nem copyleft, tanto que ouviu e repetiu o discurso da OSI da postura mais flexível. Pode? Parte da confusão presumivelmente advinha da confusão (que vira aparente contradição na cabeça de quem não entende a diferença) quando se diz "Livre, mas incompatível com a GPL", como era a licença Apache antes da GPLv3. Algumas das tantas confusão são de que, se não é compatível com a GPL, não pode ser Livre. > Porém o pensamento da FSF não bate com o pensamento de todas as > pessoas que percebem o SL como necessidade. Sem dúvida. Mas aí, quantas dessas pessoas entendem corretamente o pensamento da FSF? Quantos têm picuinha com coisas pessoais do RMS e aí ficam achando pêlo em ovo na ideologia do movimento Software Livre? Quantos atribuem a ele, a ela e a nós comportamentos que seriam absolutamente incompatíveis com a própria ideologia que promovemos? Quantos reagem de forma explosiva à culpa que sentem por sentirem que poderiam e deveriam fazer mais e melhor pela sociedade, mas acabam comprometendo em coisas que poderiam evitar? > Lembra daquela vez que você, Alexandre, tentou convencer o Linus Torvalds a > adotar a GPL3? Aí, não, não lembro. Nunca fiz isso. Mas lembro de um flame-war que começou quando se fez referência a afirmações falsas a respeito de rascunhos da GPLv3, eu entrei pra corrigir as afirmações falsas, o Linus me xingou e, depois de muita discussão, alguém sugeriu que eu tinha sido mandado pela FSF (?!?) pra tentar convencer o Linus a adotar a GPLv3. Eu tenho algum senso de noção. Seria completamente idiota alguém me mandar, do jeito que eu, era numa missão como essas, e seria completamente idiota eu aceitar me queimar desse jeito numa tentativa vã de cumprir essa suposta missão. Meu objetivo era corrigir as distorções que estavam sendo apresentadas e tratadas como verdade. Isso eu achei que tinha obrigação moral de fazer. Foi iniciativa própria, a ponto de o diretor executivo da FSF me escrever em pânico quando ficou sabendo que o Linus tava me xingando numa discussão sobre GPLv3 :-) Acho que valeu a pena. Ainda que lá, como na discussão recente sobre Debian aqui, eu não tivesse entrado com esperança de convencer os interlocutores, mas sim com o objetivo de contrapor a opinião errada que prevaleceria se eu não participasse, consegui não só ensinar e apresentar uma porção de fatos sobre GPLv3 e sobre objetivos do Software Livre, mas até corrigir erros em minha própria compreensão da GPLv3. Foi bem cansativo e não tenho como avaliar se valeu o esforço, mas meu sentimento é que valeu. > Mas para o Linus a questão era mais ou menos assim:"Eu sabia que > isso poderia acontecer, e para mim está bom. Se para vocês a versão > 2 da GPL não está boa, para mim está." E continuava com "e pra mim está porque a GPLv2 é tit-for-tat, e é isso que eu quero". Só que a GPLv2 não é, tem furos e erros de interpretação dele (e de muita gente que diz que existe qualquer obrigação de contribuir modificações e aprimoramentos de volta à comunidade), e que a GPLv3 é diferente nesse sentido. Foi aí (da primeira vez que ele escreveu isso, bem antes dessa discussão a que você se refere) que eu escrevi um artigo monstro sobre a GPLv3, que nunca consegui polir o suficiente para publicar como versão final: http://fsfla.org/svnwiki/blogs/lxo/draft/gplv3-snowwhite > A idéia aqui não é passar a idéia de que o Linus é teimoso, nem de > que esteve sempre certo desde o início. Apenas que nem tudo que sai > da cabeça da FSF é o SL que todos querem. Eu pelo menos tenho perfeita noção disso. Mas não vou deixar de promover o que acredito só porque nem todo mundo concorda comigo, nem porque alguns dos que não concordam ainda não se deram conta de que, lá no fundo, concordam, sim ;-) Meus pais são médicos, mas eu sou paciente :-) > Entram em brigas desnecessárias porque acham que as pessoas estão > erradas, Há muita má interpretação a respeito das brigas desnecessárias. Tipo, quanta gente acha que é besteira insistir em que se chame o sistema pelo nome certo, que se use o termo que fala de liberdade para se referir ao tipo de software, que é picuinha desnecessária e inútil? Em alguns desses e em muitos outros casos, as pessoas estão factualmente erradas, e acabam promovendo visões que são muito prejudiciais aos nossos objetivos. Aí, é necessário intervir. Mas em muitos casos, as pessoas se sentem agredidas porque elas mesmas se recriminam por coisas a que a gente acaba expondo como práticas prejudiciais à sociedade. Em outros, elas reclamam de um suposto desrespeito à própria opinião, quando na verdade estão tentando calar e desrespeitar a opinião diferende da sua. E aí tem uma pilha de outros ressentimentos de ordem pessoal e moral acumulados em relação à figura fuzzy que combina RMS, FSF e "Cia Ltda" de que faço parte. Impressionante como em alguns fóruns é difícil eu falar de Software Livre sem virar alvo de frustrações com relação a RMS, FSF e até Red Hat. Também não vou dizer que não existam as brigas desnecessárias. Herrar é umano, não poder errar é desumano. > todo mundo levantou e bateu palma para o Eric Raymond quando ele > falou que o mundo não precisava da GPL, O engraçado é que um dia ele vai ter razão com relação a isso. Mas ainda demora. Por enquanto, ainda precisamos evitar que os estilhaços machuquem quem está em volta dos que insistem em dar tiros no próprio pé. > > Muita coisa daquele discurso contraria o pensamento da FSF. Claro, não é à toa que ele co-fundou o "movimento" Open Source e a OSI, e quase a fundou-a :-) depois. Engraçado é que, naquela época mesmo, ele já tinha sido chutado do conselho da OSI, e gerou desconforto para e falou besteira não só do nosso (FSFs) ponto de vista, mas também para/do conselho da OSI que tava lá. > Ou ele hipinotizou todo mundo ou muita gente que tem certeza que faz > parte do movimento também concorda (com o ESR) Aí recaímos na discussão do Marcus, de que é o "movimento", que é a "comunidade", se é que faz sentido falar dessas coisas. Mas que o pessoal bate palma, bate. Não precisa nem concordar, é só fazer uma frase de efeito e alguns puxarem as palmas que a multidão segue. Ainda mais sendo o cara famoso, estrangeiro, falando inglês e falando bem. Palmas pra ele, e viva a xenofilia brasileira :-) O que não quer dizer que não tenha gente que concorda com ele, nem que tudo que ele fale é besteira. Eu mesmo gostei de muita coisa sobre o processo de desenvolvimento de software em comunidade que ele descreveu n"A Catedral e o Bazaar", da análise dos Halloween documents. Merece crédito e admiração pelo que fez ali. Mas não vou confundir o mensageiro com a mensagem. Cada coisa que ele (e qualquer um) fala deve ser analisada de forma independente. Não é porque ele acertou numa coisa que toda vez que abre a boca tá certo, nem porque errou uma vez que toda vez que abre a boca tá errado. Da mesma forma que se deveria fazer com RMS, com você, comigo e com qualquer outra pessoa. Ninguém acerta sempre, é difícil demais. Errar sempre, também :-) > O que eu quero dizer é que, a definição de software livre vai muito > além do que qualquer coisa que a FSF acredita ser. A definição é um > consenso (consenso que não existe) > entre o pensamento de vários projetos [...]. É só sair perguntando > no fisl ou qualquer outro evento se o Debian é software livre. Isso só comprova que tem um monte de gente que não sabe o que é Debian e que tem um monte de gente que não sabe o que é Software Livre. Essa falácia se chama 'apelo às massas'. Pensa assim: teve gente que elegeu o Collor pra presidente. Maluf e Enéas foram super bem votados em São Paulo. As inguinorança astravanca o pogréssio. Há 3 tipos de inverdades: mentiras, mentiras deslavadas e estatísticas. Cerca de 75% das ladeiras são subidas. 80% das pessoas usam somente 20% das funcionalidades de um software. 90% do esforço do ciclo de vida de um software é dispendido antes de seu lançamento; depois do lançamento, dispendem-se os outros 90%. E por aí vai... > O que não era, poderia ficar no non-free, pois não era software > livre. E também não era parte do Debian. > Chamar o non-free de non-DFSG seria o mesmo que chamar os > não-humanos de non-[transcrição do genoma humano]. O paralelo não me parece adequado. DFSG não diz o que é Software Livre e o que não é (tenta, mas não consegue), diz o que é aceitável no main e o que não é, seja software ou não. Já a transcrição do genoma humano descreve com bastante precisão o que é um humano específico. Um paralelo mais adequado seria algo como a diferença entre não-humanos e não-P23PC (Portadores de 23 pares de cromossomos), pois embora P23PC inclua a grande maioria dos humanos, não inclui todos, e potencialmente inclui outros seres vivos que praticamente nada têm que ver com humanos. P23PC seria igualmente obscuro, mas, caso fosse o critério usado para decidir se um ser vivo é aceitável ou não para uma certa função, ainda que seja obscuro, seria mais correto anunciar o critério dessa forma no anúncio classificado de oportunidades de trabalho, ao invés de dizer "precisamos de um humano para..." > Quem iria entender? Pois é... Ei!, que tal non-debian? Já mataria dois coelhos numa só, erhm, pedrada? :-) > Por isso acho que o uso do nome non-free é perfeitamente aceitável, lá se > encontra tudo que não é sofware livre. E um montão de documentação que é Livre, mas que não passa pelos critérios da DFSG. > Entendeu porque eu sugeri brincando que a FSF mudasse seu nome para GALSF > (GPL Alike Licenced Software Fondation)? A minha intenção era que você > entendesse essa contradição. A FSF usa o termo "Free Software" para definir > algo que ela acredita que seja o software livre. Entendi. E me parece legítimo. Afinal, foi ela que cunhou e definiu o termo. Anos depois, Bruce Perens tentou criar uma série de critérios mais objetivos para determinar o que entraria ou não no projeto Debian, e nasceu DFSG, que buscava modelar o que é Software Livre, mas que não conseguiu. E o Debian passou a usar isso como régua, ao invés da definição original. Até aí, tudo bem. Mas usando o mesmo termo para descrever o resultado da medida, e, pior, aplicando a medida a coisas que não são software (apesar do nome Debian Free *Software* Guidelines), melou tudo. O mínimo que podia fazer, se queria usar uma definição não equivalente, seria usar um outro termo. E assim nasceu a definição de Open Source, baseada no DFSG. (Ei, peraí, mas se a OSD é baseada na DFSG, Debian está do lado do Software Livre ou do Open Source? :-P (Liga não, só zoando, não é pra responder; não recomendo mudar non-free pra closed-source :-) > Para poder separar o que é livre ou não, ela se baseia nas 4 > liberdades, ou na conformidade com a GPL, ou sei lá mais o quê, você > sabe melhor do que eu. Então tá, vai por mim, dizer "GPL Alike" não reflete de forma alguma o que a FSF entende por Software Livre. Somente respeito às 4 liberdades de um usuário, sem qualquer traço de copyleft, é suficiente para que um Software seja considerado Livre para aquele usuário. > já que ela redefiniu "free-software" Como assim, *re*definiu? Ninguém falava em Free Software ou Software Livre antes o RMS cunhar o termo, que eu saiba. Do mesmo jeito que não tem ninguém reclamando de a OSI ter definido Open Source e até ter (tentado? conseguido?) registrar a marca, e agir quando um programa se anuncia Open Source sem de fato ser. > Agora que já bati na FSF, vou assoprar. :-) > Isso não é uma falha desde que ela não aja como se sempre soubesse o que é > melhor para os outros, e comece a criar problemas para quem não pensa > exatamente igual a ela. Acho que a régua para decidir quando agir é quando a inação criaria problemas para inocentes e/ou para ela própria. Pelo menos eu tento me guiar por aí. > Ser membro da FSF proporciona um insight profundo sobre o tema do > Software Livre, mas não é como ser um regulamentador da verdade > sobre o tema. Certamente não. Mas quando se trata de um termo que foi introduzido e definido para nortear o movimento, é responsabilidade dos membros do movimento zelar por ele, para evitar que seja corrompido pelos interesses que o ameaçam. Evitar que se confunda livre com grátis. Evitar que se confunda livre com open ou open-source, ou mesmo FOSS e FLOSS. Evitar que se propaguem as mentiras (nem sempre maliciosas) de que precisa ser GPL ou copyleft ou parte do GNU ou ter direitos atribuídos à FSF pra se qualificar como Software Livre. Assim como o pessoal do Open Source gosta de dizer que não basta o source ser open pra ser open source, sem com isso escapar da mira da Microsoft que, não contente em gerar confusão e dúvida com Shared Source, obteve aprovação para licenças e depois lançou software claramente não Open Source (nem Livre) sob uma dessas licenças (que pelo jeito é até Livre). Já tirou do ar, mas gerou confusão e dúvida dizendo que, se voltar a lançar, vai lançar sob outra licença, ou vai distribuir os fontes, como se precisasse mudar a licença pra fazer sentido publicar o Software não-Livre. > Nós mesmos não devemos importunar *demais* os outros com o nosso software > livre. Devemos importunar na medida certa =D Isso. > Alguns mundos são mais difíceis de se alinhar do que outros. Acho > que às vezes a FSF pressupõe que toda a comunidade livre está > alinhada com eles, quando isso ainda não aconteceu. Posso falar por mim, não tenho essa ilusão, e pelo que percebo nas outras FSFes e inclusive na nossa, ninguém lá tem. Por isso mesmo a FSFLA, por exemplo, lançou a iniciativa 'Sê Livre!', pelo *resgate* dos valores do Software Livre. Por isso mesmo a gente "arruma confusão" no FLISOL, no FISL, etc, porque batalha pra que Software Livre signifique *movimento* Software Livre, não só "sob licença Livre" ou "capaz de rodar em GNU/Linux" ou "que caiu no gosto de algum LUG" ou "isso tudo e mais o que nossos patrocinadores quiserem" e coisas do gênero que a gente vê por aí :-) Eita... Acabou! Finalmente, agora posso dormir :-) Abração, -- Alexandre Oliva http://www.lsd.ic.unicamp.br/~oliva/ Free Software Evangelist [EMAIL PROTECTED], gnu.org} FSFLA Board Member ¡Sé Libre! => http://www.fsfla.org/ Red Hat Compiler Engineer [EMAIL PROTECTED], gcc.gnu.org}
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